Há 10 anos, Kingsman: Serviço Secreto mostrava que um cavalheiro também pode bater em caras maus

A cena mostra um homem de meia-idade, alto e de aparência refinada, usa um terno cinza risca de giz, gravata listrada e óculos de armação grossa. Seu cabelo é loiro-acinzentado, bem penteado, e ele tem uma expressão séria e autoritária enquanto levanta a mão para um jovem. O rapaz, de pele clara e aparência jovem, veste um boné azul, uma jaqueta preta acolchoada e uma camisa polo listrada. Ele tem um rosto anguloso, sobrancelhas marcadas e mantém uma expressão desconfiada ou desafiadora. A cena ocorre em uma sala de estilo clássico, com paredes verdes, quadros e uma mesa de bilhar ao fundo.
O filme arrecadou mais de US$ 414 milhões mundialmente, tornando-se o maior sucesso comercial de Vaughn até o ano de 2014 (Foto: 20th Century Studios)

Marcela Jardim

Lançado em 2015, Kingsman: Serviço Secreto trouxe um novo fôlego para os filmes de espionagem ao combinar ação estilizada, humor ácido e uma estética sofisticada. Dirigido por Matthew Vaughn, o longa subverteu clichês do gênero ao transformar um jovem marginalizado em um agente de elite, sob a tutela do carismático Harry Hart (Colin Firth). Inspirado na HQ The Secret Service, de Mark Millar, a obra se destacou pela violência coreografada e pelo tom irreverente, equilibrando homenagens aos clássicos de James Bond com uma abordagem moderna e exagerada. O roteiro dinâmico e repleto de reviravoltas, aliado às atuações cativantes, fizeram do longa uma experiência única, misturando o charme britânico com sequências de ação eletrizantes.

A trama acompanha Eggsy (Taron Egerton), um jovem problemático recrutado para uma agência de espionagem secreta chamada Kingsman. Ele é treinado por Harry Hart (Colin Firth), um agente veterano que vê potencial nele. Enquanto Eggsy passa por um rigoroso processo de seleção, um vilão bilionário, Richmond Valentine (Samuel L. Jackson), planeja lançar um plano mortal para “salvar o planeta eliminando grande parte da população mundial por meio de sinais transmitidos via cartão SIM.

A cena mostra dois homens em uma loja luxuosa de alfaiataria. O mais velho, um cavalheiro de postura ereta, veste um terno cinza bem ajustado, camisa branca e gravata escura. Seus cabelos loiros grisalhos são penteados para trás, e ele usa óculos elegantes. Ele mantém um semblante calmo enquanto conversa com um jovem. O rapaz, de estatura média e físico esguio, veste um moletom amarelo vibrante com estampas pretas de letras e símbolos, além de um boné branco. Ele tem traços jovens, cabelo castanho curto e um olhar atento, sugerindo curiosidade ou aprendizado. Atrás deles, prateleiras bem organizadas exibem sapatos de couro, relógios e acessórios sofisticados que, na verdade, são artefatos de espionagem.
Colin Firth treinou por cerca de seis meses para estar em ótima forma física e de luta para interpretar o cavalheiro espião Galahad (Foto: 20th Century Studios)

Kingsman se equilibra entre a sátira e a homenagem ao Cinema de espionagem, misturando luta de classes, feminismo, relacionamento abusivo, estereótipos e violência estilizada. Se, por um lado, exalta a nobreza e a sofisticação dos agentes britânicos, por outro, ridiculariza a fama vazia e o poder do dinheiro. Eggsy é um herói vindo da periferia, mas sua origem é retratada com preconceito: enquanto ele se destaca, seus vizinhos são caricaturas da ignorância e da grosseria. O filme traz personagens femininas fortes, como Gazelle (Sofia Boutella) e Roxy (Sophie Cookson), sem subordina-las a interesses românticos. A direção de Matthew Vaughn dá um tom de quadrinhos à violência extrema, transformando o choque em espetáculo.

O segredo para evitar o colapso dessa mistura está no equilíbrio entre opostos, refletido na escolha de elenco. Colin Firth, conhecido por papéis de realeza e cavalheirismo, interpreta um assassino letal sem perder a compostura. O vilão Valentine inverte expectativas: Samuel L. Jackson abandona sua voz marcante por uma dicção afetada, quase ingênua, que contrasta com sua periculosidade. A presença de Mark Hamill, às vésperas de reassumir Luke Skywalker, é uma piscadela ao público nerd, reforçando o jogo metalinguístico da produção.

