O longa olha com nostalgia para o passado, ao mesmo tempo em que encontra um novo rumo para o personagem
Pedro Fonseca E. Silva
Há 17 anos, o Homem Aranha estreava nos cinemas pela primeira vez. Dirigido por Sam Raimi, o longa-metragem cativou o público e fez um estrondoso sucesso na bilheteria mundial. Essa também era a primeira história que o grupo Sony trazia aos cinemas após adquirir os direitos sobre o personagem. Não demorou muito para que a obra ganhasse uma sequência e, em 2004, os fãs puderam explorar mais ainda a mitologia do personagem. Mais uma vez o estúdio havia acertado a mão e muitos tomaram o filme como uma das maiores interpretações do personagem até hoje.
No entanto, quando a história do herói retornou mais uma vez ao cinema o resultado não foi o mesmo. A presença de muitos personagens e as decisões da produção resultaram em um filme esquecível e criticado pelo público. Fatores esses que deram fim à franquia. Assim, muitos acharam que o personagem iria ganhar uma folga antes de poder voltar a ação. Porém, a popularidade do herói e a ambição do estúdio fizeram com que Peter Parker não ficasse longe por muito tempo.
Em 2012, o cabeça de teia ganhou um reboot com O Espetacular Homem- Aranha. Só que nem mesmo o novo elenco e a nova história conquistaram o público. Assim, o novo arco do herói durou apenas até sua sequência em 2014. Após a pressão dos fãs e os resultados aquém do esperado, o grupo Sony firmou uma parceria com a Marvel Studios e o personagem finalmente voltou para casa.
Como consequência dessa parceria, mais um ator assumiu o papel do Aranha. Tom Holland passou a interpretar o personagem e conquistou inúmeros fãs. A Sony estava com a expectativa tão grande que até decidiu investir em um spin-off com o filme de um dos vilões do herói, Venom (2018). Os resultados foram positivos e parecia que o grupo finalmente estava acertando a mão em relação ao personagem.
A confirmação veio ainda em 2018, com o lançamento de Homem Aranha no Aranhaverso, filme que surpreendeu os fãs e trouxe novos ares ao personagem dentro das telonas.
Para entender como a nova história conseguiu superar tanto as expectativas, talvez seja preciso fazer uma pergunta: após anos explorando o personagem, qual foi a decisão que a Sony tomou e que permitiu ampliar os horizontes do herói?
Simples, ela passou a tocha para frente e permitiu que o icônico Peter Parker passasse seu manto para outro herói. Seu nome? Miles Morales. Um jovem negro, de ascendência porto riquenha e que mora no Brooklyn.
O começo da história é muito parecido com o que o público já conhece. O adolescente Miles Morales é picado por uma aranha radioativa e adquire super poderes. A diferença é que ele não está sozinho, pois em seu mundo já existe um Homem Aranha. Agora, enquanto tenta aprender a lidar com suas novas habilidades, ele deve impedir que uma ameaça acabe com todo o multiverso. Para isso, ele conta com a ajuda de diferentes versões do herói aranha.
Essa não é a primeira aparição de Miles Morales. O personagem surgiu em 2011 nos quadrinhos da Marvel e, logo, tornou-se popular dentro dentre os fãs do Aranha. Sua origem étnica também ajudou a iniciar um debate sobre representatividade nos quadrinhos.
A adaptação a história de Miles para o cinema foi uma ideia boa para evitar que a figura do Homem Aranha caísse na mesmice, após anos aparecendo na telona. Essa decisão também abriu espaço para que o público continue a acompanhar o clássico Homem Aranha, que continua a ser desenvolvido nos cinemas como um personagem live-action, ao mesmo tempo em que vê novas abordagens sobre a mitologia do Aranha.
É divertido ver uma nova versão do herói, sob um novo ponto de vista. Miles deve aprender lidar com seus novos poderes e responsabilidades em uma vida que já está se transformando, como a de qualquer adolescente. Tudo isso com uma diferença significativa, ele não está sozinho.
Parte da proposta é mostrar que não existe apenas um Homem Aranha e que qualquer um pode vestir sua máscara. Apesar de focar em um personagem principal, o longa explora cada uma das diferentes versões do herói que aparecem em tela. Todas elas contam um pouco de suas origens e mostram como é difícil carregar o manto do Aranha. No entanto, entre as diferentes versões do teioso duas tem maior destaque.
Uma delas, um Peter Parker mais velho e desmotivado que desenvolve uma relação de mentor com Miles. Enquanto isso ele também tenta reorganizar os rumos da própria vida, após passar anos sendo o Homem Aranha de sua dimensão. A dinâmica entre os dois é muito bem trabalhada à medida que o velho Peter ajuda Miles a entender os sacrifícios e as responsabilidades que vem com seus poderes.
Gwen Stacy, uma personagem famosa dos quadrinhos, também tem sua versão heróica retratada na trama. Ela é a “Mulher Aranha”. Assim como o protagonista, ela ajuda a redefinir a figura do Aranha e traz uma caracterização mais moderna ao personagem. Apesar de não ser a mais experiente da equipe, ela é uma das mais sensatas e ajuda a colocar o grupo em ordem. Em sua jornada ela apoia Miles e luta para salvar todos os mundos.
Outra parte importante da história se passa no núcleo da família Morales. A interação dela com Miles ajuda o protagonista se desenvolver como personagem. Seu papel também é importante ao conduzir a trama entre momentos comédia e de drama.
Essa comédia, por sua vez, merece destaque. Grande parte do material humorístico do filme consiste em aceitar e relembrar toda a parte cômica da mitologia do herói . O filme faz referências a vários momentos marcantes do personagem dentro das telonas. Um prato cheio para os fãs.
Animação e trilha sonora
Mais uma decisão fundamental para que o sucesso do fime está na disposição a arriscar dentro desse universo. Decisão essa que não poderia ter dado mais certo. A equipe criativa trabalhou com um conceito que une a animação desenhada à mão e animação feita em computador. Técnica que ainda é pouco utilizada dentro da indústria mas que casou com o visual de quadrinhos que a produção propõem.
O filme abraçou os elementos clássicos das HQs, como os balões e onomatopeias, e tornou-se um resultado muito agradável e revigorante para as histórias de heróis.
Outro ponto em que podemos ver a influência da animação está na criação dos personagens e de suas caracterizações. Miles, por exemplo, é estabelecido como um jovem que adora a arte do grafite. A mistura dessa técnica de desenho casa muito bem com a escolha artística do filme.
Peni Parker, uma das versões alternativas do teioso, também ganha um diferencial ao assumir traços que são baseados nas animações japonesas; enquanto o Porco-Aranha tem um desenho mais cartunesco. As movimentações também ganham mais fluidez e denotam pequenas diferenças entre as características dos personagens.
Seja nas cenas de luta ou apenas fazendo acrobacias entre os prédios de Nova York, é muito bom rever o Homem Aranha entrando em ação.
A trilha sonora também se encaixa muito bem e não destoa em nenhum momento dos diferentes tons que as cenas querem passar. A música ajuda o público a se aproximar das personalidades de tantos personagens diferentes.
Cenas imperdíveis
Homem Aranha no Aranhaverso marca uma das últimas participações da lendária figura de Stan Lee. É interessante pensar que um de seus últimos cameos seja como uma figura dos quadrinhos, no filme de um de seus personagens mais marcantes. Sua contribuição é sútil mas emocionante, e traz consigo mais algumas palavras de sabedoria. Vale a pena ficar atento para não perder esse momento.
O filme também conta com uma cena pós-créditos importante para o futuro da franquia e que fará os fãs darem muitas risadas.