Ana Júlia Trevisan
A continuação de Coisa Mais Linda já está entre nós! A série original da Netflix se passa no Rio de Janeiro da década de 1960, narrando o surgimento da Bossa Nova e mulheres em busca de seus direitos em uma sociedade extremamente machista. Após uma bem sucedida primeira temporada, o retorno vem para esclarecer os ganchos deixados e relembrar a importância da luta feminina por igualdade.
A segunda temporada começa a agradar logo na abertura. A música Garota de Ipanema de Tom Jobim finalmente aparece com sua versão em português. Por se tratar de uma produção brasileira e de um compositor brasileiro, a música na sua versão em inglês não fazia sentido em abrir o primeiro ano da série.
Os diretores não se acanham ao lidar com temas da época que permanecem sendo problemas atuais. O feminicídio é evidenciado logo no primeiro episódio, com a morte de uma das personagens mais queridas pelo público. Ao longo da trama fica clara a impunidade do assassino, que é considerado um homem de bem apesar de ter matado a própria esposa, e cumpre sua pena em liberdade, frequentando os mais importantes eventos da cidade.
A nova fase da história começa com um ritmo diferente do que foi proposto no ano anterior, levando a crer que a premissa inicial possa ter se perdido, mas isso é apenas um truque para mostrar como as protagonistas podem se adaptar as mais variadas situações. Enfrentando o machismo em suas diversas faces, as mulheres precisam se mostrar cada vez mais fortes para conquistarem o lugar que é delas por direito. Dramatizando uma das cenas mais marcantes, Malu (Maria Casadevall) precisa lidar com o assédio sofrido por um vereador influente do Rio de Janeiro.
Trazendo discussões relevantes para nosso cenário atual, a direção apenas peca em forçar relações amorosas desnecessárias fazendo com que partes do enredo fossem resolvidos de maneira corrida. Sem tempo necessário para trabalhar tudo que foi proposto, algumas tramas que gerariam grandes plots, foram atropeladas e se tornaram esquecíveis.
A luta pelo espaço feminino é muito bem representada por todas, porém, mais uma vez é Thereza quem rouba a cena. Vivida por Mel Lisboa, chamou a atenção durante a primeira temporada por ser considerada a frente de seu tempo. Depois de ser a única mulher a trabalhar em uma revista onde o público feminino era o alvo, é hora da personagem ter seu destaque no rádio. Conseguindo o emprego através de contatos e, principalmente, talento, ela passa a integrar uma equipe de radialistas homens.
A questão racial também é abordada. Adélia (Pathy Dejesus) é uma das sócias do clube Coisa Mais Linda, e quase sempre é confundida com empregada do local; moradores do mesmo prédio não gostam de a ver usando o mesmo elevador; e sua filha relata estar sofrendo bullying na escola. Apesar da história se passar no ano de 1960, ela traz debates ainda necessários para a sociedade atual.
Quem está atrás de um sonho desde vez é a irmã de Adélia. Interpretada por Larissa Nunes, Ivone é a primeira da família a trabalhar em uma mesa de escritório, mas abandona o emprego de secretária para tornar-se cantora. Aliás, a tão bem comentada trilha sonora volta a agradar o público com grandes clássico da música brasileira, como Mania de Você, uma das mais consagradas músicas de Rita Lee. A série acerta em repetir a fórmula de sucesso da primeira temporada, se mantendo fiel aos clássicos, paisagens tropicais e figurinos de época
Tramas paralelas são o que não faltam. Com histórias mais individuais, os novos episódios de Coisa Mais Linda permitem conhecermos as quatro personagens principais de maneira mais intensa, mostrando suas falhas e acima disso, potencializando a força que elas têm em lidar com problemas pessoais e profissionais, passando por cima do ditado conservador onde, apenas homens poderia ter seu próprio negócio.
A série se encerra com um gancho perfeito para mais um ano, que deverá ser focada no cotidiano das personagens que estão passando por problemas diferentes. A possível continuidade pode servir para consolidar a premissa da tão sonhada liberdade feminina pelo grupo de mulheres socialmente distintas.