Os dois morrem no final é uma jornada pela linha tênue entre a celebração da vida e aceitação da morte

Ilustração da capa do livro Os dois morrem no final. A imagem apresenta dois jovens de costas caminhando lado a lado com mochilas nas costas, sombreados em tons de azul escuro ao lado de uma grade. O chão em que os jovens pisam é branco e possui a sombra dos rapazes. Atrás da grade há prédios pintados em tons de azul escuro iguais aos dos jovens e acima dos prédios há um céu pintado por um azul mais claro. No canto superior direito há uma lua cheia na cor branca. Ao centro da ilustração consta o nome do livro em letras maiúsculas na cor branca, na parte superior do livro o nome do autor com a mesma fonte e cor. Por fim, no canto inferior direito há o logo da editora do livro intrínseca na cor de fundo preta com o nome escrito em branco.
O livro Os dois morrem no final está sendo adaptado para uma série audiovisual (Foto: Editora Intrínseca)

Luana Brusiano

Imagine receber um recado da Central da Morte informando que, a qualquer momento nas próximas 24 horas, você irá morrer e não há nada que possa ser feito para reverter essa situação. Essa é exatamente a premissa de Os dois morrem no final. Escrita por Adam Silvera, a obra narra o último dia de vida de Mateo Torrez e Rufus Emeterio que, em 5 de Setembro, recebem a infeliz ligação: aquele será o último dia de vida deles. Na tentativa de aproveitar ao máximo seus últimos momentos vivos, os caminhos de Mateo e Rufus se cruzam, levando-os a embarcar em uma jornada para viver uma vida inteira em um único dia.

Os dois jovens decidem criar perfis no aplicativo Último Amigo, com a finalidade de encontrarem um amigo para compartilhar os últimos momentos e, assim, se conhecem. Os dois morrem no final é uma obra que prende a atenção já pelo título. A ideia do autor ao nomear o livro com o final da história é genial e gera um impacto significativo no leitor, instigando a curiosidade e despertando certa ansiedade ao acompanhar o desenvolvimento da trama, tendo conhecimento do que vai acontecer com os protagonistas no futuro, mas sem saber como. 

No decorrer do livro, Mateo Torrez e Rufus Emeterio passam por inúmeras experiências, enfrentando medos, inseguranças e desejos que nunca tiveram a oportunidade de realizar. Mateo, que é um garoto tímido e reservado, viveu toda a sua vida temendo as consequências de suas atitudes e, por esse mesmo motivo, se manteve recluso. Já Rufus, é caracterizado por sua personalidade impulsiva e sede por vivenciar experiências novas, mesmo após o trauma de ter perdido sua família em um acidente. Durante suas últimas vivências, os protagonistas criam um forte vínculo e passam a se apoiar e enfrentar tudo juntos.

Foto de Adam Silvera, homem branco de cabelos, barba e olhos castanhos, vestindo uma regata preta e usando um fone de ouvido branco com fio segurando ao lado de seu rosto o livro de sua autoria 0s dois morrem no final.
Adam Silvera afirma que a escrita foi uma forma de lidar com o próprio trauma e reimaginar como a vida poderia ter sido enquanto era adolescente (Foto: @adamsilvera via Instagram)

Apesar de ser uma ficção, os pontos-chave para o entendimento do livro são as questões existenciais. A analogia com a vida real remete à única certeza que existe: a morte. Desse modo, é óbvio que a intenção do autor é abordar o que significa estar vivo, enfatizando a efemeridade da vida e mostrando como cada segundo de existência importa. Contendo trechos e falas que levam a reflexões profundas, a história trata a morte com uma sensibilidade que pode, até mesmo, ser considerada poética. 

A complexidade das personalidades de Mateo Torrez e Rufus Emeterio, e suas camadas mais profundas também são tratadas na obra, uma vez que são completamente opostas e, ainda assim, conseguem fortalecer sua conexão diante do desespero causado pela inevitabilidade da morte e pelo fato de que as decisões que tomarem podem afetar o tempo que lhes resta. Com uma amizade que resulta em momentos emocionantes entre os jovens, é gradativamente desenvolvido um sentimento romântico entre os dois, que surge de maneira sútil e muito natural. 

O medo da morte é o cerne para o desenvolvimento do livro. A incerteza do desconhecido e, até mesmo, a faísca de esperança de que a ligação efetuada pela Central da Morte poderia ser um engano, aflige os protagonistas e se manifesta ao longo de toda a narrativa. A busca pela aceitação da morte e a coragem de confrontar a imortalidade unem esses personagens em sua luta contra o tempo. Adam Silvera explora o medo e as profundezas do psicológico humano, oferecendo uma perspectiva sensível e emocionante acerca da vulnerabilidade humana.

“Passei anos vivendo com segurança para garantir uma vida mais longa e veja onde isso me levou. Estou na linha de chegada, mas nunca participei da corrida.”

– Os dois morrem no final (2017)

Os dois morrem no final é uma poderosa viagem através da exploração dos limites de Mateo e Rufus. Com uma narrativa melancólica e impactante que ressoa para além das páginas, o livro desperta a atenção dos leitores para a importância de cultuar a vida e colecionar momentos, bem como o laço da amizade e os desejos nunca antes atendidos. Adam Silvera não apenas traz uma reflexão sobre a efemeridade da existência, mas também aborda com grande sensibilidade  a descoberta da sexualidade dos personagens da comunidade queer, através de uma jornada de autoconhecimento e aceitação. 

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