Larissa Vieira
Há quem diga que se tornou modinha falar mal de Grey’s Anatomy. O drama médico da ABC, sem dúvida alguma, tem seu charme encantador que agrada grande parte do público, e ao mesmo tempo, afasta outra boa parte dele. Lançada em 2005, a produção vencedora do Globo de Ouro caminhou por 17 e longas temporadas nos últimos 16 anos, que foram como uma montanha-russa, ou melhor dizendo, um carrossel, para os fãs e espectadores da série.
Desde suas primeiras temporadas, a obra de estreia de Shonda Rhimes carrega com si uma fórmula de sucesso: casos médicos aleatórios e bizarros, muitos romances, drama, sexo pelos corredores do hospital e claro, muita morte. É de se esperar, no entanto, que uma produção habituada em um cenário hospitalar carregue a temática morte, mas em Grey’s Anatomy a fórmula tende a matar mais médicos do que pacientes.
Estrelada por Ellen Pompeo, que carrega a trama nas costas durante todos esses anos, a produção ainda é recheada com grandes nomes da televisão estadunidense, como a brilhante Sandra Oh, Patrick Dempsey, Kate Walsh e outras renomadas estrelas, que construíram sua vida dentro das paredes do hospital. Além disso, com tantas temporadas no ar, ela ainda contou com ilustres participantes especiais como Sarah Paulson, Elisabeth Moss, Millie Bobby Brown e Mandy Moore, que trouxeram aquele ar de brilhantismo para o drama da ABC.
Nos últimos anos, no entanto, Shonda Rhimes abandonou a produção, depois de assinar um contrato com a Netflix, e o lugar de showrunner passou para a até então amada escritora das primeiras temporadas: Krista Vernoff. Em 2017, portanto, os fãs deram um respiro de alívio ao ver a responsável por brilhantes episódios estar de volta, já que a série, desde a morte terrível, ou nem tanto, do brilhantíssimo doutor (porém não tão bom marido e irmão) Derek Shepherd, vinha caindo em qualidade.
Como uma luz no fim do túnel, Krista retornou com aquele detalhe único presente nas primeiras temporadas, que preenche o coração dos fãs nostálgicos. A crescente esperançosa, no entanto, foi decaindo, para aquela parte dos espectadores fiéis que ainda sentia falta da magia inicial, mas principalmente, com o final da 16ª temporada e a quebra nos anos de evolução de Alex Karev (Justin Chambers). A desconstrução do maior crescimento pessoal dentro da série decepcionou a todos que tinham a certeza de que o pediatra jamais deixaria a amada esposa pela ex que o abandonou, 10 temporada antes.
A produção, ainda, não mais trazia a similaridade com os anos iniciais, e também não parecia saber criar mais aqueles dramas enrolados, porém interessantes, que marcaram a identidade da série. Mas, em 2020, para a surpresa não só da produtora, mas também dos fãs, Grey’s Anatomy teve que saber criar esses laços conturbados, que já estavam frágeis, carregando com si um grande fardo: a pandemia da covid-19. Era impossível que uma série médica tão popularizada e renomada não abordasse as temáticas perturbadas que a medicina viveu no ano de isolamento, e eles tiveram que saber lidar com isso.
Com alguns atrasos no outono estadunidense, Grey’s Anatomy retornou com a pandemia como seu foco principal, mas mesmo assim, fechando alguns dramas abertos na season finale anterior. O primeiro episódio, então, foi mais um de seus crossovers com a série de spin-off Station 19, que também divide a opinião do público. Apesar de mostrar os momentos iniciais da dúvida e do caos vivido em abril de 2020, o episódio se encerrou com a maior trama que seria abordada no ano: a imbatível Meredith Grey à beira da morte por conta do vírus letal.
Com esse plot, para a surpresa dos fãs, a temporada conseguiu algo que nunca foi imaginado: trazer de volta Patrick Dempsey à produção. O ator se afastou depois de dez cansativos e polêmicos anos no drama médico, mas por conta da importância da abordagem da pandemia e todas suas medidas de segurança, Derek Shepherd decidiu retornar para dar visibilidade à elas. A audiência da série, então, disparou logo em seu segundo episódio, afinal, quem tinha se desligado na 11ª temporada estava ansioso para ver a química poderosa de Pompeo e Dempsey.
