Leonardo Teixeira, Matheus Moura, Nilo Vieira e Satanás
Quem precisa de ficção? O terror está à solta! Dentre as denúncias de assédio e abuso sexual de famosos, atentados na Somália e repressão violenta contra os separatistas catalães, basta correr até o jornal mais próximo que é batata. Se espremer sai até sangue, dizem os mais velhos.
Aqui na curadoria mais supimpa da internet brasileira, tentamos aliviar um pouco a barra com música (ou então ficar paranoico com trilhas condizentes – tá todo mundo doido!). Cá estão nossas escolhas dos últimos 31 dias:
dvsn – Morning After
R&B
Composto pelos vocais de Daniel Daley e pela produção de Paul Jefferies (a.k.a. Nineteen85), o duo canadense segue crescendo na cena depois de assinar com o selo de Drake e participar do álbum do conterrâneo, estouradíssimo no mundo todo. Em seu segundo registro de estúdio, a dupla explora novos aspectos da estética sonora que adotou desde o início da carreira, fazendo questão de cativar o ouvinte do início ao fim com seu caos melancólico.
Daley é eficiente no evoque de vozes marcantes como Boyz II Men e Prince, soando quase cafona em certos momentos, numa caricatura mais que bem-vinda no retrato de romances fracassados que dificilmente resistem à manhã seguinte. (LT)
Fever Ray – Plunge
art pop, bangers
Depois do retorno que não foi retorno do duo sueco The Knife, Karin Dreijer surpreendeu a (quase) todos com um novo álbum sob o nome Fever Ray – 8 anos após a elogiada estreia homônima.
Além da sonoridade – um híbrido entre o synthpop pulsante de outrotra e trechos com tom glitch/industrial -, o forte teor anárquico das letras (menções anti indústria nucelar, pró-aborto e incitações a sexo LGBT inclusos no pacote) que, apesar do período fora dos holofotes, Karin ainda está vivíssima no mundo contemporâneo. E botando o público pra quebrar tudo – nos dois sentidos. (NV)
John Carpenter – Anthology
horror synth
Se John Carpenter está afastado do cinema, com só dois filmes desde a virada do milênio, nessa década o mestre do terror redescobriu sua carreira musical, em alta pela influência nos artistas modernos que utilizam os mesmos sintetizadores minimalistas em projetos como It Follows e Stranger Things.
Em Anthology, lançado pela Sacred Bones, Carpenter reinterpreta 13 temas de seus filmes, com a ajuda de seu filho e afilhado, reunindo clássicos como Halloween e Vampires, na melhor compilação até hoje do trabalho do diretor. (MF)
John Maus – Screen Memories
hypnagogic pop
Sete anos depois de “We Must Become the Pitiless Censors of Ourselves”, o ex-colaborador de Ariel Pink continua sua jornada no pastiche pop de inspiração gótica, unindo sua voz barítona e as letras de tom hipermoderno. Se a cena hipnagógica perdeu força desde 2010, os sintetizadores de Maus tem qualidade suficiente para se manter pelo som, mesmo com a redução do apelo hipster. (MF)
Kelela – Take Me Apart
R&B
Valeu a pena esperar! Quatro anos depois de estrear com uma mixtape pra lá de promissora, a californiana inflou a fantasia atmosférica de batidas eletrônicas entrecortadas e R&B alienígena (pela qual já se tornara referência) e concebeu todo um universo pessoal para o seu debut. Combinando experimentos inventivos com vibrações mais acessíveis ao grande público, Kelela nunca deixa de lado sua identidade e conduz o ouvinte em um testemunho sobre independência e solidão de um jeito só dela.
A personalidade forte é mesmo o melhor que Take Me Apart oferece. Repleto de produções imersivas, o registro reverencia de Janet Jackson a Björk sem sumir na multidão de trabalhos noventistas presentes no cenário atual. Produtores como Arca e Jam City conduzem a tracklist excepcionalmente, mas a personagem principal da narrativa nunca deixa de ser Kelela, sua voz e seu talento. (LT)
King Krule – The Ooz
indie rock
Grande prodígio recente da música britânica, Archie Marshall retorna com um sucessor melhor em todos os sentidos de seu debut, 6 Feet Beneath the Moon.
Em suas 19 faixas, Krule passa pelo pós-punk, r&b, trip-hop e até pelo jazz, em uma mistura poderosa, unida pelo aspecto melancólico que permeia toda sua obra. (MF)
Rakta – Oculto pelos Seres
post-punk
Após conquistar Brasil e mundo ano passado, o trio feminino de São Paulo se recusou a botar os pés no freio. Com apenas 12 minutos e meio distribuídos por 5 faixas, este EP já é destaque em um ano deveras morno para a música nacional.
A curta duração não impede que várias facetas do grupo ganhem espaço. Barulhento, cru, atmosférico e até mântrico são adjetivos que cabem aqui. Riffs pesados de baixo e linhas melancólicas de teclado herdadas do Joy Division, camadas de ruído no melhor estilo de Kim Gordon e seu Sonic Youth e vocais com a urgência do punk: se você curte qualquer um dos citados e ainda não conhece a Rakta, pare de marcar bobeira. (NV)
Satanique Samba Trio – Xenossamba
samba torto, música pra invocar o Tinhoso
Antes da turma liderada por Kiko Dinucci cravar seu nome no mapa, este grupo de Brasília já oferecia uma visão repaginada para o samba. Os pássaros mortos que estampam os registros do grupo (que não é um trio e quiçá nem satânico) dão a nota. O lance aqui é destroçar o ritmo, e a abordagem cacofônica é tão radical que há quem considere samba um rótulo muito limítrofe para o Satanique Samba Trio.
Este novo trabalho não foge a regra. Apesar de ter sido lançado em vinil duplo, são apenas 16 minutos de um carnaval do Cramunhão pra doido nenhum botar defeito. A nova geração do samba já tem seus malditos. Tom Zé sorri. (NV)
Satanique Samba Trio é a parada mais bizarra que existe na música brasileira. Orgulho nacional para weirdos e ateus satanistas