Dez anos atrás, o Arctic Monkeys se tornava um ‘animal perigoso’ em Humbug

 

(Foto: Reprodução)

Maria Carolina Gonzalez

Nos últimos anos, percebemos que o Arctic Monkeys é uma banda totalmente fora da caixinha. O caminho para a imagem de queridinhos da música alternativa, consolidada com o gel no cabelo e as jaquetas de couro, começou a ser expandido há quase uma década. O terceiro álbum da banda, Humbug, mostrou que os garotos de Sheffield não se contentavam em ser apenas ícones do indie, mas também tinham potencial como promessas do rock.

Até o lançamento do Humbug, em agosto de 2009, não houve descanso. Os dois primeiros anos da banda foram de trabalho intenso após o estouro do Whatever People Say I Am, That’s What I’m Not (2006) e a preocupação de manter seu nome com um sucessor à altura, o Favourite Worst Nightmare (2007).

Foi em 2008, com a formação do The Last Shadow Puppets, que Alex Turner mostrou seu amadurecimento musical além do Arctic Monkeys. A boa recepção do magistral The Age Of The Understatement (2008) mostrou que aquilo não era simplesmente um projeto paralelo, mas um duo com identidade original e fora do esperado. 

Qualquer banda que fez carreira na internet em meados dos anos 2000 corria o risco de facilmente se esgotar ou ser engolida pelo frenesi da mídia. Mas claro que os Monkeys sabiam que não eram qualquer banda. 

Da esquerda para a direita: Matt Helders, Alex Turner, Jamie Cook e Nick O’Malley (Foto: Reprodução)

O primeiro passo para a produção do Humbug não foi apenas sair da zona de conforto, mas sim cruzar o oceano e atravessar desertos – literalmente. Joshua Tree, na Califórnia, foi o destino escolhido, mais precisamente no famoso estúdio Rancho de la Luna. A bagagem que o Arctic levou para essa viagem incluía Jimi Hendrix, John Cale, Nick Cave e (por que não?) The Beatles como principais influências do novo álbum. Para acompanhá-los nessa jornada e na co-produção, nada melhor do que um conhecedor tanto do destino quanto da música: Josh Homme, vocalista e compositor do Queens of the Stone Age.

O lugar que abrigou centenas de bandas e artistas notáveis deu todo o suporte que Turner, Helders, O’Malley e Cook não sabiam que precisavam. A sonoridade do terceiro álbum era até então a mais peculiar e robusta em comparação aos dois trabalhos anteriores. Enquanto o Favourite Worst Nightmare soa agressivo de forma agitada, o Humbug corre de maneira mais frouxa. As três primeiras faixas – que incluem o single “Crying Lightning” – ainda carregam muito da melodia das guitarras agudas e quebradas, só que de forma mais consistente. 

A vocalista do The Kills, Alison Mosshart, dá o ar de sua graça como backing vocal de “Fire And The Thud”. No meio desses quase 40 minutos, as baladas “Secret Door” e “Cornerstone” desaceleram o álbum e Alex abusa do seu charme para compor e cantar músicas românticas no melhor sotaque que a região de Yorkshire pode oferecer. Porém o sossego dura pouco para finalmente dar o espaço que bateria excepcional de Matt Helders merecia e também para o uso até então inédito do órgão, xilofones e até a construção de um coral na sequência final “Dance Little Liar”, “Pretty Visitors” e “The Jewellers’s Hands”. 

Era claro que cantar sobre noitadas em pubs, relacionamentos instantâneos e as mentes vazias da cidade natal não combinava mais com esse novo estilo. Os macacos do ártico viraram adultos sem caretice e expandir sua sonoridade foi quase que uma obrigação. 

Mas não dá pra mentir. Quem conheceu o Arctic Monkeys através de “I Bet You Look Good On The Dancefloor” ou “Fluorescent Adolescent” sabe que o Humbug pode ser bem chato quando se ouve pela primeira vez. Aprender sobre o processo criativo talvez seja mais interessante do que ouvir o álbum em si. Mas negar sua importância é um erro grave. De acordo com crítico Mike Williams, se a banda não tivesse ido para o deserto com Homme, o estimado AM (2013) talvez nem existiria. 

Além da co-produção, Josh Homme participou diretamente de sete faixas do Humbug, entre elas os singles “Crying Lightning” e “Pretty Visitors” (Foto: Reprodução)

Sabemos como o final dessa aventura na Califórnia terminou. O singelo sucessor, Suck It And See (2011), é uma reciclagem tímida, mas bem aproveitada que infelizmente não teve o destaque merecido. Em 2013, vimos o Arctic perder a mão com o êxito comercial do AM e todo o hype construído durante essa era. E ainda assim eles conseguiram a proeza de retornar os pés ao chão, mesmo com a cabeça na lua para criar o Tranquility Base Hotel + Casino, em 2018.

Humbug pode até não ser o melhor álbum (o Favourite Worst Nightmare já estava lá para provar isso), mas peço desculpas aos fãs mais chatos e reforço o clichê que mudanças são importantes. O Humbug foi crucial para perceber que o Arctic Monkeys nunca mais foi o mesmo e é ambicioso o suficiente para nunca mais se contentar em querer ser a mesmo. 

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