Vitória Borges
Carinhosamente conhecida como a ‘primeira latina do mundo’ pelo público do X, antigo Twitter, a colombiana Shakira finalmente lançou seu tão aguardado 12º álbum. No intitulado Las Mujeres Ya No Lloran, a artista traz, em suas composições, dores e vivências após o divórcio do ex-marido Gerard Piqué, que ganhou grande repercussão nas redes. A obra possui uma profundidade emocional que ressoa fortemente em cada uma das faixas.
Lançado pela gravadora Sony Music Latin, o sucessor do hipnótico El Dorado – ganhador do Grammy de Melhor Álbum Pop Latino em 2018 – compartilha o recomeço em meio ao caos, combinando sentimentos com a clássica assinatura sonora de Shakira. A produção não foge muito do estilo da cantora, que consegue ‘dar sua cara a tapa’ nas faixas da obra e fazer uma saborosa limonada com os limões que foram jogados em seu colo.
O álbum surge após um período turbulento marcado por desafios pessoais, profissionais e problemas fiscais. A cantora, que agora administra as tarefas domésticas sozinha e desempenha seu papel como mãe solo honrosamente, soube muito bem transformar suas angústias em lucro ao cantar sobre ‘sofrência’ e traição, assim como a eterna Marília Mendonça.
Seja no amor ou no ódio, a intérprete de Waka Waka sempre prezou por compôr canções dedicadas a Piqué. Mas, dessa vez, a principal inspiração para o conceito do álbum foi o remorso que a artista guardou pelo ex-marido. O disco, que conta a história desde o rompimento doloroso até sua recuperação, simboliza um novo recomeço na vida da cantora. As letras falam de saudade e o quanto ela se esforça para conseguir seguir em frente, afinal, assim como a ‘mãe da América Latina’, muitas pessoas também já sofreram e sabem o peso da dor de uma traição.
A produção do álbum conta com múltiplos produtores, como Lexuz, Ciey e até mesmo a própria artista. Em 51 minutos de duração, a colombiana apresenta oito canções inéditas, além de outras sete já lançadas nos meses anteriores. Nas composições, ela passa a limpo todo o turbilhão de sentimentos que passou em sua vida pessoal e no seu relacionamento. “A produção desta obra foi um processo alquímico. À medida que escrevia cada música, eu me reconstruí. Quando as cantei, minhas lágrimas se transformaram em diamantes e minha vulnerabilidade em resiliência”, disse a cantora em um post no Instagram.
Repleto de colaborações que somam para a qualidade sonora do álbum, a obra conta com artistas de peso e de atual relevância na comunidade latina. Ostentando suas raízes colombianas, em TQG, temos, de um lado, Shakira sofrendo por Piqué e, do outro, Karol G lamentando seu antigo relacionamento com o rapper porto-riquenho Anuel AA. A mecânica das colaborações consegue extrair excelentes ideias musicais, tornando a característica de cada um dos convidados em algo único e ornado com seus talentos melódicos.
Seu primeiro lançamento em sete anos é um manual de capacitação para qualquer pessoa que tenha sofrido por perdas, independentemente de qual seja, mas que já tenha superado ou que esteja em processo de superação. Navegando pelas adversidades da produção, a dona do hit Hips Don’t Lie concentra a obra em um pop latino acentuado com letras bem escritas.
Quem conhece Shakira sabe que ela é a própria idealizadora de todos os seus projetos musicais profissionais. Ao combinar pop, reggaeton e hip-hop, a cantora transforma, sem esforço, a dor em arte. A artista, que um dia já dedicou Me Enamoré para Piqué, não parece a mesma que dedica BZRP Music Sessions #53 ao seu ex. Em Las Mujeres Ya No Lloran, a colombiana constrói uma narrativa formidável de força e espírito.
Depois de ter seu coração arrancado no clipe de Monotonía, uma das canções que deu início de fato à era do novo álbum, Shakira começou a passar por um período conturbado em sua vida. Em entrevista para o jornal The Times, do Reino Unido, a cantora diz que os pedaços de sua vida foram desmoronando diante de seus olhos e que precisava reunir os cacos do chão e juntá-los de alguma forma. Ela conclui que a música foi o adesivo para se unir novamente e curar toda a dor.
Algo que não passa batido é o fato da obra ser uma verdadeira lavagem de roupa suja com seu ex-marido. Shakira consegue fazer da dor o seu alicerce mais forte para enfrentar seu conturbado término. Apesar de considerarmos que águas passadas não movem os moinhos do pop, ela foi capaz de construir perfeitamente uma narrativa divertida e reflexiva.
Shakira soube muito bem usar as dores de uma traição para criar um álbum pop coeso e com um semblante ousado. O disco é um testemunho íntimo e reflete a superação vivenciada pela cantora, destacando o poder da Música para transformar até mesmo as experiências mais difíceis em momentos memoráveis. Cómo Dónde y Cuándo e Nassau são músicas que se completam com seus versos tocantes; ambas nos fazem entender a angústia e a procura de um motivo ou qualquer acontecimento que fizesse sentido para a dor.
O encerramento da obra vem com Última, single que a artista gravou por último para este álbum. A faixa é cheia de dor, arrependimento e decisões definitivas que a impedem de voltar ao passado. Ela deixa o ritmo do álbum lento e é possível sentir o sofrimento e a angústia em cada palavra, mas, ao mesmo, a súplica em ser ouvida e vista.
Apesar de faltar ambição e inovação, o álbum se mescla fortemente com o mundo pop em faixas contagiantes, e é inegável afirmar que a colombiana carrega certa tristeza em suas composições. Com Las Mujeres Ya No Lloran, Shakira expõe seu lado mais frágil e sensível ao cantar canções que transmitem seus sentimentos após o término de seu casamento. Além disso, a cantora também simboliza que “as mulheres não choram, elas faturam!” onde conseguimos entender que, de fato, as mulheres não estão mais chorando. Afinal, se você não se identificou com esse manifesto pessoal da obra, está claro que você nunca sofreu por uma traição e no final saiu por cima.