Mas para a alegria dos fãs e nem tanto dos produtores, aquilo que caminhava para ser sua última temporada foi ganhando cada vez mais a audiência no horário nobre da quinta-feira na ABC, fazendo com que a emissora buscasse, mais uma vez, a renovação para o programa. Mesmo assim, o roteiro seguiu de pé e não trouxe só um médico de volta, mas sim todos aqueles mortos “injustiçadamente” nos anos anteriores.
A cada episódio, portanto, a audiência aguardava ansiosamente saber qual rosto falecido retornaria à metafórica praia em que Meredith Grey beirava à morte devido ao coronavírus. Com isso, a produção trouxe, de surpresa, George O’Malley (T.R. Knight), Mark Sloan (Eric Dane), a adorada e admirada Lexie Grey (Chyler Leigh) e até April Kepner (Sarah Drew), porém essa, felizmente, retorna ao mundo real. O beira mar silencioso e rochoso, “comandado” em partes por Derek Shepherd, ou melhor, o Derek Shepherd da consciência de Meredith, serviu como o meio para que ela, ou o vírus, escolhesse qual caminho a médica vencedora de prêmios seguiria.
Vivendo anos de glória depois de muito tempo, Grey’s Anatomy se tornou mais uma vez o foco da mídia e do público, principalmente por estar sabendo usar bem parte de sua fórmula, que foi fortalecida pelo sentimento nostálgico dos fãs. Mas o drama médico estava vivendo muito drama e pouco médico. Mesmo com a covid-19 e todas as suas dolorosas complicações sendo o foco secundário da temporada, os fãs clamavam por grandes casos bizarros, aleatórios e em partes divertidos, que preenchiam a série em seu início.
Além disso, a temporada escolheu usar de forma infeliz outra parte de sua fórmula, que estava inutilizada há 6 anos: a morte de um de seus médicos. Depois de toda uma construção de um romance entre a protagonista e o jovem e brilhante aspirante a atendente italiano, Andrew Deluca (Giacomo Gianniotti) morreu de forma decepcionante e desnecessária. Para uma frustração ainda maior do público, todos os acontecimentos que levaram a sua morte, construídos nas temporadas anteriores de Grey’s Anatomy, aconteceram do episódio crossover do spin-off, estressando aqueles que não acompanham o drama dos bombeiros.
Mas com isso, o 16º ano da série já tinha trazido todos os seus elementos perfeitos e ideais para finalizar sua história ali, em um número ímpar de temporadas: teria drama, a volta de personagens clássicos como sempre foi pedido, morte de médicos amados e, mesmo decadente, muita medicina, já que retratava o mundo hospitalar atuante num ano em que ele foi tão importante como de 2020. Infelizmente, a emissora admirou os números de audiência e resolveu pagar, por mais um ano, o salário mais alto da televisão norte-americana para Ellen Pompeo.
A renovação, no entanto, não desagradou só parte do público, mas também atores, que preferiram seguir novos caminhos depois de longos anos na produção, como Jesse Williams e Greg Germann. Com a defasagem de atores e dramas médicos, Grey’s Anatomy e Krista Vernoff terão que aprender, mais uma vez, a se renovar e agradar a parte fiel do público em seu 17º ano.
Mesmo assim, a produção já perdeu a oportunidade de finalizar sua história como sempre foi pedido pelos fãs, com a volta dos amados personagens mortos, que agora, de fato, já tiveram sua história finalizada e poderão viver em paz na praia dos falecidos. Com isso, a fórmula Grey’s Anatomy terá que ser usada mais brilhantemente do que nunca, por que se não, diferente do ano atípico da pandemia, a produção voltará a perder seus números de audiência.
Basta o sucesso da ABC, então, saber voltar a criar os ganchos dramáticos, os sexos fervorosos nos corredores do hospital. E, principalmente, pesquisar e trazer novamente aqueles casos bizarros da medicina para manter os fãs nostálgicos. Isso porque, hoje em dia, são eles que carregam a série nas costas, junto dos atores que ainda não desistiram dela.