Hanna Queiroz
Um dos remakes mais famosos do cinema hollywoodiano é O Grande Gatsby (1949), que foi rodado duas vezes, em 1974 e em 2013. Eles existem para reviver grande produções audiovisuais, que se tornaram ultrapassadas e acabariam se perdendo no tempo, em uma época que o cinema está em constante evolução – ou apenas porque o filme rendeu muita grana e fazê-lo de novo seria o tiro certeiro no público fiel. Ainda assim, isso não significa que todo remake será melhor que o original. É o caso de Tomb Raider – A Origem, nova versão de Tomb Raider (2001) que estrelou Angelina Jolie no papel de Lara Croft.
A franquia é baseada em um game homônimo (1996) e conta as aventuras da personagem, uma arqueóloga e exploradora inglesa. No Tomb Raider de 2018, Lara arrisca sua vida viajando para uma ilha inabitada no Japão, que é conhecida por ser amaldiçoada por Himiko, uma rainha xamânica que destruía tudo e todos a sua volta. O caixão de Himiko se encontra nesta ilha, mas o motivo de sua viagem é outro: saber o que aconteceu com seu pai, que viajou para o mesmo local e nunca voltou.
Dessa vez, na direção do norueguês Roar Uthaug, temos uma nova Lara Croft, interpretada pela talentosa Alicia Vikander, que, assim como o renovado Peter Parker de Homem-Aranha: De Volta ao Lar, é mais jovem, moderna, humana e sociável – ela trabalha e tem amigos. Isso porque a Lara Croft que conhecíamos até então vivia isolada em sua mansão, uma espécie de redoma, apenas com a companhia de um mordomo e seu amigo Bryce. Entretanto, a protagonista mantém sua essência independente, destemida e forte. A arqueóloga mais badass que ganhou vida em Hollywood. O público sabe o quão durona Lara Croft é.
Por este motivo, o filme peca no exagero de cenas que não cabem no enredo do filme, apenas com o intuito de reafirmar aquilo que é a marca registrada da protagonista. A construção da personagem demora demais para quem já possui outros dois filmes em seu nome. Essas cenas – como Lara sendo assaltada no Japão e correndo atrás dos ladrões por uns 5 minutos, somente no intuito de exibir suas habilidades corporais – têm sua importância se forem corretamente dosadas, principalmente para os espectadores de primeira viagem. No entanto, elas são longas e cansativas, fazendo com que o foco principal da história se perca.
O vínculo de Lara com seu pai é algo evidenciado em todos os filmes da franquia mas, neste, a relação emerge de secundária para principal. Ele desapareceu inesperadamente, quando a filha ainda era muito jovem. Com isso, sem a comprovação da morte do pai, a garota renega sua herança e vive uma vida simples no subúrbio, trabalhando como entregadora e praticando diversos esportes, como boxe e bike. Através de flashbacks, que mostram uma relação de cumplicidade e cuidado, o filme marca um traço de personalidade pouco explorado nos anteriores: a Lara emotiva. Assim, o sumiço do pai é tratado de forma muito mais sentimental no remake que, como o nome já diz, conta a origem de tudo, ou seja, como Croft se tornou uma desbravadora de tumbas. E essa história começa quando a protagonista decide viajar de barco até uma ilha inabitada do Japão para esclarecer o que aconteceu, nunca perdendo a esperança de encontrar seu pai vivo, mesmo após sete anos do ocorrido.
Não se pode esquecer que Lara Croft não é uma heroína com super-poderes. Ela é uma jovem com habilidades físicas e mentais muito bem desenvolvidas, que constrói sua trajetória em torno de lendas e maldições místicas, à procura de tesouros perdidos.
A cena que mais causa estranhamento no filme, e até mesmo um tom de deboche por parte do público, é quando Lara está na ilha fugindo dos capangas de Mathias Vogel (Walton Goggins), o vilão da trama, e cai num rio. A protagonista sobrevive a uma queda gigantesca, mal se fere e continua tendo forças para se segurar com uma mão só nos destroços de um avião que, por sorte, estava lá. Quando a cena já foi longe demais e Lara finalmente respira aliviada dentro do avião, o mesmo começa a se quebrar e cair. Novamente por sorte do destino (ou pretensão do roteirista), ela encontra um paraquedas cheio de furos e consegue voar até terra firme. Ela sai dessa somente com um ferro enfincado em sua cintura.
Por mais impossível que isso seja na vida real, Lara Croft é personagem de um game e isso seria facilmente mais uma das missões da personagem. O telão do cinema se transforma em uma tela de videogame. O cenário não parece mais tão real quanto deveria para um filme. Mas está tudo bem, por ser adaptação de um jogo. O que incomoda são os movimentos de câmera confusos e tremidos demais, tornando a experiência das cenas de ação tortuosa para os espectadores, além da trilha sonora exagerada e os cortes bruscos da edição.
O primeiro filme do jogo, na direção de Simon West (O Mercenário 2), também deixa a desejar. Além das múmias de pedra que “morrem” com os tiros da arma de Lara, o pior de tudo é a sexualização da personagem. Angelina Jolie é um mulherão e todos sabem disso. Entretanto, a atriz usou enchimento no sutiã e roupas coladas para agradar o público masculino, sem falar nas expressões sensuais da jovem e os closes constantes da câmera em suas pernas musculosas. Isso não é algo que acontece no novo Tomb Raider, uma evolução notável.
É comum que filmes de aventura sejam confusos devido à tramas mal explicadas, como aconteceu com Batman vs Superman. Contudo, esse acaba sendo um ponto surpreendente em Tomb Raider – A Origem, pois a lenda que movimenta o filme é bem trabalhada e coesa. Himiko foi uma rainha xamanista que governou o antigo Japão no século III, considerada até hoje uma figura histórica do país, e ficou conhecida pela maldição de matar todos que chegassem à sua volta. A abordagem da cultura oriental é algo pouco visto no cinema norte-americano.
O enredo tinha tudo para se tornar o remake que renovaria a reputação da franquia, mas as falhas na execução não deixaram isso acontecer. O roteiro se perde tentando construir uma história coerente mas se esquece do tempo, deixando o público cansado para acompanhar os últimos 30 minutos.