Bárbara Alcântara
Mistério, assassinato, violência e uma dose de nudez desnecessariamente explícita – tudo isso coroado por cenas que transitam entre o sonho, o pesadelo e uma bad trip de LSD. Esses foram os dois primeiros episódios da terceira temporada de Twin Peaks: muito Lynch e pouca nostalgia.
A nova temporada, lançada no dia 21 de maio nos Estados Unidos, traz alguns rostos e lugares familiares, mas os horizontes se ampliam. O cenário deixou de se reservar à pacata cidade que dá nome à série, e outros personagens e novas tramas foram incorporadas às antigas.
A continuação marca o retorno de David Lynch. Após mais de uma década sem dar indícios de novos projetos em andamento, ele mostra que o tempo distante da indústria cinematográfica foi mais do que benéfico ao seu trabalho e, com uma visão renovada, promete uma temporada menos maçante do que a segunda.
A retomada da trama flui com tanta naturalidade que dá a impressão de que tudo foi esquematizado duas décadas e meia atrás. Mas a promessa feita por Laura Palmer a Dale Cooper no filme de 1992, “See you in 25 years” (Vejo você em 25 anos, em tradução literal), foi muito mais profética do que premeditada, já que nem Lynch ou Mark Frost tinham a intenção de cumpri-la. O que foi pensado, entretanto, foi entregar aos fãs o que eles esperavam do longa: respostas para alguns dos mistérios pendentes da season finale.
As soluções são dadas, pero no mucho. Lynch e Frost dão um alívio passageiro aos fãs. O cliffhanger da cena final é usado apenas para dar sequência à história. Sutilmente, somos transportados para uma nova Twin Peaks – uma com seus próprios enigmas a serem desvendados. Personagens marcantes reaparecem, como Dale Cooper (Kyle MacLachlan), a velha do tronco (Catherine Coulson) e o próprio tronco (que provavelmente foi substituído nesta temporada). Mas a cidade é observada sob um outro ângulo: os takes externos são priorizados, contrariando as temporadas anteriores, que retratavam apenas os ambientes privados.
Os roteiristas colocam personagens novos em cenários antigos, e elementos antigos em cenários novos. Não apenas por maturidade, mas porque sabem que o saudosismo puro não seria suficiente para manter o interesse do público. É como se tivesse dado um tiro no próprio pé: nos anos 90, ele revolucionou a forma como as séries eram produzidas até então. E em 25 anos, muita coisa se desenvolveu. Agora é preciso competir com as séries que beberam de sua própria fonte (e que provavelmente nem mesmo existiriam não fosse por Twin Peaks).
No entanto, Lynch, novamente diretor da série, não mostra relutância em utilizar as ferramentas e tecnologias da indústria cultural e mescla o saudosismo à inovação. Ao mesmo tempo em que expande o cenário para outras cidades e cria uma narrativa linear, acrescenta elementos bizarros e, a princípio, desconexos, que não só causam estranhamento mas também instigam e atiçam a curiosidade do público.
A terceira temporada repete a receita que fez de Twin Peaks icônica e, até então, acerta no ponto. Faz algo raro: agrada aos saudosos, ao revisitar cenários e rostos e dar continuidade a tramas antigas, e cria a possibilidade de atrair novos fãs, já que os novos mistérios parecem ser independentes das duas outras temporadas.
Agora resta aguardar os outros 16 episódios saírem para saber se a receita será seguida à risca ou se em algum ponto vão errar a mão. De qualquer forma, a única certeza é a de que, daqui para frente, as segundas-feiras serão acompanhadas por muito café.