Jamily Rigonatto
Uma travessia de 180 km, Annette Bening e Jodie Foster, a soma equaliza uma das maiores produções inspiradas em histórias da vida real dos últimos anos: NYAD. A trama lançada pela Netflix em 2023 traz um combo de veracidade, suspense e uma atuação de primeira, com um equilíbrio bastante acertado. Dirigido por Jimmy Chin e Elizabeth Chai Vasarhelyi, o longa-metragem mixa tons de persistência e uma ousadia quase negligente.
O filme conta a história da nadadora Diana Nyad (Annette Bening) que, aos 60 anos, vai em busca de refazer um feito que tentou aos 28: atravessar o oceano de Cuba até a Flórida nadando. O sonho que já parecia completamente insano na juventude, quando a protagonista persistiu por 42 horas no trajeto com uma gaiola de tubarão, mas não conseguiu aguentar, agora soa impossível. No entanto, quebrar as regras do lógico é uma das características desta história.
A questão de correr riscos não se limita a Nyad enquanto pessoa ou personagem, mas também é compartilhada pelas escolhas de roteiro do longa. Os frames decidem seguir por um caminho que poderia dar completamente errado, já que juntam cenas da verdadeira nadadora quando estava na casa dos 20 anos com a atuação impecável de Bening a interpretando na terceira idade. Em uma completa imprevisibilidade, o recurso funciona perfeitamente bem. As duas definitivamente são uma e não há como questionar.
O movimento entrega quem está por trás do enredo, que tem como nomes responsáveis o de Julia Cox e o da própria Diana Nyad. Assim, percebemos o motivo da narrativa tratar tudo com tantos detalhes e conseguir levar a atleta para a tela em literalidade. Sobra também a sensação de que assistir a produção é uma experiência entre invadir os bastidores de um dos maiores feitos da história do Esporte e ver flashs de um documentário bem embasado.
Uma jornada como a de NYAD não poderia ser feita em papel solo e aí entra a presença de Bonnie Stoll (Jodie Foster). A treinadora e a nadadora são sublimes juntas, completamente capazes de encantar os espectadores mais exigentes. O companheirismo, a cumplicidade e a comicidade na relação entre as duas são completamente intoxicantes – na melhor das versões do termo.
Fica um lembrete de que a atuação de Foster é totalmente acertada. Ela passeia entre ser dura, como são as treinadoras, e emocionada, como são as amigas, resultando em alguém que se compara a quem está do lado de fora. Ao apoiar a protagonista nessa aventura ‘fora da caixinha’, há o cumprimento do ideal de que, sim, podemos fazer qualquer coisa. Entretanto, também sobra preocupação e uma jornada de desespero e medo.
É essa dualidade que talvez cause o maior dos incômodos ao assistir o filme. Por um lado, é muito inspirador ver uma mulher que aos 60 anos não desistiu do seu sonho, luta por ele e o conquista. Por outro, é extremamente agoniante testemunhar a jornada de alguém que simplesmente se joga aos tubarões por uma conquista que, talvez, nem seja tão relevante quando você já foi uma das maiores de sua época.
Apesar dos pesares, NYAD vem do real e não cabe a nós questionar um sonho. Ainda mais quando ele resulta em uma história que já é incrível fora do audiovisual e, dificilmente, se tornaria menos interessante no vídeo. É claro que o Oscar 2024 também não discorda e a obra concorre nas duas categorias femininas de atuação, com Jodie Foster indicada a Melhor Atriz Coadjuvante e Annette Bening a Melhor Atriz.
As atrizes também foram notadas por outras premiações de peso, como o Globo de Ouro, nas categorias Melhor Atriz em Filme de Drama e Melhor Atriz Coadjuvante. Afinal, elas de fato merecem ser reconhecidas, já que encarnaram suas personagens. Além disso, a produção concorre como Melhor Filme no GLAAD Media Awards, que acontece no dia 14 de Março de 2024, pouco após a cerimônia do Oscar no dia 10.
Ao fim, não existem dúvidas, NYAD vale mais que a pena. Do dinamismo ao suspense, tudo é bem feito o suficiente para merecer uma apreciação com direito a pipoca e ‘gritinhos’ de incentivo a Nyad como se aquilo estivesse acontecendo ao vivo. Também é o tipo de história que com certeza precisa ser conhecida e não há nada melhor do que fazer isso por meio de uma boa produção audiovisual.
Por aqui não costumamos datar os textos, mas seria impossível a crítica sobre uma grande mulher sair no dia oito de Março e não lembrar do Dia Internacional das Mulheres. Diana Nyad é gigante, apesar das controvérsias, e é sempre um prazer assistir obras que contemplam figuras femininas donas de si e, com certeza, representam essa data com destreza. Nem a fúria de um oceano conseguiu parar uma mulher determinada, porque na narrativa de quem se escreve, não existem obstáculos capazes de impedir a vitória.