Conhecido como o mês infinito, Agosto não está entre os favoritos da população geral. Entretanto, quando se trata do meio literário, o período entrega boas pérolas brilhantes que se escondem nas conchas da confusa maré que domina os extremos da estação. No meio dessas, o Estante do Persona de Agosto de 2024 vai atrás do tesouro e o traz aos holofotes na edição de hoje.
No dia 06, uma novidade chegou ao universo de uma das premiações literárias mais famosas e respeitadas do Brasil: o Prêmio Jabuti. De forma inédita, aconteceu a primeira edição Prêmio Jabuti Acadêmico, voltada a contemplar obras científicas, técnicas e profissionais.
A noite do evento foi sediada no Teatro Sérgio Cardoso, em São Paulo, e trouxe diversos pesquisadores de múltiplas áreas do conhecimento para fazer parte. Como destaque, foi escolhido pela CBL (Câmara Brasileira do Livro) o nome de Silvia Pimentel, professora e especialista em direito das mulheres, como Personalidade Acadêmica.
No total, foram contemplados vencedores em 29 categorias, incluindo o eixo Ciência e Cultura e os Prêmios Especiais. Além disso, 24 editoras tiveram seus títulos reconhecidos – com a Cia das Letras recebendo quatro estatuetas. Entre a lista de vencedores nomes conhecidos como o de Marilena Chauí marcaram presença.
Foi uma estreia para lá de especial e o futuro do Jabuti Acadêmico parece tão promissor quanto à caminhada que o prêmio tradicional percorre ao longo dos últimos 66 anos. Para embalar essa novidade ao bom e velho hábito da leitura, fique agora com a tradicional lista de indicações da editoria.
Dicas do Mês
João Ubaldo Ribeiro – A Casa dos Budas Ditosos (128 páginas, Editora Alfaguara)
A Casa dos Budas Ditosos foi publicado inicialmente em 1999, como parte da coleção Plenos Pecados. É o quarto volume de sete livros, por sete autores, que retratam cada um dos pecados capitais. João Ubaldo Ribeiro escreve sobre a luxúria através dos relatos de uma narradora de 68 anos, que reconta em detalhes as experiências sexuais de sua juventude e vida adulta – da Bahia, onde nasceu, ao Rio de Janeiro, onde reside. A personagem é descarada e desbocada, descreve como sempre viveu a favor de suas vontades e desejos sem nenhum traço de culpa.
O livro foi adaptado para o teatro por Domingos de Oliveira em 2004, em um monólogo encenado por Fernanda Torres. Vinte anos depois, a atriz rodou o país novamente com apresentações da peça no primeiro semestre deste ano e também levou a montagem à Portugal. A recepção das audiências provou que a história é atemporal e, por isso, merece o status que recebe: clássico. O texto pode ser reimaginado e redistribuído por anos e gerações futuras e continuar fresco, provocante e hilário. – Giovanna Freisinger
Albert Camus – O Estrangeiro (126 páginas, Editora Record)
Um clássico da Literatura, O Estrangeiro, de Albert Camus, marcou o debate filosófico de uma geração, ao questionar a vida cotidiana e a liberdade como conceitos que flertam e se intercalam com o absurdo. A genialidade do autor proporciona ao mesmo tempo uma trama envolvente que seduz o leitor ao observar banalidades da rotina que são atemporais e independentes de qualquer contexto geográfico.
A Obra acompanha os dias estranhamente comuns de Mersault, um europeu radicado na Argélia, então colônia francesa no norte da África. O advérbio ‘estranhamente’ se encaixa neste contexto porque logo na primeira página o protagonista recebe a notícia da morte de sua mãe com uma enorme indiferença. O personagem não se prende ao luto, ao amor, religião ou qualquer elemento abstrato que sirva de guia ou razão para a vida. Mersault é livre e se asfixia na própria liberdade. – Guilherme Dias Siqueira
Louisa May Alcott – Mulherzinhas (480 página, Editora Planeta)
Escrito por Louisa May Alcott, Mulherzinhas conta a história de quatro irmãs que lidam com a juventude e a ausência do pai por conta da Guerra Civil Americana. Jo, Meg, Amy e Beth precisam, juntas, lidar com a maturidade que a vida carrega. Adaptado inúmeras vezes no cinema e também em séries de televisão, a narrativa de Little Women (título original) é atemporal e dialoga com qualquer um que está deixando de ser criança e tem de se tornar maduro. Aqui, o início dos 20 anos é o pontapé para uma discussão acerca da vida adulta.
