Nota Musical – Janeiro de 2022

Arte retangular na cor azul. Do lado direito está a caixa de um CD, este decorado por uma foto de quatro artistas: The Weeknd, Urias, Pitty e Elza Soares. Já ao lado esquerdo, está escrito, em branco, na área superior, “nota musical”. Ao centro, o logo do persona, um olho com a íris na mesma cor do fundo. Logo abaixo, o texto em preto “janeiro de 2022”.
Destaques de Janeiro de 2022: The Weeknd, Urias, Pitty e Elza Soares (Foto: Reprodução/Arte: Vitória Vulcano)

Começando 2022 assim como seu irmão Cineclube, o Nota Musical aproveitou a onda das resoluções de Ano Novo para colocar em prática as mudanças dos 365 dias que seguirão. Em 2021, o mensal do Persona reuniu cerca de 600 novidades musicais em suas 12 edições, trazendo textos individuais da Editoria e dos Colaboradores sobre cada uma delas. Esse ano, o propósito seguirá o mesmo:  reunir os melhores – e os piores – lançamentos da Música em um só lugar. Mas em meio à imensidão das listas de lançamentos mensais, o Persona seguiu o exemplo de Ariana Grande e ampliou ainda mais a coletividade em nossas produções. 

Agora, ao invés de cada colaborador dedicar longos parágrafos sobre cada canção disponibilizada, os personers, em conjunto, serão os responsáveis por coletar as novidades mais importantes e interessantes do primeiro ao último dia do mês na indústria musical. Do pop ao R&B à MPB, dos grandes lançamentos de divas pop às descobertas escondidas no Album of The Year, os membros da Editoria desenvolverão as pautas com as quais têm mais afinidade, e uma dupla será a encarregada de colocar a mão na massa e compilar tudo de mais atual e relevante em um post só.

Devidamente apresentados, antes de darmos o play no primeiro mês do ano, finalizamos as nossas despedidas. No dia 20 de janeiro, Elza Soares descansou de sua revolucionária passagem pelo planeta Terra, que durou ricos 91 anos. É difícil imaginar um mundo sem A Mulher do Fim do Mundo, mas é um consolo lembrar que ela pode receber todo o clamor que lhe era digno enquanto existiu nele. À voz do milênio que eternamente ecoará pela vastidão da música brasileira, refletindo em cada revolução que os nossos artistas viverão graças à sua precursora, dedicamos a primeira edição do Nota Musical de 2022.

Foto de Elza Soares. Em frente a um fundo preto, ao centro, vemos Elza Soares inclinada para a frente, com o rosto apoiado sob as mãos. Elza é uma mulher negra, de cabelos claros enrolados, vestindo uma roupa preta brilhante.
Em mais de 60 anos de carreira, a gigante Elza Soares lançou mais de 35 discos (Foto: Pedro Dimitrow)

Em capítulos anteriores, a pandemia foi figurinha repetida por aqui. Ano vai, ano vem e a covid-19 continua dando as suas indesejadas caras. Disso, o Grammy bem sabe: pelo segundo ano seguido, a premiação musical se viu obrigada a adiar a entrega dos troféus, dessa vez por conta da variante Ômicron. O evento acontecerá dois meses após o previsto, mas o show não pode parar. Na campanha pelos sete gramofones aos quais foi indicada, a rapper Doja Cat dá continuidade a era Planet Her, com o clipe de Get Into It (Yuh). O sucesso do TikTok ganhou um vídeo com lutas alienígenas no planeta fictício da artista, e foi dirigido por Mike Diva.

Outro destaque da maior premiação da Música, porém, não apareceu por aqui em Janeiro. Com o memorável feito de ser indicada no Big Four, as quatro categorias principais do Grammy, Olivia Rodrigo aproveitou seu mês de folga, mas serviu de referência para artistas estreantes no Nota Musical. Enquanto a cantora adolescente GAYLE se inspira na sonoridade da recém-habilitada no single ur just horny, a comediante Blogueirinha alude à capa de SOUR, no álbum-paródia Quem Me Conhece Sabe.

