Is This the Life We Really Want?: nostalgia com imposição

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Victor Pinheiro

No dia 20 de maio, Roger Waters surpreendeu os fãs brasileiros ao postar em seu perfil oficial no Facebook uma foto do presidente Michel Temer acompanhada da escrita: “essa é a vida que realmente queremos?”. A publicação atingiu 32 mil reações na rede social e causou discussões de cunho político nos comentários. Embora tenha sido uma estratégia de marketing, o episódio reflete características do músico e de seu novo álbum solo, Is This The Life We Really Want?.

O lançamento do artista britânico resgata características de obras ícones do Pink Floyd nos anos 70. A começar pela composição. Enquanto esteve na banda, Roger Waters foi o principal compositor do grupo, apesar de dividir boa parte das autorias com o ex-colega guitarrista David Gilmour. Algumas letras elaboradas por Waters em álbuns como The Dark Side of The Moon (1973), Wish You Were Here (1975), Animals (1977) e The Wall (1979) são repletas de referências a concepções políticas e reflexões existenciais do cantor.

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Nesse sentido, Is This The Life We Really Want? representa uma dura crítica ao atual cenário político internacional. “Deja Vú”, “The Last Refugee”, “Picture That” e “Broken Bones” contestam claramente a atual guerra da Síria e a situação dos refugiados. Vale lembrar, que marcas de conflitos militares são temas recorrentes nas composições de Waters, vide grandes sucessos como “Us and Them” e “Another Brick In The Wall”.

Considerando o teor crítico e reflexivo, Waters não deixaria de mencionar o presidente estadunidense Donald Trump no álbum. A música que denomina a obra traz gravações da CNN de discursos do republicano junto a uma composição crítica a sociedade americana, mencionando inclusive, a corrupção de títulos subprimes referentes ao colapso do mercado imobiliário resultante na crise econômica mundial em 2006. O uso de gravações, aliás, representa mais uma herança herdada de álbuns do Pink Floyd. Desde a inserção de diálogos entre astronautas e bases espaciais em Piper At the Gates of Dawn (1967), as gravações colaboram para a construção da narrativa das coletâneas.

No que diz respeito à melodias, Is This The Life We Really Want? desafia a voz de Roger Waters. Na época de Pink Floyd, apesar de participar no vocal de faixas impactantes como “Comfortably Numb”, o baixista sempre esteve atrás da potência de David Gilmour nos microfones. Embora Waters tenha se saído bem mesmo em notas mais intensas, ele ainda é bem melhor nas composições do que no microfone. Talvez esse seja um dos motivos, longe de ser o único, da presença de um número considerável de músicas calcadas no violão e na voz do cantor ao maior estilo “Mother”.

O novo álbum também resgata o teclado intenso e elegante protagonizado pelo falecido Richard Wright, no Pink Floyd. É possível perceber até mesmo a influência de David Gilmour, que apesar de ser colega de banda nunca foi afeto de Waters, na guitarra.

Embora contenha tantas referências ao tempo de Pink Floyd, não é justo reduzir o álbum a uma cópia das obras da antiga banda de Waters. Até porque, sendo ele o principal compositor do grupo, é natural que tenha resgatado elementos anteriormente explorados. Além disso, Is This The Life You Really Want? conserva sua identidade ao se referir a cenários políticos atuais, de forma até mais incisiva e um pouco menos lúdicas se comparado às obras floydianas.

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