Ana Nóbrega
“Third time’s a Charm” (em português “a terceira vez é um charme”) é um ditado estadunidense que significa que quando algo é tentado pela terceira vez, o resultado com certeza vai ser sorte. A frase exemplifica com louvor a terceira temporada da série The Umbrella Academy, que chegou à Netflix no dia 22 de junho de 2022, trazendo consigo a volta dos irmãos Hargreeves e sua luta infinita contra o fim do mundo.
A trama, dirigida por Steve Blackman, não trouxe nenhuma novidade no que se trata de enredo. Mesmo apresentando novos personagens e informações, o objetivo continua o mesmo: salvar o mundo de um fim iminente. Porém, o grupo não demonstra tanto ânimo em realizar essa tarefa, fator que causa abalo em alguns laços familiares, mas que também cria relações inesperadas.
Depois de voltar do passado, os integrantes da Umbrella Academy acreditam que finalmente podem descansar. Porém, nem tudo é o que parece. A família descobre que o mundo em que eles cresceram não existe, e que seu pai, Sir Reginald Hargreeves (Colm Feore), ainda está vivo e adotou outras crianças. Como mostrado no final da segunda temporada de The Umbrella Academy, a Sparrow Academy substituiu o lugar da Umbrella Academy e, agora, o grupo de heróis originais está vivendo em uma realidade em que eles não existem da forma como são.
Quando a terceira temporada de The Umbrella Academy foi anunciada, o público ficou ansioso para conhecer os personagens que constituiriam a Sparrow Academy. Quem leu os gibis ficou intrigado com a ideia de conhecer o grupo de heróis, que mal foi apresentado nas HQs. No entanto, como toda a série com muitos personagens na trama principal, não é possível se apegar muito aos membros da Sparrow, até porque, alguns deles são tão rasos quanto uma piscina de criança.
Mas o que falta de profundidade na academia vizinha é encontrado em boa quantidade nos primeiros Hargreeves. Para acompanhar a trajetória do ator Elliot Page, que dá vida a Viktor Hargreeves, o seu personagem passa por uma transição, deixando a identidade de Vanya para trás, e assumindo quem ele sempre foi. A mudança do número sete é feita de forma natural e leve, o que causou certo agrado. A transição de Viktor é abordada com responsabilidade, não sendo nenhum problema para essa família disfuncional.
Allison (Emmy Raver-Lampman) também ganha protagonismo nessa temporada. Dessa vez, ela está presente para expressar um sentimento que deveria ser comum entre os irmãos: o cansaço de quem precisa salvar o mundo pela terceira vez. Depois de perder a guarda da filha e o seu grande amor – que ficou preso em um passado ao qual ela não pertence —, a ex-atriz finalmente solta as rédeas de seu autocontrole. Vivendo em um mundo onde sua filha nunca existiu, Allison Hargreeves desmonta como alguém que cansou de passar a vida toda sendo forte.
Para além disso, a relação familiar da Umbrella Academy se torna cada vez mais real conforme o mundo chega ao fim — pela terceira vez. Diego (David Castañeda) se encontra em um beco sem saída de paternidade, tendo que criar um filho inesperado com Lila (Ritu Arya); Luther (Tom Hopper) finalmente segue em frente de sua paixão incestuosa por Allison e encontra uma nova forma de amor; Klaus (Robert Sheehan) explora a relação problemática com o pai, Reginald Hargreeves, enquanto tenta descobrir mais sobre a sua mãe biológica; e Cinco (Aidan Gallagher) falha miseravelmente em tentar tirar umas férias de ‘salvar o planeta’.
Apesar do roteiro desenvolver um pouco mais da história de cada protagonista, ainda continua preso no mesmo modus operandi. Isso faz com que a trama se torne repetitiva e, em alguns momentos, um pouco previsível. A falha principal é tentar aprofundar a personalidade dos integrantes da Umbrella Academy e não saber equilibrar isso com o decorrer da trama. Por esse motivo, o público acaba a temporada cheio de suposições e perguntas que não foram respondidas.
Mas a produção ainda consegue se safar de grandes furos de roteiro, como os que foram vistos na quarta temporada de Stranger Things, lançada um mês antes. As duas séries contam com um grande elenco e uma história cheia de personagens, porém, The Umbrella Academy consegue se livrar do sentimento de pressa. Ou seja, apesar do enredo repetitivo e dos diversos personagens, a história criada por Gerard Way e o brasileiro Gabriel Bá, apresenta certa fluidez e deixa o espectador ansioso por mais – mas não do mesmo.
Para acertar nas próximas temporadas, The Umbrella Academy precisa fugir da trama do fim do mundo e começar a investir em pontos diferentes. Com o final apresentado no último episódio, os produtores precisam encontrar saídas para certos problemas, como o envelhecimento de Aidan Gallagher — isso porque a terceira temporada se passa apenas 28 dias após o fim da primeira, e o intérprete de Cinco já aparenta estar bem mais velho. Sem contar a existência do Hotel Oblivion em outra dimensão, a descendência alien de Reginald e o surgimento dos poderes da Umbrella, que são exemplos que permanecem sem explicação.
Com a faca e o queijo na mão, tudo que a equipe de produção precisa é inovar no que vem por aí. Como o gibi de Umbrella Academy ainda não tem uma atualização, afinal a terceira HQ, de 12 de junho de 2019, foi a última a ser publicada além do spin-off focado na vida de Klaus, os roteiristas precisam encontrar uma forma de guiar a história sem seguir o mesmo caminho pela quarta vez. Além disso, o desenrolar do terceiro ano abre porta para diversas possibilidades e enredos que fogem do ciclo infinito de ‘tentar sair da caverna do dragão’.