Sintonizando longe do Grammy, The Weeknd provou que seu talento vai muito além do reconhecimento da Recording Academy e de um prêmio dourado na estante. Com Dawn FM, o cantor, compositor e produtor alcançou a almejada transitoriedade entre o pop e o R&B, e, com o conceito de uma estação de rádio rondando a concepção do disco, Abel criou uma experiência imersiva em ambos os gêneros. Do outro lado da moeda oitentista e conceitual, a banda Beach House chegou à penúltima parte de seu projeto musical, Once Twice Melody: Chapter 3 (EP), um disco duplo dividido em 4 partes, disponibilizadas mensalmente desde Novembro de 2021.

Aos poucos, também, outros artistas já atiçam para o que 2022 guarda. Começando bem, Lauv, com a canção 26, e Charlie Puth, com Light Switch, dão o pontapé inicial em suas próximas eras, previstas para saírem em algum dos próximos onze meses. Igualmente sem data, e apenas com o título revelado, o EP Fairies Cum First de Grimes vem aí, e a faixa Shinigami Eyes indica um possível retorno da artista ao universo cyberpunk, em um projeto prelúdio do próximo álbum. 

Capa do álbum Dawn FM. Em frente a um fundo preto, no cantor inferior esquerdo, vemos o símbolo do Parental Advisory Explicit Content. Ao centro, vemos o cantor The Weeknd com uma maquiagem e cabelos e barba grisalhos, que o fazem aparentar mais velho. Ele é um homem negro, de cabelos e barba curtos, vestindo um paletó preto.
Com maquiagem de vovó e a companhia de Jim Carrey, Quincy Jones e Tyler, The Creator, The Weeknd continua sua jornada pela noite (Foto: Republic Records)

Já outros estão mais avançados nas resoluções de ano novo e não deixam a bola cair, como é o caso de Adele, Conan Gray, Avril Lavigne e King Princess. A inglesa dá continuidade à era 30 com o videoclipe de Oh My God. Com seus novos singles, o Jovem Corvo continua inseguro em Jigsaw, que fará parte de seu segundo disco; a Princesa do Rock esbanja confiança e atitude na ‘quebra-tudo’ Love It When You Hate Me, ao lado de blackbear; e a dona do sucesso 1950 divide o microfone e o bloco de composições com Fousheé, na nebulosa Little Bother.

E Janeiro foi repleto de duplas. Na Europa, a revelação pop inglesa Griff, e a veterana norueguesa Sigrid, combinaram seus timbres graves em Head on Fire. No Brasil, os camaleões musicais CHAMELEO e Johnny Hooker se uniram no vampiresco clipe de NHAC!, e a it girl mineira Marina Sena se juntou à baiana Illy, na faixa e no vídeo da tranquila Quente e Colorido. Já sem calmaria nenhuma, a combinação de Ivete Sangalo e Gloria Groove, em Onda Poderosa, exagera na positividade, apesar de cativar com sua sonoridade e impressionar com os vocais. A faixa faz parte da série documental Onda Boa com Ivete, assim como Tudo Bateu, single com Vanessa da Mata.

No tópico ‘internacional’, não há como deixar de mencionar Anitta. A brasileira estourou de vez lá fora e apresentou Boys Don’t Cry, sua mais recente canção, no The Tonight Show Starring Jimmy Fallon, um dos talk shows mais prestigiados dos Estados Unidos. O single, em inglês e com uma levada pop rock, caiu nas graças dos gringos, inclusive de Christina Aguilera. A veterana, que também teve um lançamento importante no mês, o EP em espanhol La Fuerza, rasgou elogios à nossa joia nacional. 

Joias nacionais essas que também deram as caras no México. A brasileira Giovanna Grigio, de Chiquititas e Malhação, soltou a voz no reboot de Rebelde, fazendo por merecer o Rebelde la Serie (Official Soundtrack), a trilha sonora da nova sensação da Netflix. Na leva das soundtracks, a de Euphoria ganhou mais duas colaborações: Tove Lo, com How Long, e Lana Del Rey, com Watercolor Eyes, somaram às canções presentes na segunda temporada da série, dominadas pelo fenomenal Labrinth.

