A Noite que Mudou o Pop: um encontro imperfeito, mas emocionante

Cena de A Noite que Mudou o Pop. Na imagem, parte dos 45 artistas convocados para cantar aparecem posicionados em um estúdio de gravação. Em frente a todos eles está Quincy Jones, um homem negro, produtor da música We Are The World. Ele veste roupas casuais e usa um fone de ouvido. O cenário é composto por tons amarronzados, espumas nas paredes e um telão ao fundo dos cantores.
O documentário estreou em primeiro lugar na lista de produções mais assistidas da Netflix (Foto: Netflix)

Nathalia Tetzner

O cenário é o estúdio de uma clássica gravadora em Los Angeles. No ambiente, as espumas nas paredes evidenciam o cantarolar de uma voz familiar e icônica; Michael Jackson ensaia We Are The World sozinho, enquanto Lionel Richie orquestra, nos bastidores do American Music Awards, o que pode ser considerado o mais importante encontro da história da Música. Seguindo o embalo de tantas vozes que marcaram gerações, A Noite que Mudou o Pop emociona, ainda que seja um documentário tão imperfeito quanto a tentativa de unir timbres diferentes em uma só faixa e atenuar egos inflados em prol de uma causa humanitária: a fome no continente africano.


Através das lentes de Bao Nguyen – diretor veterano de documentários, como a biografia de Bruce Lee, Be Water (2020) –, o público assiste à registros e depoimentos inéditos do encontro entre as 45 maiores estrelas da década de 1980, enquanto contempla Lionel Richie se reencontrar com as memórias de uma noite inesquecível. O intérprete de Say You, Say Me age como um ‘fanfarrão’ e aproveita de sua aura de apresentador nato para tentar transformar o filme em algo apoteótico. Por vezes, a narração soa exagerada e redundante, porém, é difícil julgá-lo por isso, afinal, qualquer mero mortal também passaria uma eternidade se gabando caso fosse o responsável por tamanha façanha.

Cena de A Noite que Mudou o Pop. Da esquerda para a direita na imagem, Cyndi Lauper e Bruce Springsteen estão sentados no estúdio de gravação. Lauper, uma mulher branca de cabelos loiros e coloridos, veste uma camiseta branca e muitos acessórios enquanto segura um papel com os versos de We Are The World. Já Springsteen, um homem branco de cabelos escuros, veste jaqueta de couro preta sobre uma blusa azul enquanto olha para a cantora. Ao fundo, o cenário apresenta tons amarronzados.
Cyndi Lauper quase desistiu de participar do projeto porque seu namorado na época duvidou do sucesso da canção (Foto: Netflix)

O contexto dessa missão quase impossível é explorado por The Greatest Night In Pop (no original), que faz questão de relembrar cada passo e demonstrar como ela atravessou o AMA’s, tradicional premiação da indústria musical estadunidense. Richie, que estava celebrando um ótimo ano na carreira, precisava coordenar aqueles astros sentados na plateia para o estúdio de gravação. Todos foram inicialmente convidados por Harry Belafonte, músico e ativista idealizador da iniciativa que se assemelhava ao Band Aid; união dos artistas britânicos e irlandeses. Ao seu lado, Quincy Jones é referenciado, no longa, como a peça fundamental para extrair o melhor do supergrupo USA For Africa.

Durante o documentário, o telespectador acaba se identificando com um ou outro artista e, até mesmo, se surpreendendo com a postura de outros. No campo dos que conquistam a audiência, a irreverência de Cyndi Lauper, o estilo de vocalização único de Bruce Springsteen – alerta: Born In The USA gruda mais na mente do que We Are The World –, o sorriso genuíno de Diana Ross e a timidez de Bob Dylan preenchem a tela. Por outro lado, a falta de paciência de Waylon Jennings com um Stevie Wonder muito animado, e a ausência de Prince, que venceu vários prêmios da noite em categorias que Michael Jackson também concorria, somaram-se como pontos desagradáveis de acompanhar.

Cena de A Noite que Mudou o Pop. Da esquerda para a direita na imagem, Michael Jackson e Lionel Richie estão sentados no estúdio de gravação. Jackson, um homem negro de cabelos escuros, veste roupas escuras enquanto segura um papel com os versos de We Are The World. Já Richie, um homem negro de cabelos escuros, veste jaqueta de couro preta sobre uma blusa branca enquanto folheia o mesmo papel. Ao fundo, o cenário apresenta tons amarronzados.
We Are The World foi escrita por Michael Jackson e Lionel Richie, e produzida por Quincy Jones e Michael Omartian (Foto: Netflix)

Indicada em três categorias do Emmy 2024, a produção da Netflix é uma concorrente forte pela estatueta de Melhor Documentário ou Especial de Não-Ficção e Melhor Edição de Som em Reality ou Programa de Não-Ficção, assinada por Richard Gallagher. O diretor, Bao Nguyen, ainda enfrenta nomes consolidados pelo prêmio de Melhor Direção em Documentário ou Programa de Não-Ficção. A Noite que Mudou o Pop mira na nostalgia de tempos que não voltam mais e acaba, consequentemente, celebrando Lionel Richie como um dos grandes nomes da época. Embora tenha altos e baixos, exatamente como a faixa que arrecadou 60 milhões de dólares em fundos para a África, a emoção deixa a última e boa impressão.

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