Ana Marcílio
Nova York, Natal e dois jovens totalmente opostos é uma ótima receita para um clichê. E é nessa ambientação que Dash & Lily, a mais nova aposta da Netflix, se desenvolve. Com a produção executiva assinada por Shawn Levy (diretor e produtor de Stranger Things) e Nick Jonas, o caçula dos Jonas Brothers, a série é um aconchego para este fim de ano. Além das músicas muito bem escolhidas, o cenário e a fotografia sabem explorar o que se tem de melhor nos romances adolescentes.
A série natalina é uma adaptação do livro O caderninho de desafios de Dash e Lily, dos autores David Levithan e Rachel Cohn. Apesar das polêmicas que rondam as adaptações, como a falta de fidelidade ou a mudança brusca no enredo, o roteiro de Lauren Moon e Joe Tracz soube aproveitar o melhor da trama. Nela, somos apresentados à história de Lily, uma menina otimista e fã do Natal, e de Dash, um garoto sarcástico e grande crítico dos feriados de fim de ano.
A história dos dois se cruza quando Lily, vivida por Midori Francis, se vê diante do pior Natal de sua vida. Quando percebe que nunca esteve apaixonada, seu irmão, Langston, lhe dá a ideia de criar pistas a um desconhecido e escrever em seu caderninho vermelho, que seria colocado na prateleira de uma livraria.
Quem encontra o caderno é Dash – interpretado por Austin Abrams, conhecido por The Walking Dead e Euphoria -, o desconhecido que embarca nesse jogo pela cidade de Nova York. A dupla troca mensagens pelo caderno, criando uma dinâmica divertida de confidencialidade com o espectador.
Em oito episódios de 28 minutos, a história exala a magia das comédias românticas e o frio na barriga de se apaixonar. Ainda assim, é importante salientar como Dash & Lily consegue se aprofundar em assuntos importantes como o bullying, a rejeição e a superação do passado. O casal cria o contraste perfeito para que o público sinta essa complexidade, em meio aos desafios do amadurecimento. O enredo se desenvolve sobre as expectativas dessa fase, tornando muito real o desenrolar nas telas.
Além disso, a produção da Netflix conta com coadjuvantes tão amáveis quanto os principais. As amizades e as motivações de cada personagem convencem quem está assistindo. Desde a família de Lily até Sofia, ex-namorada de Dash, interpretada pela Keane Marie, há um contraste muito interessante na construção de cada núcleo, dando a profundidade necessária para o desenrolar de conflitos. Uma menção honrosa ao melhor amigo de Dash, Boomer, chave essencial para a trama e muito bem representado por Dante Brown, um dos atores mais jovens da série.
Ademais, a representatividade da série, tanto racial quanto LGBTQIA+, é um ponto de destaque. Somos apresentados a todas essas realidades de forma natural, uma dança muito bem coordenada pela direção. Os produtores tiveram sensibilidade o bastante para criar personalidades cativantes, as quais refletem a complexidade da juventude.
Todavia, algumas cenas são um tanto arriscadas, principalmente por ter um público adolescente em grande maioria – com classificação indicativa de 10 anos. Por exemplo, a cena em que a Lily sai com seus amigos adultos e todos apoiam que ela beba – mesmo tendo apenas 17 anos – e, quando desorientada e cambaleante, não a auxiliam.
Por mais que seja característico de séries juvenis, como em Sex Education e Riverdale, essa exposição e desamparo podem ser muito alarmantes. Não tem como dimensionar a influência de uma produção em pessoas mais novas. Cenas como essa, na vida real, podem ser bem mais perigosas do que aparentam.
No entanto, a série não perde seu sentido por isso. Um clichê digno de corrida em meio aos carros, pedrinhas na janela e beijos apaixonados. Uma história de Natal feita para o Natal. Para quem gosta de romance e esse clima de descoberta, Dash & Lily é um prato cheio. Muito propício, inclusive, para um ano tão turbulento quanto esse 2020. Às vezes, só precisamos de algo que nos faça acreditar – seja na magia do Natal ou no amor. É sempre bom lembrar de se apaixonar pelo imprevisível.