Montagem da capa de Watercolor Eyes. Em frente a um fundo preto, no canto inferior esquerdo, vemos as palavras "WATERCOLOR EYES" em uma fonte branca, em caixa alta e com um efeito que faz com que a letra aparente estar iluminada. Abaixo, vemos a frase “music from the HBO original series”, em uma fonte branca, em caixa baixa. Abaixo, vemos o logo da série euphoria. Ao centro da imagem, vemos Lana Del Rey, com a parte direita de seu rosto coberta por uma sombra e o restante, iluminado por cores em tons de roxo e vermelho. Ela é uma mulher branca, de cabelos castanhos lisos, aparentando cerca de 30 anos, usando rímel e maquiagem com brilhos escorrendo de seus olhos, além de um batom rosado. Na parte superior direita, vemos as palavras “LANA DEL REY” em caixa alta, em branco. No canto inferior direito, vemos o símbolo do Parental Advisory Explicit Content.
Investindo ainda mais no campo musical, a segunda temporada de Euphoria contou com a presença ilustre de Lana Del Rey para cantar o encerramento do episódio Ruminations: Big and Little Bullys (Foto: HBO)

O músico promete retornar ao Nota Musical nos próximos meses, assim como Charli XCX e yeule – ambas, porém, apareceram em Janeiro também. A intérprete do hit Boys continua excelente em referenciar gêneros dos anos 2000 e prova isso na nostálgica Beg For You. O single, colaboração com outro grande nome do pop internacional, Rina Sawayama, fará parte de Crash, próximo projeto da cantora, previsto para Março de 2022. Já o próximo de yeule chegou antes, em Fevereiro. Com a canção Too Dead Inside, a artista, natural de Singapura e radicada em Londres, esquenta para Glitch Princess.

Outra que passou pelos lançamentos do mês, mas quase não surtiu efeito, foi MØ. Motordrome, terceiro trabalho de estúdio da cantora dinamarquesa, não faz feio nem bonito, sem se destacar em relação a sonoridades anteriores. O mesmo acontece com Years & Years, que, agora um projeto solo de Olly Alexander, se perde em um estilo genérico no álbum Night Call

Imagem em retrato. Nela estão Rina Sawayama e Charli XCX, em ordem. Rina Sawayama é uma mulher amarela sul asiática de 31 anos com cabelo preto longo repartido ao meio. Ela veste uma blusa regata off-white com detalhes de tricô e pingentes nas alças. Charli XCX é uma mulher branca caucasiana de 29 anos com cabelo preto longo repartido ao meio. Ela veste uma blusa de manga comprida branca com tecido levemente translúcido. Ambas encaram a câmera, Rina de frente e Charli inclinada com o braço apoiado no ombro de Rina. A maquiagem de ambas é leve, com tons da pele de cada uma. O fundo é uma parede bege iluminada com um feixe circular que se destaca em um tom palha quase branco.
Charli XCX anunciou CRASH, seu próximo álbum, para 18 março; o trabalho contará com colaborações de Christine and The Queens, Caroline Polachek e Rina Sawayama (Foto: Warner Music)

Em terras nacionais, o saldo positivo foi maior do que o negativo. De um lado, a parceria entre o grupo Monobloco, o cantor Romero Ferro e o rapper Rod3030 decepcionou com o “samba-rap de pitada nordestina”, na canção Viver de Love, mas o grupo pernambucano Mundo Livre S/A equilibrou o placar com o álbum Walking Dead Folia (Sorria, Você Teve Alta!), que assumiu um tom político e teve a arte de capa assinada por Wendell Araújo. Já se o single Barbie, de Rebecca, Danny Bond, Pocah e Lexa soou como se fosse planejado para viralizar no TikTok, Karinah e Alcione provaram que não foi carma das colaborações e entregaram uma sintonia invejável em Tô de Partida.

