Bruxas, sáficas e performances teatrais? Certeza que era Agatha Desde Sempre

Cena da série Agatha Desde Sempre. Essa imagem apresenta a atriz Kathryn Hahn, uma mulher branca, no papel de Agatha Harkness. Ela está vestida com uma roupa de tons escuros, predominantemente azul e roxo, com mangas largas e texturas dramáticas. A personagem está em uma pose expressiva e poderosa, com as mãos levantadas em um gesto mágico, sugerindo que está conjurando ou manipulando magia. A cena acontece em um ambiente sombrio e misterioso, com iluminação baixa que realça o tom enigmático da personagem.
Kathryn Hahn brilha performando Agatha Harkness, desde seu movimentos com as mãos até suas expressões faciais (Foto: Disney+)

Arthur Caires

Desde sua primeira aparição em WandaVision (2021), Agatha Harkness conquistou o público com seu charme, ironia e carisma, frutos da magistral atuação de Kathryn Hahn. O impacto foi tão grande que a personagem ganhou sua própria série, Agatha Desde Sempre. Criada pela mesma mente por trás da história de Wanda Maximoff  (Elizabeth Olsen), Jac Schaeffer, a produção busca capturar a magia da obra original ao mesmo tempo que apresenta uma narrativa própria e ousada.

Após os eventos de Westview, a série acompanha Agatha Harkness em sua jornada para recuperar seus poderes e identidade roubados pela Feiticeira Escarlate. Libertada do feitiço por um misterioso adolescente, originalmente apelidado como Teen (Joe Locke), e confrontada por uma velha ‘amiga’, Rio Vidal (Aubrey Plaza), a protagonista embarca em uma busca por respostas, mas logo se vê dividida entre o anseio por poder e a construção de novas relações.

Atraído pela promessa de milagres, o jovem desconhecido suplica à Agatha que o guie pelo Caminho das Bruxas, um reino oculto repleto de magia e mistérios. Para adentrar nesse lugar encantado, a bruxa reúne um Coven completo: Jennifer Kale (Sasheer Zamata), Alice Wu-Gulliver (Ali Ahn), Lilia Calderu (Patti LuPone) e Mrs. Hart (Debra Jo Rupp).

Assim como em WandaVision, Agatha All Along (no original) se desvia do molde padrão das produções da Marvel. Enquanto o MCU é amplamente conhecido por cenas de ação explosivas e narrativas interligadas, esta foca em uma abordagem teatral, mesclando comicidade e thriller. Característico das séries do estúdio, o formato semanal, com episódios progressivamente construídos, contribuiu para a experiência de forma significativa. Cada fim de capítulo deixava um gancho, aumentando a expectativa e engajando o público até a próxima semana, diferentemente da tentativa falha de Falcão e o Soldado Invernal.

Cena da série Agatha Desde Sempre. A imagem mostra cinco personagens em uma floresta escura e misteriosa, com árvores ao fundo e uma atmosfera carregada de tensão. À esquerda, Jennifer Kale, uma mulher preta, aparece com uma expressão séria, vestindo um vestido rosa claro com detalhes delicados, um cinto decorativo e um colar de pingente. Ao lado dela está Lilia Calderu, uma mulher branca e mais velha de cabelos grisalhos presos em um penteado desalinhado, vestindo roupas coloridas, como uma blusa branca e um casaco amarelo com padrões. No centro, Alice Wu-Gulliver, uma mulher amarela, chama a atenção com seu cabelo curto e mechas vermelhas, usando uma jaqueta de couro preta decorada com rebites e detalhes em cores vibrantes e quentes. À direita, Billy Maximoff, um homem branco, com expressão intrigada, veste um suéter cinza rasgado e uma jaqueta com capuz, enquanto uma corrente pende de sua calça. Por fim, Mrs. Hart, uma senhora branca com cabelos loiros grisalhos, está vestida com um chapéu bege, uma camisa florida e calças de tom neutro, com as mãos juntas à frente do corpo. A cena captura um momento de expectativa, como se os personagens estivessem prestes a enfrentar algo importante.
O Coven de Agatha Harkness não poderia ter sido melhor selecionado (Foto: Disney+)

A cada nova bruxa apresentada, a trama se torna mais complexa e intrigante. Enquanto Hahn nos encanta com seus maneirismos caricatos, é a sinergia entre as integrantes do Coven que nos mantém presos à série. Desvendando os segredos de cada uma, nos aproximamos cada vez mais da revelação de um mistério maior que une todas elas.

