Gustavo Alexandreli
“Amor às cegas dá casamento?” – a gente espera que sim. É com este questionamento e o coro entoado na sequência que a dupla de apresentadores e um dos casais mais amados das telinhas, Camila Queiroz e Klebber Toledo, instiga o público a acompanhar a trajetória dos candidatos à união eterna na terceira temporada do reality Casamento às Cegas Brasil, da Netflix.
Adaptada da atração estrangeira Love Is Blind, também da plataforma de streaming estadunidense, o experimento virou sucesso no Brasil desde a sua estreia, em Outubro de 2021. Dominando pautas nas redes sociais nos primeiros anos e dando visibilidade aos aventureiros no experimento, a atual temporada parece já estar sendo compreendida também pelos participantes.
Tendo como proposta inicial criar conexão e realizar o pedido de casamento antes mesmo de conhecer a aparência física do cônjuge, a intenção de Casamento às Cegas é encarar o completo desconhecido. No entanto, pouco tempo após a exibição no streaming, especulações que apontam o desmonte da dinâmica pipocaram nas redes, levantando suspeitas de quebra da proposta e evidenciando desconfiança do público.
Embora os questionamentos de possível trapaça tenham sido negados pelos participantes posteriormente, a artificialidade presente na terceira temporada salta aos olhos antes mesmo da liberação dos episódios finais. É fato que o confinamento, a exposição e a realidade imposta pelo experimento gera uma diferença no que temos como vida real.
Contudo, na atual temporada, a maioria dos participantes repete fórmulas, como abraçar a fina parede e passar conversas parecidas, independente do momento. A sensação de estar em um VT repetitivo, apenas com diferença nos rostos presentes, tornam a primeira fase do reality a mesma sensação de estar na cabine do experimento: em um espaço pequeno e com vontade de sair para gritar quando finalmente algo dá certo.
Apesar das constantes repetições nos ideias de conversa levadas nos boxes, é necessário destacar a avidez para exercer competição em busca de um parceiro. Em um ambiente controlado, é comum despertar o interesse simultâneo em uma mesma pessoa, mas a disputa partindo do acesso apenas às opiniões dos confinados e às táticas realizadas deixam todos de olhos bem abertos.
Com as garras à mostra, o resultado gera um mal-estar contínuo nos lounges de homens e mulheres no reality. Assim, elevando a proposta de encontrar um amor para uma batalha por um parceiro, as inúmeras brigas instauradas tornam Casamento às Cegas 3, ainda na fase inicial, pertencer a um nicho de realities show de proposta distinta.
Encontros e Lua de Mel
Apesar do cansaço na primeira fase e uma avidez que parece fugir da proposta de Casamento às Cegas, a essência romântica retorna nos encontros entre os recém-noivos. O ponto alto da etapa inicial fica com a emoção tomando conta dos participantes no beijo entre os decididos e na colocação da aliança. O sentimento segue quente com a ida à lua de mel. Após as aventuras amazônicas na segunda temporada, o litoral nordestino de Pipa, no Rio Grande do Norte, se mostra um local com menos possibilidades para perrengues.
No entanto, o que deveria ser apenas curtição parece ter sido retirado de uma esquete de humor grosseiro com uivos vindos dos homens ao se relacionarem sexualmente com suas parceiras, algo ainda mais vergonhoso que o repetitivo “better together” da temporada anterior. Tendo a possibilidade de retirar os sons, que trazem exposição desnecessária e uma escolha errônea do elenco masculino, a lua de mel segue com leveza – após ter que suportar uma fase dura de início.
Contudo, o castigo segue, tendo que ver – e ouvir – aquele vizinho incômodo no quarto ao lado. Embora os diversos encontros durante a viagem romântica em Pipa, pouca especulação sobre o futuro dos casais é exibido nos episódios. Desta forma, para o público, a descoberta maior se dá de volta à convivência – uma maneira de manter a expectativa futura e manter a visibilidade dada a tantos incômodos.