Falando na conexão entre artistas, Pabllo Vittar e Dilsinho se destacaram pelos vocais e pela química na performance de Trago Seu Amor de Volta (I AM PABBLO LIVE). Já Juliette, não teve a mesma sorte. Un Ratito, o primeiro feat internacional da ex-sister, em parceria com Alok, Luis Fonsi, Lunay e Lenny Tavárez, logo foi retirado do YouTube e só fez sucesso no Big Brother Brasil 22, quando foi tocado na performance do DJ. E BBB 22 combina com Brunna, que combina com Ludmilla. Enquanto a esposa está confinada, a cantora lançou a antecipada segunda edição de seu projeto de pagode, o Numanice #2. Das 10 faixas inéditas, que ganharão versões ao vivo em breve, saiu até clipe romântico e jogada de marketing para a participante do reality show.

Por falar em TV, quem brilhou, mais uma vez, foi Marina Sena, performando a viral Por Supuesto e um cover de Material Girl, de Madonna, no Caldeirão. Depois de deitar em muitos sorrisos por aí, a revelação do pop nacional de 2021 será muito bem acompanhada por Urias. Em FÚRIA, um dos discos mais esperados de 2022, a artista mineira estreia trazendo composições que abordam questões de gênero, raça e dramas pessoais. Nos gêneros, ela explora do hip-hop, ao R&B e pop, sem deixar de construir uma identidade musical brasileira. 

Internacionalmente, Bleachers, Katy Perry e Måneskin subiram ao palco do Saturday Night Live, programa humorístico dos Estados Unidos. E seguindo o caminho das guitarras amplificadas, o rock também marcou presença nos lançamentos de Janeiro de 2022. Os britânicos da Muse trouxeram riffs pesados em Won’t Stand Down, os ingleses de Yard Act chegaram com os dois pés na porta com o magnífico disco The Overload – um diagnóstico agressivo e ao mesmo tempo óbvio do Reino Unido pós-Brexit, além de uma homenagem a canção do Talking Heads –, e Pitty desembocou na experimentação colaborativa com seu EP Casulo

Também como uma espécie de colaboração, Cat Power entrou em cena com seu terceiro álbum de Covers, no qual homenageia  Frank Ocean, Lana Del Rey, Nick Cave, Billie Holiday, Iggy Pop, Nico, e até Dead Man’s Bone, projeto musical integrado por Ryan Gosling. As faixas Pa Pa Power, A Pair Of Brown Eyes e I’ll Be Seeing You ganham destaque na voz e interpretação da artista estadunidense.

Viajando pela Inglaterra, os integrantes da Bastille lançaram Shut Off The Lights, quinto e último single de Give Me The Future, álbum que chegou no começo de fevereiro; todavia, a música foi a mais genérica das cinco disponibilizadas antes do disco, visto que todas têm sonoridades diversas entre si, mas as quatro anteriores foram mais experimentais e ousadas. Enquanto isso, Elvis Costello & The Imposters davam origem a The Boy Named If, álbum que reúne canções potentes de rock com letras instigantes e reflexivas. 

Outros britânicos que trouxeram novidades foram o power trio The Smile, com o single You Will Never Work In Television Again. O pequeno grupo é composto pelas figurinhas carimbadas Thom Yorke, Jonny Greenwood e o menos conhecido Tom Skinner, cuja canção faz lembrar, invariavelmente, o Radiohead em seus melhores dias. No entanto, essa foi a primeira faixa divulgada neste novo projeto, e, aparentemente, The Smile fará Greenwood pegar novamente nas guitarras, deixando os pianos e as trilhas sonoras um pouco de lado. Uma das melhores surpresas do gênero. 

Sonic Youth trouxe o registro de In & Out, single divulgado em preparação ao disco In/Out/In, com lançamento previsto para o dia 18 de Março, no qual estará reunido material inédito e raro do grupo, gravado entre 2000 e 2010. A faixa de 7 minutos e meio de duração apresenta uma textura sonora conduzida através de dedilhados discretos de guitarra, acompanhados pelos vocais misteriosos de Kim Gordon.

