Guilherme Barbosa
Em 2002, o caso Richthofen escandalizou o Brasil pela extrema brutalidade do crime, orquestrado por Suzane Von Richthofen e os irmãos Cravinhos. A indústria cultural, desde então, explorou diversas formas de recriar esse trágico evento, seja por meio de livros, podcasts ou no Cinema. Em 2021, dois filmes apresentaram uma nova abordagem, revelando a perspectiva de Suzane e a de Daniel Cravinhos, seu então namorado. Dois anos depois das primeiras adaptações cinematográficas, surge um novo capítulo com A Menina Que Matou os Pais – A Confissão, prometendo narrar os acontecimentos desde a noite do crime até o dia em que confessaram.
O filme vem para completar a história dos antecessores A Menina que Matou os Pais e O Menino que Matou Meus Pais: não há novidade no caso, a diferença fica sobre como o ocorrido é mostrado aos espectadores. O longa apresenta os dias tensos que sucederam a noite do assassinato de Manfred e Marísia, pais de Suzane. Um terceiro olhar à história exibe todo o processo de investigação da polícia para entender como as mortes aconteceram a sangue frio até a confissão dos três envolvidos.
Desde a popularização do true crime, iniciou-se uma discussão sobre a glamourização de serial killers e os crimes que marcaram. O ponto principal é articular sobre até que momento o indivíduo que o cometeu está sendo colocado como sofredor, tirando o lugar daqueles que realmente são vítimas e os colocando como sujeito principal, deixando de lado sua crueldade e violência. Em casos muito famosos como Ted Bundy e Jeffrey Dahmer, que tiveram muitas obras criadas em torno de seus crimes, essa discussão foi muito ampliada.
Quando a Netflix lançou Dahmer: Um Canibal Americano, surgiram muitos debates sobre se realmente havia necessidade de criar mais uma retratação de um caso que afetou e marcou a vida de tantas pessoas, já que a série foi acusada de mostrar o serial killer como vítima em alguns momentos. Com A Menina Que Matou os Pais – A Confissão, não seria diferente levantar o questionamento se era necessário criar mais um capítulo para uma história que foi tão cruel e sensacionalizada pela mídia. Também não é diferente afirmar que mais uma vez um crime grave e cruel foi explorado para criar uma obra cinematográfica puramente mercadológica, visto o resultado raso do filme entre atuações e desenvolvimento.
Com o lançamento, um certo clamor foi gerado com a expectativa de que a direção e atriz principal conseguissem demonstrar a dissimulação, narcisismo, manipulação e frieza de Suzane, uma pessoa tão complexa, que conseguia demonstrar muitas características em um só momento. Carla Diaz, com certa diligência, representa as emoções de Richthofen em ocasiões marcantes para o ocorrido, como no enterro dos pais, no qual ela utilizou calça jeans e um cropped preto. No terceiro ato, temos uma atuação mais contida, tornando os acontecimentos mais convincentes.
Leonardo Bittencourt e Allan Souza Lima, em suas representações dos irmãos Cravinhos, têm desempenhos diferentes. Bittencourt não tem muita precisão em demonstrar o nervosismo que Daniel demandava naquele momento, diferentemente do representante de Cristian Cravinhos, que tem uma das melhores performances de todo elenco ao interpretar aquele que acabou influenciando em diferentes momentos da investigação. O ápice vem no terceiro ato, próximo da confissão, quando ele mostra com muita maestria como o ser humano se comporta sob pressão e nervosismo.
O desenvolvimento do enredo escrito por Ilana Casoy e Raphael Montes ocorre principalmente por meio da investigação do crime. Contudo, na segunda metade do filme, percebe-se uma aceleração em direção ao clímax, resultando em uma conduta que negligencia a exploração aprofundada dos detalhes da apuração do incidente. A habilidade da polícia em conectar todas as peças de um quebra-cabeça tão difícil é bruscamente simplificada, com base em pequenos descuidos dos personagens, o que pode parecer um tanto quanto duvidoso.
Filmes baseados em histórias reais, especialmente aqueles que abordam crimes brutais como o caso Richthofen, são muito desafiadores. A tarefa é complexa e requer uma sensibilidade competente de toda a equipe envolvida. A Menina Que Matou Os Pais – A Confissão é mais uma abordagem comercial e midiática do que uma criação de um testemunho significativo que honre a memória das verdadeiras vítimas.