A cena mostra o interior de uma sala submersa, um grupo de jovens luta para se manter à tona. No centro da cena, um rapaz de pele clara e físico atlético nada com determinação em direção a um espelho, seu corpo estendido e músculos tensionados. Ele tem cabelo castanho-claro curto, um rosto definido e veste apenas uma calça clara. Atrás dele, outros jovens, também de aparência jovem e físicos variados, demonstram expressões de tensão e esforço enquanto tentam sobreviver à prova. A água tem uma iluminação azul fria, criando uma atmosfera de urgência e desafio.
O protagonista Taron Egerton também é conhecido por interpretar Elton John no filme sobre a vida do cantor, Rocketman (2019) (Foto: 20th Century Studios)

Ainda nesse contexto de metalinguagem, assim como Thanos em Vingadores: Guerra Infinita, da Marvel Studios, Richmond Valentine em Kingsman assume o papel de um ‘messias deturpado’, decidido a salvar o mundo a partir de um sacrifício calculado. Ambos compartilham a crença de que a humanidade está condenada pelo próprio excesso e que apenas uma intervenção radical pode garantir a sobrevivência do planeta. No entanto, enquanto Thanos se apresenta como um agente do equilíbrio, eliminando metade da vida de forma aleatória, Valentine adota um critério ainda mais perverso: só os mais ricos e poderosos merecem viver. Seu plano reflete uma lógica eugenista disfarçada de pragmatismo ambiental, onde os privilegiados escapam do caos enquanto as massas se aniquilam entre si. No fundo, tanto ele quanto Thanos personificam a visão distorcida de que a salvação exige genocídio, mas Valentine escancara a hipocrisia de um mundo onde o poder sempre define quem tem direito ao futuro.

Contrariando as premissas de Valentine, a trajetória de Eggsy mostra que é sim possível manter suas origens e ser digno de ascender socialmente. O protagonista passa por diversas barreiras sociais até alcançar seu lugar no grupo de elite. Mesmo mudando seu comportamento, modos e até mesmo figurino, sua essência é o diferencial que o torna um agente talentoso e empático. Enquanto seus colegas de elite confiam no berço e na tradição, Eggsy sobreviveu a desafios reais, desenvolvendo instintos que o tornam mais adaptável e estratégico. O filme poderia cair na narrativa comum do pobre que precisa se moldar para ser aceito, mas, ao invés disso, reafirma que ele não precisa provar nada – apenas mostrar que sempre teve valor, mesmo quando o sistema insistia em ignorá-lo.

Na imagem, dois homens saem de uma estrutura metálica semelhante a um metro. O homem à esquerda é alto, de meia-idade, com cabelos loiros grisalhos bem penteados e óculos de armação grossa. Ele veste um terno risca de giz escuro, gravata listrada e sapatos pretos bem polidos. Sua postura é ereta e confiante, caminhando com um semblante sério e determinado. Ao seu lado, um jovem de estatura média e físico esguio parece acompanhá-lo com expressão alerta e corpo levemente inclinado para frente, sugerindo urgência e curiosidade. Ele tem cabelos curtos castanho-claros e traços marcantes. Veste um boné azul escuro, uma jaqueta preta acolchoada com mangas cinza, uma camisa polo listrada em tons de azul e branco, jeans escuros e tênis brancos. O ambiente tem um tom industrial, com paredes metálicas e iluminação artificial, reforçando um clima de mistério e ação.
Durante e antes da Primeira e Segunda Guerras Mundiais, os Serviços de Inteligência Britânicos frequentemente usavam alfaiatarias como fachada para suas atividades, assim como acontece no longa (Foto: 20th Century Studios)

O impacto de Kingsman: Serviço Secreto foi imediato, tornando-se um sucesso de bilheteria e consolidando Matthew Vaughn como um dos diretores mais inovadores do gênero. A recepção positiva do público e da crítica garantiu sequências e até um prelúdio, tentando expandir o universo da saga. O Círculo Dourado (2017) manteve a identidade estilizada do original, mas sua história recebeu críticas por exagerar na extravagância, tornando-se menos coeso. Já King’s Man: A Origem (2021) tentou dar profundidade ao universo dos agentes secretos ao explorar as origens da organização, mas acabou dividindo opiniões, não conseguindo replicar o impacto inovador do primeiro filme.

Além da franquia, Kingsman influenciou diversas outras produções que mesclam violência estilizada e humor irreverente, reforçando a tendência de filmes de ação com identidade visual marcante e narrativa ousada. A estética visual e o uso criativo da câmera, como na icônica cena da igreja, tornaram-se referência no Cinema de ação moderno. Mesmo após uma década, o longa continua sendo um marco para o gênero, provando que a espionagem pode ser reinventada para novas gerações sem perder o carisma e a sofisticação que marcaram os clássicos.

Apesar do sucesso inicial, o futuro da franquia permanece incerto. Com a recepção morna das sequências, há dúvidas sobre sua capacidade de continuar inovando sem perder sua essência. Entretanto, o impacto de Kingsman: Serviço Secreto já está consolidado, e sua mistura de ação explosiva, irreverência e estética refinada garantiu seu lugar como uma das obras mais memoráveis do Cinema de espionagem contemporâneo.

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