Já o aclamado quarto álbum de rock de Halsey ganhou uma versão estendida: If I Can’t Have Love, I Want Power (EXTENDED). Na versão maximizada do indicado ao Grammy de Melhor Álbum de Música Alternativa, a cantora apresenta mais três faixas, nas quais duas são inéditas: Nightmare Reprise e People Disappear Here, somadas à já conhecida Nightmare. Assim como o antecessor, If I Can’t Have Love, I Want Power (EXTENDED) foi produzido por Trent Reznor e Atticus Ross, da banda Nine Inch Nails.

Foto colorida da banda Black Country, New Road. Na imagem, os sete integrantes estão lado a lado, em frente a uma cortina de cor vermelha. Da esquerda para a direita estão Isaac Wood, Georgia Ellery, Lewis Evans, que está sentado, May Kershaw, Tyler Hyde, Luke Mark, que também está sentado, e Charlie Wayne. Wood é um homem branco, veste uma camisa social azul e calça jeans de cor azul. Ele possui cabelos loiros e bigode. Ellery é uma mulher branca, veste uma camisa social rosa e veste calça de cor branca. Ela possui cabelos lisos, longos e loiros. Evans é um homem branco, possui cabelos lisos de cor preta em corte curto, e veste um blazer de cor preta e uma camiseta branca. Kershaw é uma mulher branca, veste uma blusa ao estilo regata, com seus braços à mostra, e uma calça de cor cinza. Ela possui cabelos de cor preta. Hyde é uma mulher branca, veste blusa de cor azul e uma calça branca, e possui cabelos lisos e castanhos, com uma franja que cobre toda a testa. Mark é um homem branco, possui cabelos de cor preta e veste uma blusa de cor cinza. Wayne é um homem branco, possui cabelos lisos e ruivos, utiliza um óculos de grau com hastes transparentes, e veste um blazer de cor preta com listras brancas, e uma camiseta social de cor branca.
Lembrando um pouco o Arcade Fire do começo de carreira, Black Country, New Road mantém o maximalismo como força motriz (Foto: Rosie Foster)

A nova sensação do indie contemporâneo, Black Country, New Road, lançou Snow Globes, uma lenta composição de 9 minutos e 13 segundos, que dá total autonomia para a bateria. A canção tem um ar de música composta em jam session, com uma bateria disforme e desconexa dos demais instrumentos, quase como se estivesse tocando uma faixa totalmente diferente. Em entrevista, o baterista Charlie Wayne disse que esse foi exatamente o intuito, além de ser um exercício maximalista do septeto. Contrastando com a expansão de Black Country, New Road, Miles Kane apostou no minimalismo e na introspecção em Change the Show; no entanto, o álbum é mais do mesmo. 

The Lumineers também marcou presença – mas estavam com pressa: com apenas 30 minutos de duração, o quarto disco da banda, BRIGHTSIDE, deu continuidade ao estilo otimista e inspirado do grupo. O cantor britânico Rex Orange County também aproveitou a deixa, e divulgou a música  KEEP IT UP,  primeiro single de seu próximo álbum, intitulado WHO CARES?, com lançamento previsto para março. Já Are We Gonna Be Alright?, segundo álbum dos ingleses da Fickle Friends, chegou explorando gêneros para além das raízes indie-pop dos registros passados de Friends, flertando abertamente com o emo-pop e synth-pop.

Em seu quarto álbum de estúdio, intitulado The Gods We Can Touch, a norueguesa AURORA trouxe uma sonoridade lustrosa, misturando sons orquestrais à música eletrônica, que acompanham a voz e harmonias delicadas da cantora. Cada faixa se relaciona a um diferente deus da mitologia grega – como Afrodite e Perséfone –, explorando a humanidade dessas figuras divinas, e, invariavelmente, refletindo a nossa própria. 

