Com oito histórias que abordam a vivência de pessoas queers, o Estante do Persona deste mês está mais orgulhoso do que nunca! As histórias que serão recomendadas abordam as diferentes camadas do árduo caminho traçado por aqueles que pertencem à comunidade. Para isso, a Redação do Persona separou uma lista especial, com obras que marcaram a vida dos membros após a primeira leitura.
Narrativas ficcionais se tornam confidentes de todo e qualquer leitor, ainda mais se há a possibilidade de se reconhecer nos escritos de um autor. Para as pessoas LGBTQIAPN+, essa identificação possui um objetivo ainda maior: ela auxilia no processo de auto descoberta da sexualidade e mostra como personagens queers podem ser plurais. Entre dramas e romances, as indicações deste mês reforçam a diversidade necessária dentro das páginas de um livro.
Em Junho, o foco é o aprofundamento dos integrantes da comunidade LGBTIQAPN+. As tramas sugeridas não apenas falam sobre representatividade, mas também mostram que que a vida queer não se resume a preconceito e algozes. Antes de toda a dor passada por essas pessoas, há o desejo de viver uma jornada linda. É direito de qualquer pessoa, independente de sua orientação sexual, de se reconhecer em narrativas lúdicas, pois é na Arte que muitos encontram refúgio.
Adam Silvera – Lembra Aquela Vez (368 páginas, Editora Rocco)
Conhecido pelo aclamado Os Dois Morrem No Final, Adam Silvera também é autor de Lembra Aquela Vez, livro com uma sinopse inusitada. Nesse universo criado pelo escritor, as pessoas podem apagar as outras de suas memórias a partir de um procedimento médico no Instituto Leteo. No entanto, diferente de obras como Brilho de Uma Mente Eterna Sem Lembranças, ações e momentos também podem ser excluídos do subconsciente de alguém.
Com a premissa, Silvera centraliza a história em Aaron Soto, um garoto de 16 anos que mora no Bronx, em Nova York. O adolescente conhece um vizinho chamado Thomas e, a partir do desenvolvimento de sua relação com ele, o protagonista passa a ter sentimentos pelo menino. No entanto, ser gay no lugar em que eles moram é um problema, por isso Soto pensa em se submeter ao procedimento. Com isso, o escritor conversa sobre vida LGBTQIAPN+, diferenças sociais e homofobia internalizada em uma história marcada por primeiras paixões e tragédias da vida. – Guilherme Machado Leal
Amal El-Mohtar e Max Gladstone – É assim que se perde a guerra do tempo (192 páginas, Editora Suma)
É assim que se perde a guerra do tempo acompanha a história de Blue e Red, duas agentes rivais em uma guerra infinita. No período em que elas vivem, as facções nas quais atuam lutam para interferir nos variados fios do espaço-tempo, a fim de favorecer seus lados no futuro. Após terem seus caminhos esbarrados diversas vezes, nos quais elas sempre observavam e tentavam desfazer o trabalho da outra, uma correspondência se dá entre as personagens. Totalmente baseada em provocações, em um primeiro momento, os assuntos abordados e o tom dessas cartas passaram a se modificar gradativamente conforme elas se familiarizavam uma com a outra.
Vencedor dos prêmios Hugo e Nebula, dois dos mais importantes da Literatura, a obra é uma combinação perfeita de ficção científica, poesia e romance epistolar. Mais do que se preocupar com a construção do universo no qual Blue e Red estão inseridas, Amal Et-Mohtar e Max Gladstone direcionam o foco para os sentimentos dessas mulheres e como ele é capaz de motivar novas maneiras de enxergar o mundo. Sensível e sem igual, É assim que se perde a guerra do tempo é um romance sáfico sobre o nascimento do amor onde só poderia existir o ódio. – Raquel Freire
Olívia Pilar – Um traço até você (288 páginas, Editora intrínseca)
Ser uma pessoa negra e LGBT no Brasil é uma existência desafiadora, até mesmo para quem consegue a oportunidade de ser bem sucedido, é o caso de Lina, protagonista de Um traço até você. Uma estudante universitária, ela tem uma vida relativamente tranquila morando em um bairro de classe média de Belo Horizonte e sonha alto para seu futuro. Mas o preconceito contra a cor de sua pele surge como uma barreira para seus objetivos.
Lina encontra apoio e inspiração em Elza, outra apaixonada pelas artes. Juntas elas vão descobrir ainda mais afinidades em uma jornada de amor e autoconhecimento. Toda a emoção das personagens se mistura a reflexões sobre o racismo, a LGBTfobia e outras dificuldades tão comuns a jovens adultos. O Livro foi o romance de estreia de Olívia Pilar, escritora que busca transferir toda a diversidade cultural, étnica, social e de gênero do Brasil para as páginas. – Guilherme Dias Siqueira
Caio Fernando Abreu – Morangos Mofados (158 páginas, Editora Agir)
Dos representantes da cultura da década de 1980 no país, Caio Fernando Abreu é um dos nossos nomes mais importantes. Angústia existencial, solidão urbana e homoerotismo são temas que permeiam a sua obra, sempre intimista. O autor gaúcho ganhou o título de ícone cultural após o seu quarto livro de contos: Morangos Mofados, escrito em 1982 e considerado a sua obra-prima.
