Queen Of The Clouds, o álbum de estreia da cantora sueca Tove Lo, lançado em setembro de 2014, é completamente uma experiência, seja por conta das letras que retratam um amor do surgimento ao fim, ou pelas produções que entregam uma obra muito bem lapidada e que é recomendável para qualquer fã do gênero pop.
Caio Savedra
O conceito do título – “rainha das nuvens”, em tradução livre -, reforça um dos motivos da autenticidade – uma das características que mais marcam seus trabalhos – da cantora: depois do lançamento de seu primeiro EP em março do mesmo ano, Tove viu sua carreira decolar e oportunidades aparecerem, ela se sentia no topo do mundo, mas sem deixar de sempre tentar dar um passo para trás e analisar o quadro geral, tomando ciência de que este é o seu mundo agora.
O álbum demonstra, já nesse seu conceito inicial, toda a humanidade que carrega. Demonstrando isso na prática, Tove divide sua obra em três partes: a paixão, o amor e o término, através das interludes “The Sex”, “The Love” e “The Pain”, respectivamente.
“A paixão do começo sempre será a melhor parte disso” (The Sex)
O primeiro ciclo do álbum se inicia com a música My Gun, onde está presente uma analogia de sua dominação e empoderamento sexuais nesse começo de paixão serem a sua arma, sua vantagem, sem nunca deixar de lado a necessidade que ela sente de gentileza. Na segunda faixa, Like Em Young, a cantora declara sua preferência por se envolver com pessoas mais novas do que um padrão imposto, justificando que tem esse gosto por aqueles que sejam jovens como ela, por terem uma mente fácil.
Na sequência, Tove nos entrega aquele que viria a ser uma das músicas de trabalho do álbum e a mais interessante até então, Talking Body. A faixa representa muito bem a primeira fase do disco, onde Tove Lo desabafa como, para ela, o sexo se relaciona com a paixão, a primeira etapa do relacionamento, e como o amor pode se desenvolver a partir de então.
O desabafo sobre a paixão de Tove se conclui com Timebomb, que tem o título bastante auto explicativo: esse relacionamento era uma bomba-relógio. Já nessa altura, a cantora apresenta dualidades do amor: essa pode ser a pessoa mais irritante do mundo ou a melhor coisa que já a aconteceu, por exemplo.
“E então você surta porque de repente você precisa dessa pessoa…” (The Love)
O segundo ciclo, o amor, apresenta uma passagem pelos altos e baixos de amar alguém, como reconhecer que tudo têm seus momentos bons e ruins (em Moments, que nos passa quase que por osmose sua sinceridade). Logo em sequência, a cantora apela para que a pessoa se apaixone por ela do modo que é, sem precisar aparentar ser alguém que ela não é, em The Way That I Am.
É quase impossível não se identificar com o início desse ciclo, qualquer pessoa tem inseguranças e essas músicas conseguem dar a sensação de que ao ouvirmos esse desabafo vem junto a ele um abraço de segurança. Tove se expõe e cria uma sensação de intimidade ao contar tudo isso.
Na transição para os pontos altos, até a sonoridade das músicas e ritmo da cantora mudam, passam a ser menos melancólicos. Got Love aponta como o amor dessa relação é maior que qualquer elemento da natureza e aparenta ser infinito e Not on Drugs celebra o sentimento de estar vivo, ver o mundo de forma mais bela e apaixonada, em euforia, sem precisar das drogas, que são frequentemente relatadas no terceiro ciclo do álbum.
Nesse momento, todo mundo que já passou por um relacionamento que não deu certo e esteve no lugar de sentir a êxtase consegue logo pressupor o que vai acontecer: a desilusão.
“E então não tem um bom modo de terminar as coisas, porque se trata de terminar” (The Pain)
A dor é relatada de diversas maneiras, seja a distância emocional em Thousand Miles, a ausência e a necessidade de supri-la em Habits e o seu remix – o sucesso mundial que alavancou a sua carreira -, as lamentações que surgem nesse processo em This Time Around, uma chance de reconciliação para viver o amor juntos mas ao mesmo tempo reconhecendo tudo de ruim que aconteceu em Run on Love e, em Love Ballad, a necessidade de provar o seu amor obsessivo pela última vez.
Na última faixa, Not Made for This World (presente na versão do álbum para o Spotify), a cantora faz uma última retrospectiva dessa intensa relação de forma bastante minuciosa. Toda essa visão de relacionamento exaustivo fica bem explicada para os ouvintes que se atentam à mensagem passada, que prestem atenção para além da sonoridade do álbum que muitas vezes pode parecer feliz.
O último ciclo do álbum se torna muito interessante por retratar nas letras a dor, mas suas melodias e produções serem músicas contagiantes e mais agitadas.
Tove Lo reflete neste álbum muito dos dramas jovens pelo qual todos passamos: a melhor parte do relacionamento sempre será o começo, por ser quando nos conhecemos, mesmo que superficialmente; constantemente faz críticas ao fato de sempre julgarmos as pessoas e suas relações a partir do que consideramos ser um padrão de forma bastante narcísica; traz o dilema do álcool e outras drogas poderem se relacionar com processo de amor e desilusão.
De uma maneira um pouco não convencional, a cantora relata através de uma experiência o conceito sobre relações líquidas de Bauman que tem cada vez mais se popularizado entre os jovens.
O álbum se tornou parte do processo de amadurecimento de milhões de pessoas ao redor do mundo, e por isso o significado que hoje atribuímos a ele é bastante particular. Embora há quem fale que a sonoridade é datada, acredito que é uma experiência que já vale a pena pelas chances de se identificar com a obra, assim como as produções da cantora que vieram em seguida.
É uma obra que arriscou em trazer desabafos extremamente pessoais – ao mesmo tempo que são bastante comuns -, a partir de músicas que tranquilamente poderiam ser tocadas em festas sem quebrar o ritmo e, ao mesmo tempo, possui um teor tão melancólico através das letras; Tove cumpre esse desafio de maneira magistral.
Tivemos o contato com esse material em 2014 e desde então a cantora vem apresentando uma sensação à seus fãs de que os clichês são muito mais intensos do que parecem, e que vivenciá-los é essencial para realizar autoconhecimento e crescimento. Clichês são o que marcam nossa geração, e não há nada que nos torne desinteressantes nisso.