Propondo uma reflexão um pouco diferente, Mitski divulgou Love Me More, canção que compõe Laurel Hell (álbum que chegou às plataformas no começo de fevereiro). O single é frenético, conduzido por batidas viciantes de um sintetizador oitentista que dão continuidade aos hinos dos trágicos amores da artista nipo-americana. Essa foi a canção que mais passou por mudanças no disco, sendo inspirada no ostinato (repetição de batidas) de Tubular Bells, de Mike Oldfield, após Mitski ter assistido O Exorcista. O single veio acompanhado de um videoclipe dirigido por Christopher Good, que também dirigiu Nobody em 2018.

Imagem em paisagem. Nela está Mitski, mulher amarela sul-asiática de 31 anos. Ela tem cabelo preto médio e veste um conjunto de camisa e calça vermelhos. O tecido da camisa é semelhante ao cetim. Mitski está com os braços segurando os cabelos e olha para o lado direito com ar ansioso. No fundo da imagem estão as teclas de um piano em perspectiva e escala ampliada, com tamanho maior que o da própria mulher. A cor do fundo é um azul, esmaecido pelo efeito de uma luz circular branca que está atrás de Mitski.
Com um single viciante, Mitski reflete sobre os amores trágicos (Foto: Dead Oceans)

Japanese Breakfast lançou Nobody Sees Me Like You Do, cover minimalista e delicado da canção de Yoko Ono, trazendo apenas voz e piano – contrastando com a versão original –, em antecipação ao lançamento do disco Ocean Child: Songs of Yoko Ono, que reúne nomes como Sharon Van Etten, David Byrne e Yo La Tengo, cujo lançamento ocorreu hoje, dia 18 de Janeiro, data que marca o aniversário de 89 anos de Yoko. Em Apocalypse Whenever, quarto álbum de Bad Suns, o grupo trouxe canções animadas – contrastando com o título –, e nem um pouco apocalípticas. Com riffs de guitarras e baterias agitadas, e uma sonoridade sintética que remete aos anos 80, a banda resgata referências de trabalhos anteriores que não estiveram presentes no último álbum.

No rap, o controverso Ye (Kanye West) chegou em dose dupla em Janeiro: em parceria com o rapper The Game, o single Eazy foi lançado, retomando uma persona que não dava as caras há um tempo, e dialogando com um possível afastamento do cristianismo em versos que dizem “Deus, Ye, quer deixar Deus entrar?/Mas hoje à noite, acho que vou deixar meu orgulho vencer”. O rapper também divulgou o clipe de Heaven and Hell, carregado de referências pessoais – as mesmas que cercaram o lançamento de Donda –, e trazem Ye como um ser divino, levando figuras duvidosas ao céu (lembre-se das polêmicas envolvendo Marilyn Manson e DaBaby que cercaram o álbum). Os personagens do clipe utilizam vestimentas pretas que lembram as utilizadas por Kim Kardashian no Met Gala 2021.

Capa do disco MAMARU, de RuPaul. Na imagem colorida, vemos RuPaul, uma drag queen de peruca loira claro, fotografada dos ombros para cima. Ela está com um delineado de cor preta, sombras nos dois olhos que misturam as cores azul, roxo e rosa, utiliza uma gargantilha de couro, de cor preta e azul, com um adereço de ferro no meio, e batom de cor rosa na boca. Ela também está utilizando um brinco redondo de cor dourada. O fundo da foto é composto pela junção das cores rosa e azul. Na parte superior esquerda, há um quadrado transparente, com seu espaço delimitado por linhas de cor branca, no qual, dentro, está escrito rupaul mamaru, em fonte de cor branca.
Com a estreia da 14ª temporada de Drag Race, RuPaul chegou com MAMARU, uma coletânea de faixas que só serão tocadas nas passarelas do programa (Foto: RuCo Inc)

