Dando nova roupagem a uma quarta versão do mesmo conto de apaixonados, o longa estreia de direção de Bradley Cooper transmite todo o amor que precisa. Ao lado de Lady Gaga, o ator-barra-diretor é maestro de um espetáculo musical que emociona em seus momentos mais íntimos.
Vitor Evangelista
Jackson Maine (Cooper) é um rockstar a la country já em fim de carreira. Na saída de um de seus shows, ele acaba num bar de drags e encontra o (angelical) talento escondido de Ally (Gaga). A garçonete logo cai nas graças do barbudo e eles embarcam numa caminhada conjunta em direção ao estrelato. Como nem tudo são flores (poucas coisas são), a ascensão de Ally implica no definhamento de Maine.
História já manjada na terra do tio Sam, o grande diferencial da versão de 2018 é a entrega de Bradley Cooper na manufatura de sua visão da fama e do amor. A começar pelo trabalho antes das claquetes baterem: Cooper passou por anos de aula de guitarra, canto, além de personificar manejos de um cantor de rock. Inspirou-se em Eddie Vedder, o frontman de Pearl Jam. O ator chegou a deixar sua voz uma oitava mais grave para convencer ainda mais.
Na direção, Cooper é operante. O trunfo de Nasce uma Estrela é dividido em duas partes. Primeiro, a intimidade acolhedora que ele planta ao redor de seus personagens. Ele e Gaga se encontram em tempestades, maremotos que desestabilizam em cima do palco (as cenas musicais foram gravadas em festivais reais, como o Coachella). Além do casal, Bobby (Sam Elliot, o melhor ator coadjuvante da temporada) é dono dos momentos mais amargos da produção. Irmão do personagem principal, o homem é tanto um ponto de paz quanto o olho do furacão para Jackson. Todas as pequenas cenas de Elliot enriquecem o filme e elevam o grau de paixão em tela.
Lado a lado com a intimidade, Nasce Uma Estrela é estupendo em suas músicas. Tudo devido ao alcance vocal de Gaga e a aura de inocência que sua personagem leva nas costas. Isso até a chegada do terceiro ato.
Nasce Uma Estrela sofre de um grave problema de ritmo. Sua primeira hora é uma das melhores que o cinema produziu no ano passado. Shallow é cantada ali, Gaga ainda explora território desconhecido no campo de sua atuação e o filme mostra (ao invés de apenas dizer) o carinho de seus protagonistas um pelo outro.
Na virada da chave do sucesso de Ally, momento em que a personagem vira propriamente uma caricatura desconfortável de Lady Gaga, é quando o filme retrocede seus méritos. Talvez, por ser um remake, há um degrau de limitação e produção perde a oportunidade de discutir novos temas. Com o final engessado lá da versão de 1937, essa nova leitura caminha em passos telegrafados para seu fim fatal.
Agora, vamos a estrela nascida do titulo, Lady Gaga. Musicalmente, não há o que dizer. Dona de uma identidade ímpar, a cantora se sai muito bem e vai ganhar o Oscar de canção original certamente. Quanto à sua persona atriz, a história é outra. A indicação aos prêmios de Melhor Atriz é justificada (e merecida) pelo magnetismo que ela carrega em cena. É impossível tirar os olhos de Lady Gaga!
Sendo esse seu primeiro grande trabalho da dramaturgia, é evidente sua entrega e comprometimento, mas falta muito para Gaga poder se considerar uma devida atriz. É certo reconhecer que o roteiro (também assinado por Cooper) é ingrato com sua Ally. História de origem bagunçada, relação sem aprofundamento com seu pai, a falta de um sobrenome. Ally é muito mais um marco e uma marca do que uma pessoa. E Lady Gaga faz seu malabarismo com esses pepinos que o diretor joga pra ela.
Com uma trilha sonora cheia de verdade ao construir esse conto fadas do relido do século passado, Nasce Uma Estrela tem tudo para ficar na mente de quem assiste e é a promessa da ascensão iminente de seus protagonistas em novas empreitadas, Gaga na frente das câmeras e Cooper atrás delas.