Art Spiegelman relata em quadrinhos a vida de seu pai, sobrevivente do holocausto
Os prisioneiros em versão antropormófica, com os uniformes típicos dos campos nazistas (Ilustração: Art Spiegelman)
Danielle Cassita
A Segunda Guerra Mundial e seus horrores são de conhecimento geral, principalmente aqueles que envolvem o holocausto, um dos eventos mais trágicos que foram escritos em nossa história. O tema foi abordado de várias formas: no cinema, “A Lista de Schindler” e “Tribunal de Nuremberg” são referências. Já na literatura, podemos considerar títulos como “O Diário de Anne Frank”, “O Menino do Pijama Listrado”, “A Menina que Roubava Livros” e um menos conhecido, a graphic novel “Maus”, de Art Spiegelman.
O título é ambíguo: maus, em alemão, significa rato, e são estes os animais que representam os judeus de forma assustadoramente real e humana. Os alemães são representados por gatos, os americanos por cães e os poloneses, por fim, por porcos.
Não foi Art Spiegelman quem viveu os horrores do holocausto, mas sim seu pai, Vladek Spiegelman. Em sua narrativa, Vladek não poupa detalhes sobre cenas de extrema violência e as péssimas condições de vida que possuía, com os traços de seu filho permitindo que o leitor visualize os fatos contados por uma testemunha ocular de todo o horror.
Esses contatos com Vladek são interessantes. Art teve o cuidado de incluir em sua história momentos íntimos, como as entrevistas na casa do seu pai ou pequenas discussões familiares. Uma cena importante ocorre próximo ao final, quando Art não quer sobras de cereal e seu pai vai ao mercado trocar o produto. O desperdício, por menor que fosse, era algo inimaginável na situação extremamente precária dos campos de concentração. Isso mostra de forma simples e com um toque de tristeza as consequências pessoais deixadas naqueles que conseguiram escapar deste ambiente.
A narração é ágil, com a maior parte dos momentos sendo contados por Vladek. Aqui e ali há algumas mudanças nos animais que representam os personagens – até mesmo com humor, já que podemos ver o pai de Art usando uma máscara de porco quando ele se finge de polonês.
Algo que deve ser considerado é a quantidade de nomes que aparecem na história; afinal, como Vladek está falando de sua família, é natural que se refira a diversas pessoas. Porém, não há necessidade de preocupação, já que os personagens principais aparecem com frequência e todos possuem características marcantes, que não deixarão o leitor sem saber exatamente de quem se trata.
(Ilustração: Art Spiegelman)
Também é importante ressaltar como os quadrinhos puderam expressar e demonstrar tão bem tais horrores. Em uma das cenas mais pesadas que aparecem na história, podemos ver um porco segurando um ratinho pelas pernas e o chocando contra a parede – e não é possível duvidar que isso tenha acontecido, infelizmente. Ainda, as cenas que demonstram o quanto Anja, mãe de Spiegelman, sofreu nos campos de concentração são extremamente expressivas, fazendo com que o leitor praticamente compartilhe dos sentimentos dela nestes momentos.
Em relação às características estilísticas, deve-se considerar que Spiegelman começou a desenhar com fins profissionais já aos 16 anos. Seus desenhos possuem traços fortes e expressões simples, porém que demonstram sentimentos claramente. A leitura possui temática pesada, e o formato escolhido faz com que renda e flua rapidamente. Recomendadíssimo.