Earl Sweatshirt, rapper californiano que integrava o coletivo Odd Future (Frank Ocean, Syd e Tyler, The Creator), lançou o disco SICK!. O projeto foi inicialmente intitulado “The People Could Fly”, inspirado no livro homônimo de Virginia Hamilton sobre contos folclóricos de escravizados; porém, a ideia foi abandonada após a covid-19. Diferente do pensamento inicial, o álbum ganhou caráter reflexivo, melancólico e introspectivo, tanto em sua composição, quanto na sonoridade jazzística mesclada ao rap, com destaque para as faixas Old Friend, Tabula Rasa (feat. Armand Hammer) e Fire in the Hole. Os artistas Projota e iann dior também marcaram presença, com os álbuns A Saída Está Dentro e on to better things, respectivamente.

Também mesclando elementos, o quarto álbum de Baco Exu do Blues, Quantas Vezes Você Já Foi Amado? (QVVJFA?) é uma obra-prima sobre o amor próprio de um homem preto, entre o racismo estrutural e a nova forma de objetificação dos corpos pretos na mídia. Com seu álbum anterior, Bluesman (2018), Baco venceu o Grand Prix no Festival de Cannes, na categoria Entertainment for Music, pelo magnífico curta-metragem divulgado como clipe da canção que dá título ao CD. O prêmio foi dividido entre Baco Exu do Blues e Childish Gambino, que levou por This Is America. Foi a primeira vez que um brasileiro levou o Grand Prix na categoria. Em QVVJA?, Baco utiliza samples de Gal Costa, Vinicius de Moraes e Originais do Samba, e traz a participação de Gloria Groove em Samba em Paris e de Muse Maya em Sei partir

Capa do álbum QVVJFA, de Baco Exu do Blues. Na imagem, quatro fotos de Baco estão colocadas lado a lado. Nas quatro, ele está sem camiseta, à frente de um fundo de cor vermelha. Baco é um homem negro, e possui cabelos em corte curto de cor preta, e barba de cor preta. Na primeira foto, ele está com a cabeça inclinada para seu lado direito; na segunda, ele está de costas e seu rosto está coberto pela sombra; na terceira, ele está com o corpo de frente, porém com a cabeça virada para seu lado esquerdo, e na quarta foto ele está com o corpo e cabeça para a frente. Na parte superior, de forma centralizada, está escrito QVVJFA, em fonte de cor branca. Na parte inferior, de forma centralizada, está escrito Quantas vezes você já foi amado?, também em fonte de cor branca.
Segundo matéria do Correio Braziliense, QVVJFA? é o quinto mais ouvido do planeta no Spotify (Foto: 999)

A inglesa FKA twigs lançou a mixtape CAPRISONGS, trazendo composições que mudam de forma rapidamente, cujo melodrama sentimental continua na elaboração dos versos. No disco, twigs se desamarra dos escândalos de seus amores passados, sem deixar que nenhuma narrativa pública dite o seu trabalho. O título do álbum refere-se às características que regem o signo astrológico da artista (Capricórnio: rigidez e controle), mas que, ao contrário do esperado, se distancia do refinamento milimétrico de seus trabalhos anteriores, apresentando-se mais despretensiosa do que nunca. 

Evocando Weird Fishes / Arpeggi, do Radiohead, mesclado à Needle In The Hay, de Elliott Smith, Nilüfer Yanya lançou midnight sun, segunda música da britânica compartilhada para o seu próximo álbum, PAINLESS, com lançamento previsto para março. Enquanto isso, Amber Mark estreou com Three Dimensions Deep – um dos melhores lançamentos do mês –, projeto fresco e profundo, com bastante referências ao hip-hop e ao pop, mas com a utilização consciente de elementos da Música alternativa, do soul e até da Bossa Nova. Em maio de 2017, ela lançou seu primeiro mini-álbum, 3:33am, e foi indicada ao Grammy de Melhor Álbum de Engenharia (Não-Clássico) em 2019.

