João Batista Signorelli
Uma viúva de meia-idade se aposenta de seu trabalho em uma igreja numa cidadezinha no sul da Alemanha, e aproveita o momento para reencontrar sua família na região onde outrora viveram à beira-mar. Como um de seus filhos se vê impossibilitado de viajar à Alemanha, ela decide ir a Hong Kong onde ele mora e trabalha para encontrá-lo, porém, ele não está lá para recebê-la. Madeira e Água, exibido na 45ª Mostra Internacional de Cinema em São Paulo, é um filme contemplativo de poucos diálogos, mas cujas imagens dizem muito.
Produzido na Alemanha e França, e com cenas gravadas em Hong Kong, é o longa de estreia de Jonas Bak; uma pequena obra familiar que de início não tinha a pretensão de alcançar um circuito de festivais tão amplo quanto acabou conseguindo. Exibido na seção Perspectivas do Cinema Alemão do Festival de Berlim 2021, o filme é protagonizado pela própria mãe do diretor (Anke Bak), e também contou com a participação de sua irmã (Anke Bak). Ao longo da projeção, vemos fotos da família Bak, além do próprio roteiro ter sido baseado em experiências do diretor, acrescentando um aspecto autobiográfico e semi-documental à produção, onde o diretor busca compreender as sensações experimentadas por sua mãe em um período da vida que permaneceu distante, vivendo na Inglaterra e Hong Kong.
Carregando sempre uma serenidade e compreensão admiráveis, a mãe experiencia diversos contrastes entre a cidade onde vivia e a gigantesca metrópole, marcados por uma imperceptível e bela transição construída pelo movimento das luzes de dois diferentes túneis. Das sombras tranquilizantes da Floresta Negra às arquiteturas impressionantes de Hong Kong, vemos estampados na tela os contrastes entre a cidade e o campo, o oriente e o ocidente, a tecnologia e a natureza. Em meio a uma das regiões com maior densidade populacional do mundo, a mãe vivencia uma inusitada solidão enquanto aguarda pela volta de seu filho.
A fotografia em 16mm recheia o filme de texturas, e a alta distância focal de lente diminui as distâncias entre os espaços na imagem, dando a ela um aspecto mais chapado e próximo. Isso pode ser percebido especialmente na chegada da protagonista a Hong Kong, onde não vemos nenhum plano aberto estabelecendo as dimensões daquela cidade. A câmera de Alex Grigoras permanece íntima até aos prédios, mostrando-os de perto e chamando a atenção para as texturas do concreto e das janelas, cuja artificialidade contrasta com o aspecto natural das árvores e da água da cidade de origem da protagonista.
Em meio ao fervilhamento das manifestações que marcaram a cidade nos anos recentes, a mãe não se revolta em nenhum momento com a indiferença do filho que não aparece para encontrá-la. Na solidão ou nos breves encontros que cruzam os seus dias na grande metrópole, ela encontra a aceitação e a paz de estar bem com as circunstâncias. “Nunca rezo para que as coisas não aconteçam” ela confessa em determinado momento, “rezo para ser forte o suficiente para lidar com o que vier a acontecer.”