Sabrina de Oliveira
A protagonista Grace (Samara Weaving) é uma jovem que, após se casar com Alex Le Domas (Mark O’Brien), inocentemente aceita participar de um jogo que faz parte da tradição da família do marido (que, aparentemente, tem sua fortuna voltada aos jogos). Visando, principalmente, aprovação dos novos parentes, visto que a maioria destes não gostaram da união dos dois por ela não ter o mesmo poder aquisitivo, Grace tira a carta da má sorte (Hide And Seek) e é obrigada a jogar uma partida de esconde-esconde, que até então não tinha conhecimento do quão mortal se tornaria.
O jogo se inicia ao som de uma música bizarra (que se encaixa perfeitamente) com a letra e o ritmo com sentidos ambíguos, transitando entre uma brincadeira normal e uma ameaça, sendo tocada através de uma vitrola e ecoando à casa toda. Cria-se, então, um momento icônico onde frames vão se intercalando para montar uma cena que mostra a nova integrante da família se escondendo sem entender o real perigo, e os Le Domas que vão se armando para a caçada literal e obstruindo toda possível saída da casa; enquanto Alex vai se desolando com a morte iminente de sua recém esposa.
Logo após esse acerto na produção, não demora para que os erros comecem. As relações entre o elenco vão sendo construídas ao longo do filme, o que na maioria das vezes acontece de forma sucinta e funcional, porém, existem algumas exceções que não possuem um embasamento e acontecem por acontecer, com cenas que tão pouco acrescentariam algo à produção. Algumas piadas vão perdendo o timing e as mortes vão acontecendo e sendo tratadas de maneira não danosa , até mesmo, sem importância.
Aos poucos, o telespectador passa a entender que os perigos trazidos por quem de fato deveria caçar Grace, são dos menores. Tal qual o momento em que uma das crianças sobrinhas dela (que teoricamente não deveriam participar, tanto que as colocaram para dormir) é responsável por dar um tiro em sua mão, sem ao menos os que deveriam estar fazendo isso saberem onde ela estava escondida. O mesmo acontece quando o mordomo da família persegue e chega mais perto de capturar a noiva do que os demais, sendo os dois protagonistas das principais agressões feitas a ela.
Isso é demonstrado também quando membros dos Le Domas, que seriam caçadores, a ajudam a escapar em vários momentos. Como Alex, que destranca o sistema de segurança para que ela saia da mansão e seu irmão Daniel (Adam Brody), que possui a segunda melhor construção (perdendo apenas para a protagonista) e até redenção de erros antigos. Em dadas ocasiões, ele encontra a heroína e a deixa fugir livremente, envenenando temporariamente seus próprios entes nada queridos e levando parte dos créditos pelo desdobramento final.
Mas por que os outros membros da família Le Domas não estarem realmente engajados é um erro? Ao longo de Casamento Sangrento, descobrimos que, na realidade, a fortuna deles vêm de um pacto demoníaco firmado pelas gerações anteriores e que esses jogos funcionavam como sacrifícios para que estes continuassem a ter prosperidade nos negócios. E o principal: se caso não realizassem o objetivo (que, no caso dessa carta, era dissipar a vida da noiva antes do amanhecer) estes morreriam, portanto, não é crível o pouco empenho, observando principalmente que estes foram gananciosos a ponto de comprometerem suas vidas em troca de sucesso financeiro em outra oportunidade.
No papel principal, Samara Weaving, que já era conhecida por seu trabalho em A Babá (2017), entrega uma atuação maravilhosa e carismática. Sua personagem se desenvolve a cada situação, indo de inocente e enganada pelo próprio marido (que sabia da tradição, do risco de que ela retirasse a carta e, mesmo assim, se casou sem ao menos avisar sobre tudo) à determinada a sobreviver a qualquer custo, incluindo matar. Weaving entrega tudo isso com maestria, dando enfoque às emoções e transmitindo-as muito bem ao público, criando uma empatia e sentimento de torcida pela vitória de Grace.
Uma outra menção honrosa vai para toda a construção gráfica do longa. Desde a escolha dos cenários e as paletas de cores que combinam bastante com o objetivo central de cada momento e dando dicas sobre o desenrolar dos acontecimentos, que vão se apagando e tornando violentos conforme o filme vai ficando mais tenso, voltando a clarear lá pelo fim. Como a sala de jogos, que já apresentava elementos cheios de referências a caçadas, com armas e animais empalhados, antes mesmo da revelação de como o jogo iria funcionar. Até os detalhes da maquiagem, conseguem enriquecer minuciosamente a trama, que ironicamente deixam a personagem principal mais suja ao ponto que ela vai chegando mais perto de vencer.
A direção ficou na responsabilidade de Tyler Gillett e Matt Bettinelli-Olpin, que fazem um trabalho no mínimo competente. Eles já haviam trabalhado juntos em outras 4 produções, com destaque para O Herdeiro do Diabo (2014) e V/H/S (2012), ambas pertencentes também ao gênero Terror/Horror. Com o sucesso ocasionado, a dupla assinou outros filmes conjuntamente, e inclusive está encarregada do quinto filme da franquia Pânico, que será lançado em janeiro de 2022.
O final de Ready or Not é um dos pontos altos do filme, trazendo uma traição anunciada desde o início, mas que precisa acontecer de fato para que se perceba e amarre bem toda a sequência de fatos, com o bônus de deixar o espectador e as próprias personagens um tanto quanto surpresos e reflexivos por alguns segundos. Vale ressaltar também que se trata de uma conclusão bem gráfica, com direito a muito gore.
Entre pontos positivos (visual gráfico, atuação da protagonista e timings muitas vezes assertivos) e negativos, Casamento Sangrento prende durante seus 95 minutos que passam rapidamente e consegue se manter relevante (ainda mais durante a Spooky Season trazida pelo mês de outubro). Por fim, o filme revela ser um bom entretenimento momentâneo, sendo uma boa dica principalmente aos amantes de Horror cômico.