Saindo do mundo de língua inglesa e partindo para São Paulo, os integrantes da  banda de indie rock Terno Rei divulgaram Dias da Juventude, canção que funciona como um aperitivo do próximo lançamento do grupo, que deve ser disponibilizado em breve. A faixa parece ter como força motriz a nostalgia, e faz referências à juventude dos anos 90. Segundo Ale Sater, vocalista da Terno Rei, Dias de Juventude “transmite sentimento de nostalgia, amizade, vontade de voltar ao passado e lembranças”.

Na MPB, diversas parcerias marcaram o mês de janeiro: em comemoração aos 40 anos de carreira de Lulu Santos, Futuro do Passado – as Canções de Lulu Santos foi lançado, trazendo 14 participações especiais, que vão de Duda Brack a Pablo Vermell; Adriana Calcanhotto, Fran (neto de Gilberto Gil) e Ubunto chegaram com Vumbora Amar, nova versão da música lançada pelo grupo Chiclete com Banana em 1991; Mário Lúcio e Djavan divulgaram Hino à Gratidão; Márcia Tauil, Cristovão Bastos e Félix Junior lançaram Pro Cristovão, EP composto pelas canções Resposta Ao Tempo – que já foi cantada por nomes como Milton Nascimento, Fafá de Belém e Nana Caymmi –, Cinquenta Anos e Tua Cantiga, música composta por Cristovão e Chico Buarque, e que ganhou destaque no álbum Caravanas, de 2017.

Hermeto Pascoal e seus multi-instrumentos também estiveram presentes: Jegue – uma preparação para o disco Planetário da Gávea, lançado no começo de fevereiro – chegou às plataformas digitais, trazendo em seus 10 minutos de duração um jazz samba energético e caótico, em compasso 7/4. Assim como as demais canções do álbum, Jegue foi originalmente gravada em 1981, no Planetário da Gávea no Rio de Janeiro. Agora, 41 anos depois, as gravações foram oficialmente disponibilizadas em um álbum duplo.

Capa do single Vermelho Esperança, de Chico César e Laila Garin. Na foto quadrada colorida, Garin e César estão semi-abraçados, com ambos olhando diretamente para a câmera e enrolados num tecido. Garin é uma mulher branca, e possui olhos azuis e cabelos crespos loiros. César é um homem negro, possui um cavanhaque de cor preta com leves tonalidades grisalhas, e um cabelo crespo de cor preta. Na parte inferior da imagem, de forma centralizada, está escrito Chico César e Laila Garin, em fontes de cor branca. Abaixo, está escrito Vermelho Esperança, em fonte de cor azul. O fundo da imagem é composto pelas cores rosa e roxo.
A canção Vermelho Esperança foi composta para o musical A Hora da Estrela, baseado no livro homônimo de Clarice Lispector (Foto: Sarau Agência de Cultura)

Enquanto isso, Madu – depois de lançar o EP Estudando Tom Zé –, marcava presença com dois singles: Querubim e A Saudade (Doce Lembrança). Chico César e Laila Garin lançaram Vermelho Esperança, canção composta para o musical A Hora da Estrela ou O Canto de Macabéa, baseado no famoso livro de Clarice Lispector. Cantada pela primeira vez em 2020, somente por Garin, ganha agora uma versão mais que especial, no dueto com Chico César. E, para marcar sua estreia – finalizando nossa jornada de Janeiro –, Zeca Veloso (filho de Caetano), lançou o primeiro single solo: A Rota do Indivíduo (Ferrugem), na qual faz uma releitura da composição de Djavan e Orlando Morais

As premiações e os lançamentos de 2022 estão apenas começando, e o Persona segue a todo vapor trazendo os ruídos amplificados da cultura. Agora que a festa do Nota Musical de Janeiro acabou, a Curadoria tem um novo mês para se reunir e transformar as experiências musicais e a ansiedade para o Grammy em um novo mensal de dicas. Preparem os ouvidos!


Texto: Bruno Andrade e Vitória Lopes Gomez

Pesquisa e Pauta: Ana Júlia Trevisan, Ayra Mori, Eduardo Rota Hilário, João Batista Signorelli, Nathália Mendes, Raquel Dutra e Vitor Evangelista

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