Diretor de “A Morte do Cinema e do Meu Pai Também” destrincha o caráter biográfico da obra
João Batista Signorelli
Dando continuidade à série de entrevistas realizadas pelo Persona durante a cobertura da 44ª Mostra Internacional de Cinema em São Paulo, o entrevistado da vez é o diretor israelense Dani Rosenberg. Rodando festivais ao redor do mundo com seu seu segundo longa A Morte do Cinema e do meu Pai também, e inclusive marcando presença na Seleção Oficial do Festival de Cannes, o diretor compartilhou um pouco do seu processo de criação, que mistura documentário e realidade para construir um relato pessoal sobre perda e memória familiar.
O diretor narrou sua trajetória desde sua graduação na Jerusalem Film School, passando pela produção e circulação de seu filme, chegando às dificuldades criativas decorrentes do momento atual de pandemia. De maneira muito simpática e empolgada, ele se abriu para falar tanto sobre as questões familiares pessoais retratadas no filme, quanto sobre sua paixão e influências no cinema.
Tendo se formado há aproximadamente 10 anos na faculdade, além de curtas, Dani realizou duas séries de TV. “A televisão estava no seu pico com a chegada da HBO e da Netflix um pouco depois. Todos diziam que a televisão era o futuro, e eu queria fazer parte do futuro.” Ainda assim, não tardou muito para que ele descobrisse que sua ambição era outra: “Depois de um tempo, eu entendi que o cinema estava no meu coração, então eu voltei para fazer este filme [A Morte do Cinema e do meu Pai também]”.
Com uma narrativa metalinguística que transforma em ficção suas experiências pessoais, Dani conta como ao longo do processo de produção, ele foi encontrando a história que queria contar. “Ele foi feito em camadas, e os fatos ocorreram de modo bem parecido ao que é visto no filme.” O roteiro foi escrito para seu pai que estava com câncer e poucos meses de vida pela frente. “Meu pai viveria o protagonista junto com a minha própria família. (…) seria sobre esse homem que tenta salvar sua família de uma guerra contra o Irã”.
“Nós filmamos por alguns dias até que meu pai caiu, ele estava doente e com dor, então paramos a gravação” relata o diretor. “Depois eu parei a filmagem, eu tentei filmá-lo com a câmera que já tínhamos, mas ele não quis como você vê no filme.” Após o falecimento do pai, ele tentou novamente fazer o filme com outro protagonista, mas não via mais sentido em produzir o filme sem o pai.
Diante da dificuldade de prosseguir com uma história, e talvez influenciado por Charlie Kaufman e seu filme Adaptação (2002), sua reconhecida fonte de inspiração, Dani resolveu transformar suas próprias dificuldades em contar uma história em história. “Então eu reescrevi o roteiro do rascunho, contando o que havia acontecido: seria sobre um filho que tenta fazer um filme com o pai adoecido, ao mesmo tempo que lida com o relacionamento com sua esposa que está para ter um filho.”.
Perguntado sobre o processo de transformar suas próprias experiências em ficção, ele responde que mas também criou situações que ele havia imaginado com o seu pai, mas que não ocorreram realmente. É o caso da cena em que os dois encenam o assassinato de um primeiro ministro, em um momento de aproximação entre pai e filho. “Eu não tinha proximidade com o meu pai, então foi algo bom de se criar.” Além disso, também conta que tentou entender o lado e dar voz à personagem que representava a sua ex-esposa, e lhe dar voz.
Concluído o filme, ele não sentiu como se o filme estivesse completo. “Eu não gostava do filme, parecia um círculo sem centro“, conta. “Então eu entendi que esse centro eram as imagens reais que eu gravei com o meu pai”. Passando a colaborar com a editora veterana Nili Ferrer, que trabalhou no vencedor do Oscar Valsa com Bashir, eles trabalharam com o material durante um ano para encontrar o equilíbrio entre documentário e ficção.
Sobre a distribuição e a exibição do longa em festivais, ele lamenta nunca ter visto o filme com uma audiência, que teve exibições virtuais em festivais, e até chegou a ter algumas projeções em salas de cinema. Ele comenta a situação atual dos cinemas fechados em meio à pandemia: “Quando eu dei o título ‘A Morte do Cinema’ não era isso que eu estava esperando”, brinca. Ao mesmo tempo, Dani Rosenberg também se mostra empolgado em dialogar com o público do mundo todo pela internet, que se tornou sua única conexão com a audiência.
Carregando referências do Cinema Iraniano, como Abbas Kiarostami e Samira Makhmalbaf, além de mestres europeus como Pier Paolo Pasolini, Dani não pretende parar com A Morte do Cinema e do Meu Pai Também. Ele já conseguiu dinheiro e tem o roteiro pronto para seu próximo projeto. Porém, diante da pandemia, sente que o texto precisa de um novo norte: “É um roteiro bem fechado, mas eu sinto que atualmente não há muito sentido em narrativas fechadas pois não parecem haver respostas, não há uma conclusão”.
A Morte do Cinema e do Meu Pai Também está sendo exibido em festivais ao redor do mundo.