Os contos de Morangos Mofados são um reflexo da época em que foram escritos, em meio à repressão do Brasil ditatorial. Nesse mês do orgulho, podemos destacar a representação sensível do desejo homossexual e da luta interna, dor, solidão e complexidade dos personagens dos contos, elevada pelo estilo confessional dos textos do autor assumidamente gay. – Giovanna Freisinger
Haruki Murakami – Minha querida Sputnik (232 páginas, Editora Alfaguara)
Os relacionamentos sempre são tratados de forma bem comedida no Japão, sendo visto muitas vezes com certo tabu. Dessa forma, Haruki Murakami, conhecido por analisar a sociedade japonesa em suas obras, encontra um prato cheio para se deliciar: um triângulo amoroso. Minha querida Sputnik conta a história de K, um jovem professor de Tóquio, que é apaixonado pela sua amiga Sumire, que, assim como os jovens do país, não liga para relacionamentos, até se apaixonar por Miu, uma executiva 17 anos mais velha e casada.
A obra tem uma cadência própria, se esgueirando pelas ruas e restaurantes da capital japonesa. Murakami usa da banalidade de uma metrópole para abordar temas como o choque geracional de uma sociedade que cada vez mais envelhece e a solidão. O autor acerta ao escrever personagens arredios entre si, forçando o leitor a aturar aquelas personas, ao mesmo tempo em que é ousado ao colocar seu narrador no papel de coadjuvante, não fetichizado o triângulo amoroso e dando o devido protagonismo para o relacionamento das duas mulheres. – Guilherme Veiga
Alexis Hall – Procura-se Um Marido (432 páginas, Sourcebooks Casablanca)
Procura-se Um Marido de Alexis Hall é uma comédia romântica que segue a vida de Luc O’Donnell, um jovem gay que se vê pressionado a contratar um namorado de mentira para melhorar sua imagem pública após uma série de decepções amorosas. Nesse contexto, a clássica narrativa fake dating ganha força quando Luc conhece Oliver Blackwood, um advogado aparentemente perfeito e, ao mesmo tempo, bem rigoroso. A partir dessa relação contratual, o livro explora temas como auto aceitação, vulnerabilidade e a complexidade das relações modernas.
Além disso, Alexis aborda questões como a pressão social e as expectativas familiares sem perder o tom leve e romântico que caracteriza o gênero, cativando o leitor conforme as páginas se passam. A química entre os protagonistas é palpável, e o desenvolvimento gradual do relacionamento deles mantém o leitor engajado até o desfecho – daqueles que deixam o coração quentinho. – Clara Sganzerla
James Baldwin – O quarto de Giovanni (232, Companhia das Letras)
Quando publicado, em 1959, James Baldwin foi questionado sobre o livro debater a respeito de relações homoafetivas e não questões raciais, principal tópico abordado em suas obras. Baldwin, com muita honestidade, respondeu que a homoafetividade e o racismo são temas tão intrincados (naquela época), que trazer os dois na mesma composição seria um grande desafio.
Em O quarto de Giovanni, acompanhamos a história de David, jovem norte-americano em Paris, que espera pela resposta de sua namorada, Hella, em relação ao noivado. Enquanto ela reflete se deve ou não casar com o David, ele conhece Giovanni, garçom italiano por quem se apaixona e vive um romance. A trama é tão envolvente quanto desesperançada. O despertar de David é marcado pelo medo de amar livremente e pelo desejo de conhecer a si mesmo. Nas poucas páginas na qual o livro se estende, a relação delicada entre os personagens é sentida do início ao fim, trazendo consigo a sensação de querer mais daquela história. – Ludmila Henrique
Ann Patchett – Tom Lake (368 páginas, Editora Intrínseca)
Com uma escrita fácil e atraente, o romance de Ann Patchett nos leva a lugares desconhecidos que soam como memórias. Quando Laura narra as vivências de seus 20 e poucos anos para as três filhas curiosas sobre o passado apaixonado em frente aos holofotes da mãe, os amores, os segredos e as complexidades da vida surgem entre as lembranças. Tanto da narradora, quanto das ouvintes. Afinal, se relembrar é viver, Tom Lake sabe bem como as recordações fazem parte de amadurecer.
Tem algo sobre livro que exala verão. Apesar da narrativa ser ambientada entre as memórias de Laura Nelson e a realidade na primavera de 2020, as histórias e o presente se fundem em cenários intensos e ensolarados. Entre os antigos mergulhos no lago e as novas vivências da família Nelson durante o lockdown em sua fazenda, o aroma da grama verde e a sensação do sol tocando nossas peles se misturam em algo muito maior. Aqui, a nostalgia de passados nem tão distantes acaricia o coração enquanto os dilemas da juventude acenam de longe. – Agata Bueno