O ápice dessa conexão se dá no magnífico sétimo episódio, Se a Morte Me Encontrar, em que Lilia Calderu – vestindo uma fantasia de Glinda – rouba todos os holofotes e entrega a melhor performance da temporada. A forma com que o capítulo é conduzido, utilizando a condição de Lilia, que vive entre o passado e o futuro, é extremamente original e artística. A cena, ao mesmo tempo, amarra a maioria dos pontos soltos apresentados e dá o ritmo que vai se seguir no final.

Embora a série leve o nome da protagonista, a trama também reserva um grande destaque para outro personagem introduzido em WandaVision: Billy Maximoff (o Wiccano, nos quadrinhos). A revelação de que o misterioso Teen é, na verdade, o filho de Wanda Maximoff foi digna de um momento de novela das nove à la Avenida Brasil. Usando uma coroa que faz referência à Feiticeira Escarlate, Joe Locke brilha em sua interpretação ao som de you should see me in a crown – enquanto força uma cômica tentativa de ter um sotaque norte-americano.

Cena da série Agatha Desde Sempre. Na imagem, vemos Billy Maximoff, um homem branco, em um close-up com expressão séria e olhar fixo em algo à distância. Ele está em um ambiente de floresta, com luzes suaves e tons esverdeados ao fundo, que dão um ar místico e misterioso. Billy usa um adorno metálico azul brilhante em forma de tiara sobre a testa, que contrasta com sua pele clara e cabelo castanho encaracolado. Sua maquiagem sutil destaca os olhos, e ele também usa um pequeno brinco preto.
“Você realmente é um Maximoff, caso contrário, nada disso seria tão dramático!” (Foto: Disney+)

Os figurinos exagerados e caricatos, junto à direção de Arte meticulosa, criaram uma identidade visual autêntica para Agatha Desde Sempre. Cada detalhe, desde as folhas de árvores falsas até o horizonte artificial, é intencional, contribuindo para a narrativa teatral. O Caminho das Bruxas, com sua ambientação onírica e a balada emocionante e chiclete, é um exemplo brilhante dessa abordagem. Mesmo com um orçamento menor em comparação a outras produções da Marvel, os cenários construídos elevaram a experiência, provando que criatividade supera efeitos visuais excessivos.

Um dos aspectos mais celebrados da série é sua coragem em fugir de convenções. A produção se destacou como a primeira da Marvel a exibir uma cena de nudez feminina – ideia de Kathryn Hahn – e a apresentar um beijo entre personagens sáficas. Com uma leve inclinação ao público LGBTQIAPN+, a produção soube equilibrar representatividade e narrativa de maneira impactante, marcando uma luz no meio das outras criações do estúdio.

Cena da série Agatha Desde Sempre. A imagem mostra duas mulheres brancas se encarando em uma floresta iluminada por uma luz amarelada. À esquerda está Agatha, com cabelos longos e escuros, vestindo uma camisa branca simples e de aparência rústica. À direita está Rio, também com cabelos longos e escuros, usando uma roupa tribal que revela parte dos ombros e um adorno de folhas na cabeça. Ambas têm expressões sérias, transmitindo tensão ou confronto. O fundo desfocado mostra árvores e uma atmosfera mística.
Não seria um romance lésbico se as duas personagens não se odiassem tanto (Foto: Disney+)

Se há uma crítica a se fazer à Agatha Desde Sempre é o seu final. Para uma produção com tantas surpresas e revelações, sua conclusão foi um tanto quanto anticlimática. Assim como o sexto episódio, Um Ser Familiar, o capítulo final interrompe a progressão narrativa para fazer uma contextualização do passado. No meio da temporada, esse corte não produz tanto efeito, mas, na finalização da história, soa incompleto. O clímax atingido anteriormente, com a batalha entre Agatha e Rio Vidal, é perdido, fazendo com que o grand-finale tenha aquele ‘gostinho’ de cena pós-crédito.

Ainda assim, Agatha Desde Sempre, seguindo os passos de WandaVision, conseguiu se destacar e impactar a cultura pop de forma significativa, indo além do universo fechado do MCU. Ao apresentar uma protagonista lésbica em um ano como 2024, que foi marcado pela celebração da bandeira – Chappel Roan, Renée Rapp e a produção da Netflix, Arcane –, a obra de Jac Schaeffer contribui para uma representatividade que ainda é muito necessária. A série serve como um recado para os futuros projetos da Marvel, mostrando que não é necessário apostar em exageros de efeitos especiais para conquistar o público, mas sim investir em narrativas de qualidade e que importam.

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