Ainda tendo que lidar com aquele vizinho incessantemente desagradável, de nome Valmir Reis, a maioria dos casais se mostram decididos ao casamento, algo alheio à primeira fase. Trabalho, rotina, filhos e o temido celular surgem como alívio às cabines. Em paralelo, assim como no reality De Férias Com o Ex, em que o tablet precede um movimento não tão agradável, em Casamento às Cegas, a notificação do celular pessoal vem como um estridente agudo aos ouvidos de alguns dos noivos.
Apesar dos contatos externos, inclusive de ex-participantes que buscaram redes fora das cabines, a tensão é bem superada e não se torna repetitiva, apenas dando uma prévia dos atritos dos casais. Dos mais bem resolvidos aos que sabem a existência de um passado antes do noivado, àqueles que demoram a se entender e até mesmo revelar o que trazem consigo pré-reality show, o suspense na convivência segue, porém, prendendo a atenção do espectador de maneira a acompanhar com leveza.
O ponto alto na segunda etapa é entender, de fato, o quão dispostos a prosseguir até o altar cada um está, assim dando um alívio ao ocorrido nos diálogos às cegas. Com o mundo aberto, a conexão física ocorrida em Pipa e maiores análises sobre mudanças como local de moradia e união entre famílias cada vez mais perto, acompanhar a trajetória dos casais rumo ao desfecho desprende do passado ávido das cabines.
Apesar dos dias difíceis enfrentados pelo público e por certos participantes no início do reality, Casamento às Cegas 3 possui um desfecho surpreendente: todos os casais decidiram pelo ‘sim’. Embora nenhuma desistência e um final constante de cinco picos de felicidade, o reencontro revela surpresas que denotam a parte incômoda de uma temporada finalizada, até então de maneira positiva, mas recheada de momentos pontualmente desagradáveis.
O Reencontro
Embora o encerramento positivo da terceira temporada tenha garantido o recorde de casamentos – cinco –, o real rumo dos casais reacendeu com o reencontro, realizado ao vivo. Com a desconfiança do público pautando discussões nas redes, muito foi reforçado sobre a veracidade do experimento na reunião de condomínio. Tentando salvar a imagem arranhada do que realmente é um experimento e do tamanho da imersão por parte dos participantes, o bate-papo desta temporada focou nesse aspecto. Assim sendo, os discursos se deram em respostas rasas dos participantes, bem como uma condução semelhante.
Diferentemente da boa condução de Queiroz e Toledo no reality, com discursos pertinentes, a entrevista com os participantes ao vivo foi menos instigante. Igualmente a interação com o público da internet, Amanda Souza, ex-participante da segunda temporada do experimento e responsável por essa troca, pouco questionou e não sintonizou com a profundidade de participação da web.
Para mudar o cenário de peso, as inserções de ‘prêmios’ por ciúme, por exemplo, reacendem os pontos de esquete, presentes no meio do experimento de Casamento às Cegas. A presença de ex-participantes do atual elenco retirou possíveis picuinhas, mas também de forma rasa. Apesar disso, o embate entre Ítalo e Valmir – que fez fortes revelações sobre a continuidade de sua relação – levou o público à euforia. Embora o desenrolar alheio à Netflix não tenha colocado nenhum dos dois em posição de comentar algo relativo ao reality positivamente.
No encerramento, ainda no retorno aos atos questionáveis da terceira temporada de Casamento às Cegas, um momento final poderia ter sido deixado de lado, mas culminou para mais uma brecha à desconfiança do experimento. No apagar das luzes do reencontro ao vivo, Ítalo Antonelli tomou uma atitude impressionante com uma ex-participante que, de momento, gerou alvoroço, mas não acabou bem.
Com tantos questionamentos do público e nenhum casamento restante tanto da primeira quanto da segunda temporada, a Netflix até tentou resolver essas questões no reencontro, o que passou quase despercebido. No entanto, o anúncio do spin-off Casamento às Cegas Brasil: Depois do Altar, que reunirá participantes das três edições, pode recuperar a confiança do público na veracidade de um reality com proposta insana e enfim esclarecer dúvidas cruciais que pouco foram abordadas na última reunião ao vivo.