Melhores discos de Março/2019

Sob os olhares julgadores de Beyoncé e Jay-Z, temos que assumir: vacilamos (Reprodução)

Gabriel Leite Ferreira, Leonardo Santana

Erramos. A curadoria dos destaques musicais do mês atrasou de novo e nós sentimos muito. Fiquem agora com o melhor de março e prometemos que a edição de abril não vai demorar tanto. Abraços.

Beth Gibbons & Orquestra Sinfônica da Rádio Nacional Polonesa conduzida por Krzysztof Penderecki – Symphony No. 3 – Symphony of Sorrowful Songs, Op. 36

música clássica moderna, sinfonia

Eu sei que o nome quilométrico e o gênero incomum podem afastar. Até mesmo fãs do irrepreensível Portishead, projeto principal da cantora Beth Gibbons, podem olhar para Symphony of Sorrowful Songs, Op. 36 com preguiça ou subestimação. Mas o fato é que esse já é um dos grandes discos do ano.

O maior compositor polonês vivo, segundo o The Guardian, Krzysztof Penderecki entrega um produto que segue a linha da música clássica moderna. Isto é, nada da grandiosidade intimidadora dos grandes mestres do século 19; antes, a calmaria das notas ressoando e a voz de Gibbons nos guiando por sentimentos estranhamente familiares e aconchegantes. Pra quem quer expandir os horizontes, um prato cheio. (GF)


Deaf Kids – Metaprogramação

música experimental

Desde 2016 o Deaf Kids vem em constante mutação. O trio de Volta Redonda segue ascendente, agora com Metaprogramação, facilmente seu disco mais experimental. Já não é mais suficiente rotulá-los como metal. Os riffs distorcidos passaram a ser apenas um elemento básico em meio a vocalizações sinistras e percussões frenéticas. O que mais chama atenção é a ausência de letras inteligíveis; é como se estivéssemos ouvindo um homem das cavernas, só que em 2069.

O Deaf Kids transcendeu o metal e está apontando novos caminhos da música experimental brasileira. Assistamos e ouçamos, cheios de orgulho! (GF)


Liniker e os Caramelows – Goela Abaixo

soul, mpb

Passaram-se já 3 anos desde que nos apaixonamos pela voz e pelo lirismo de Liniker no hit Zero. De lá pra cá, ela já é conhecida como parte importante de uma geração de artistas — composta também por Linn da Quebrada, Drik Barbosa e outras — que não têm medo de arrancar o público de sua zona de conforto. Mas no segundo disco de estúdio da cantora de Araraquara e sua trupe, a surpresa: Goela Abaixo é um aconchego só!

Não me entenda mal. Não se trata de um trabalho comum, ordinário. Mas temos aqui um álbum que nos abraça o tempo todo, mesmo quando nos questiona ou assusta (espere por surpresas, já que os vocais de Liniker são um instrumento por si só e a performance dos Caramelows não fica pra trás).

Aqui tem muita música de amor mas também sobre auto cuidado, sobre sexo e também carinho. E, mesmo que a produção impecável do baixista Rafael Barone por vezes relembre clássicos como a estreia de Sandra de Sá, o resultado final é fresco e novo. A máxima de que a música atual não presta já caiu faz tempo: com artistas como Liniker, a MPB vai muito bem e obrigada. (LS)


Sidoka – Sommelier

trap

A carreira desse trapper mineiro é recente: ele começou a abastecer seu SoundCloud em 2016. Um ano depois seu feat n’O Menino que Queria Ser Deus do conterrâneo Djonga o colocou de vez na cena. Sommelier é seu primeiro EP (ele também tem um disco cheio, Elevate (2018), e alguns singles na praça). A julgar pela qualidade dessas 6 faixas, Sidoka realmente veio pra ficar.

Sua veia é o deboche. “Ela esquece que me odeia quando tô pela cidade”, canta embebido em autotune na abusadíssima “Scarlett”. No tempo em que cobrar mensagem é lei, Sidoka se mantém fiel ao seu flow veloz. E aos refrões infecciosos – o que é essa “Neblina Fumelt”? Destaque também para a faixa-título e “VIP”, duas das canções mais estilosas do ano. Dê play e só curta a vibe. (GF)


Solange – When I Get Home

r&b, experimental

A cidade de Houston, no estado americano do Texas, é conhecida por muitos elementos: seu amor por carros, a tradição no hip hop e também por ser a cidade natal da família Knowles. Solange, a caçula do clã, por muitas vezes viveu longe do olhar do público. Uma escolha esperta, já que seu amor pela dança, arquitetura e artes plásticas dificilmente seria explorado se ela tivesse passado a vida ocupada com demandas do grande público.

Em 2012, no entanto, reaprendemos quem era Solange Knowles com o seu EP True. Ainda que não tenha recebido aclamação universal, o trabalho realocou nossa atenção sobre a cantora de Losing You e aguçou a sede do público por mais. Agora em seu quarto disco de estúdio, ela já é uma mulher totalmente diferente. Lançado em forma de álbum visual, When I Get Home é um terreno novo para Solange, ainda que tenha inspiração no aconchego do seu lar.

Sonoramente, o trabalho é uma instalação artística completa. Pensado como uma homenagem à Houston, a ideia de rememoração se confirma na forma com que ela verbaliza momentos de sua vida da forma como eles moram na nossa cabeça: fragmentados, inexatas. Way to the Show é exemplo disso, ao evocar a aura da juventude de sua intérprete ao invés de simplesmente narrar as experiências da época. Nada aqui é imediato ou funciona fora de contexto, mas a experiência de ouvir esses fragmentos se juntando em forma de música é divina. (LS)


Tartufo Pessoa – Tartufo Pessoa

mpb

Tartufo Pessoa é Bruno Kayapy (ex-Macaco Bong) munido de violões, percussão e contemplação natural. As 8 faixas vieram à luz do dia inacabadas, depois do multi-instrumentista dizer que estava desistindo do projeto. Pelas constantes atualizações na página do Facebook, ele voltou atrás.

O disco foi gravado em um estúdio caseiro. Para completar o clima intimista, as letras bucólicas que remetem ao Clube da Esquina (Kayapy é mineiro) e à música regional paulista. Um disco que olha pra trás andando pra frente. Para admiradores do folk, vale muito a conferida. (GF)

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