Giovanne Ramos
Em 29 de junho de 2016 a empresa sul-coreana de entretenimento YG Entertainment – responsável pelos veteranos e bem sucedidos Big Bang, PSY e 2NE1 – anunciou a formação completa do novo grupo feminino que passaria a representar a companhia no mercado do K-Pop. Reveladas ao público pelo nome Blackpink, as integrantes Jennie, Jisoo, Lisa e Rosé estrearam com as faixas Boombayah e Whistle, ambas presentes no single Square One. Juntando o EDM já conhecido do pop ocidental com o hip hop característico da YG, logo alcançaram o topo das paradas e caíram nas graças do público local e internacional. O esperado do histórico da empresa que é uma das maiores no quesito de vendas digitais em território sul-coreano.
Fazendo comebacks – volta do hiatus com um nova música de trabalho – o sucesso do quarteto só cresceu durante os 4 anos de carreira, tornando-as um dos maiores grupos femininos de todos os tempos. Se BTS estava fazendo história em nome da parte masculina do gênero com as suas parcerias internacionais e visibilidade quase que global, filhas da YG foram responsáveis por quebrar as barreiras continentais das artistas femininas. Em 2019, por exemplo, fizeram história ao ser o primeiro ato do K-pop a performar nos palcos do festival estadunidense Coachella. Nesse ponto, as meninas já haviam se tornado um fenômeno, colecionando recordes em streamings, público em turnê, no meio editorial da moda e do mercado de entretenimento no geral, garimpando fãs pelo mundo todo.
Com todo esse histórico, no entanto, até o final de 2019 a discografia não era algo a se orgulhar. Mesmo com muitos hits, as intérpretes de Kill This Love lançavam anualmente mini álbuns de até 4 faixas inéditas, estando bem aquém de conterrâneas como Twice e Red Velvet, que no mesmo período já possuíam mais que o triplo de repertório. Após muita pressão dos fãs e do público em geral, no início de 2020 a YG começou a especular pelo álbum. Os boatos foram seguidos da parceria com Lady Gaga, Sour Candy, a colaboração mais inesperada do ano, aumentaram as expectativas para o material que nessa altura já estava previsto para o meio do ano.
A trajetória do The Album foi diferente da fórmula utilizada pelo girlgroup até então. Antes da estreia no dia 2 de outubro, a energética How You Like That e a descontraída Ice Cream (parceria com a cantora Selena Gomez), foram lançadas dentro de um período de 2 meses, acabando com a época de vacas magras de uma volta por ano. Em How You Like That, retomam com o estilo cheio de atitude com versos afiados e refrão repetitivo acompanhado de uma batida trap, traços já vistos em Ddu-Du Ddu-Du e Kill This Love. A surpresa mesmo veio com Ice Cream, um bubblegum pop divertido ainda não experimentado pelas artistas. Apesar de diferentes, ambas já dão indícios do que poderá ser encontrado no projeto final: colaborações ambiciosas e as mixagens conhecidas do produtor Teddy.
Alguns pontos chamaram a atenção no lançamento do primeiro trabalho coreano das garotas. Primeiramente, o álbum veio acompanhado do último single Lovesick Girls, que além de contar com créditos de composição para as integrantes Jennie e Jisoo, é a primeira música em muito tempo com um refrão definido. Melancólica, o dance-pop se assemelha à algumas canções ocidentais já ouvidas antes, algo próximo do duo sueco Icona Pop. Tem um clima mais contido em relação aos singles anteriores, mas funcionou bem para o grupo que soube tornar a música ainda mais interessante com a estética impecável do videoclipe.
Outro ponto que chamou atenção logo que saiu a tracklist foi Bet You Wanna, parceria com Cardi B, uma das maiores rappers do momento no mercado mainstream. Havia uma expectativa da combinação dos versos fortes de Cardi com o então desenvolvimento das meninas que já possuem uma familiaridade com o gênero, mas o peso de ambas partes não vingou. A faixa acabou sendo uma das mais fracas do álbum, com um ritmo destoante, quase que acústico. Está longe de ser ruim, só não cumpriu o que o os ouvintes estavam esperando.
Liricamente, as temáticas se mantêm as mesmas. Letras que parecem numa primeira leitura inocentes, mas numa segunda leitura você percebe que se tratam de uma malícia com duplos sentidos, bem atrevidas por sinal. Temáticas que ressaltam a autoestima das cantoras, os amores superados e a vontade de apenas se divertir constroem a narrativa do álbum, tornando ao menos o conceito, bem coeso com que o já apresentado anteriormente em outros trabalhos musicais.
O conjunto da obra funciona. Num primeiro pensamento, o fato da tracklist ser curta – 8 inéditas -, decepciona, mas talvez tenha sido uma decisão segura, para que não se tornasse um LP repetitivo. Um maior número de canções poderia cometer dois erros, o de faixas que nada têm a acrescentar e só preenchem espaço – algo muito comum no K-pop – e se tornar cansativo conforme a viagem da escuta. Com o número bem selecionado, todas têm um brilho próprio dentro da produção. Um destaque para Pretty Savage, uma das letras mais ousadas da carreira e que define a essência do que Blackpink é.
Em relação à recepção, o projeto não agradou somente aos fãs e simpatizantes, foi também sucesso de críticas, sendo já considerado como uma assinatura do grupo e uma aventura agradável mesmo que com 25 minutos. Em relação ao sucesso comercial, o lançamento rompeu a barreira de 1 milhão de vendas apenas na pré-venda, um recorde para girlgroups que não era superado desde 1968 – um marco segurado pelas The Pearl Sisters durante 52 anos -. Como as próprias dizem em suas letras “Blackpink é a revolução”, e o The Album veio para confirmar isso.