Laura Sipoli
Em 2003, Mansão Mal-Assombrada foi dos parques para os cinemas estrelando o icônico Eddie Murphy, no que viria a se tornar um dos clássicos do Halloween infanto-juvenil. No filme, que foi baseado em uma das atrações mais famosas dos parques da Disney, o protagonista fica preso em uma casa mal-assombrada com a família e tenta quebrar a maldição que prende fantasmas no local, enquanto lutam para sobreviver. Para os personagens que a adentram, uma mensagem assustadora; para quem assiste ou vai aos parques, um ingresso para diversão.
Duas décadas depois da estreia, temos o prazer de vivenciar o comeback nostálgico da mansão cheia de espíritos nas telas do cinema, com o remake de Mansão Mal-Assombrada. Nesta versão, a comédia de horror carrega o mesmo nome de seu antecessor e conta com uma história completamente diferente. Apesar de cheia de referências na tentativa de despertar a memória afetiva dos fãs do original, a narrativa não tem conexão com o anterior, mas a proposta permanece a mesma: uma casa com 999 fantasmas procura mais almas para aprisionar.
Na obra mais recente, Ben, o personagem principal interpretado por Lakeith Stanfield, é um cientista e um homem cético que enfrenta o luto após perder sua companheira. Acompanhamos a vida triste do protagonista até que, do dia para noite, tudo muda ao ter seus serviços requisitados pelo Padre Kent, vivido pelo espetacular Owen Wilson, que, curiosamente, já esteve em uma casa amaldiçoada antes (The Haunting).
A moradia recém comprada por Gabbie (Rosario Dawson) e seu filho de nove anos, Travis (Chase Dillon), esconde assombrações por todos os corredores. Para se livrar da maldição da mansão que ganha vida após a meia-noite, o padre pede auxílio da engraçada vidente com pinta de charlatã, Harriet (Tiffany Haddish), e do professor aficionado pela história da antiga casa, Bruce, personalizado por Danny DeVito, diretor e ator em filmes de sucesso, como Matilda.
O diretor Justin Simien, também responsável pela direção de Cara Gente Branca e Bad Hair, se mostra orgulhoso não apenas da obra, mas de participar de algo que considera incomum no mundo da Disney. Por ter um elenco predominantemente negro, ele afirmou em entrevista que isso não é uma escolha recorrente no estúdio e acrescentou que “a história foi escrita por uma mulher, eu sou um homem gay e negro, não é algo comum”.
Ainda assim, Mansão Mal-Assombrada tem um roteiro simples, de Katie Dippold, mas que apresenta começo, meio e fim muito bem definidos. Além disso, o elenco de peso conta com nomes renomados como Jamie Lee Curtis – recém-ganhadora do Oscar de Melhor Atriz Coadjuvante em Tudo em Todo o Lugar ao Mesmo Tempo – no icônico papel da médium aprisionada na bola de cristal, Madame Leota, e Jared Leto, como o assustador fantasma Hat Box Ghost.
No entanto, o elenco recheado de grandes nomes não indica que o filme é revolucionário ou que pretende se apresentar como campeão de vendas nas salas de cinema. Assim como seu antecessor, Mansão Mal-Assombrada não foi recorde de bilheteria e, mesmo assim, não busca alterar muitas coisas em seu formato. A ideia não é nada inovadora em relação ao original, ou seja, apesar de desviar um pouco da comédia e mirar no drama, as cenas não se baseiam no aprofundamento do roteiro, mas sim na simulação do que estar no parque da Disney seria.
Lançado junto de dois monstros de bilheteria de 2023, Barbie e Oppenheimer, Mansão Mal-Assombrada foi ofuscada e perdeu parte de seu público para os competidores. Apesar disso, a história prometia agradar o os mais novos e, nesse quesito, tem sucesso. Para quem não acompanhou o filme de 2003, o remake não agradou e carece de ambição: é perceptível que não foi feito para as telonas, mas para ser mais um título nas plataformas de streaming.
Apesar de produzido para divulgar o parque, a película poderia ter mais ambição e ir além de simular uma atração, aprofundando discussões e roteiro. Por exemplo, as sequências de Piratas do Caribe, criado com o mesmo objetivo de Mansão Mal-Assombrada, se tornaram um grande sucesso para o público devido ao seu enredo e criatividade fortes. Pensando nisso, o longa poderia ter se reinventado, utilizado melhor os grandes nomes à sua disposição – que, de certo modo, foram desperdiçados – para superar a fama passada e se tornar mais do que apenas um dos títulos disponíveis no Disney+.
Apesar de simples, a história luta para abordar temas dramáticos. Dentro da casa, Ben enfrenta não apenas as assombrações presas por lá, mas também os fantasmas de sua esposa – que conhecemos apenas por rápidos flashbacks -, a qual ele faria de tudo para ter de volta. Nesse sentido, a atuação de Stanfield, que não é tão convincente como comediante, ainda mais se comparado ao humor perspicaz de Eddie Murphy, é capaz de emocionar nas cenas de drama.
Em mais tentativas da obra de se aprofundar na temática da perda, Harriet, a médium, explica para os personagens que quem já fez parte de suas vidas está em um lugar de paz e que ainda os guiam em sua trajetória. Esse sentimento de esperança plantado pela vidente é um dos fatores que conecta os protagonistas em um clima familiar, a fim de superar suas dificuldades com o luto e se unirem na luta contra a maldição.
Mansão Mal-Assombrada deixa o gostinho de que poderia ter sido mais, mas, na verdade, nasceu para ser um filme ‘sessão da tarde’. O fato de aproximar-se apenas de modo rasteiro de tópicos sensíveis é o que confirma que a proposta era uma comédia de terror que diverte, assusta e não dá medo. Ao final, a produção é um clichê feito para assistir com toda a família e, nesse sentido, cumpre muito bem a sua função.