A trama se concentra entre passado e presente e, ao longo das mais de 400 páginas, vemos quatro mulheres que possuem, individualmente, narrativas de superação de seus próprios demônios. Embora seja centrada em personagens femininas, os escritos de May Alcott se tornam universais ao discutirem sobre questões de gênero, trabalho e o principal: o contraponto entre os sonhos idealizados e a realidade. – Guilherme Leal
Rebecca Yarros – Chama de Ferro (720 páginas, Editora Planeta)
O segundo livro da saga mais famosa de Rebecca Yarros instiga os fãs de fantasia literária a adentrarem um mundo já conhecido nas telinhas com Game of Thrones: os dos dragões. Ele acompanha Violet Sorrengayl no seu segundo ano no Colégio Basgiath, e apesar de ser extenso tem uma linguagem fácil e jovial.
Em Chama de Ferro nos aventuramos por novos lugares, conhecemos novos personagens, e também choramos com o fim de batalhas épicas. Os plots twists, romance e mistérios deixam tudo mais interessante, mas os dragões continuam sendo a melhor parte! -Léa Secchi
Carla Madeira – Tudo É Rio (210 páginas, Editora Record)
Se banhar nas águas dos rios de sentimentos que inundam nosso coração enquanto mergulhamos em uma história visceral e crua. É este o convite que Carla Madeira nos faz em Tudo é Rio, best-seller nacional que marca a estreia da autora na literatura ficcional. A trama aposta em laços familiares e mostra até onde o perdão consegue chegar em nome do amor.
Ao longo de 210 páginas, acompanhamos o casal apaixonado Dalva e Venâncio se destruir e reconstruir após uma perda trágica, brutal e inimaginável. Além da dupla, a prostituta Lucy rouba a cena quando se divide entre personagem e leitora. Assim como nós, ela quer entender o que aconteceu para que as então alma gêmeas se tornassem desafetos declarados um do outro. – Felipe Nunes
L.S Englantine – Em Todas as Gotas de Chuva (246 páginas, Editora Qualis)
Em Em Todas as Gotas de Chuva, você é transportado para a Vila das Íris, uma cidadezinha do interior marcada por uma rivalidade antiga entre duas famílias. Embora os conflitos passados entre os Lisboa e os Salgueiros tenham criado uma barreira entre os moradores, Atena Lisboa e Cordélia Salgueiro sempre acharam essa animosidade uma invenção para dar emoção à vida de seus parentes. Elas consideravam a rivalidade uma bobagem, mas ainda assim mantinham uma distância respeitosa.
Tudo muda quando um acaso do destino força Atena e Cordélia a compartilharem um assento em uma longa e cansativa viagem de trem. Esse trajeto, que remete à infância de ambas, promete uma viagem nostálgica e cheia de surpresas. Lado a lado, em um espaço tão pequeno, será que a rivalidade poderá persistir, ou o passado está destinado a se repetir? A leitura de “Em Todas as Gotas de Chuva” promete um mergulho envolvente nas complexidades das relações familiares e na mágica capacidade de transformar rivalidades em novas conexões. – Eloah Kawai
Vários autores – Palavras de Concreto Armado (148 páginas, Editora Mireveja)
Viabilizado por meio da PEC (Programa de Estímulo a Cultura) o livro Palavras de Concreto Armado foi lançado em 2023 pela editora Mireveja. Constituído por vozes diversas da cidade de Bauru, o som descrito em sua narrativa vem de um só espaço, mesmo que não alocado na mesma porção territorial: a periferia. Trazendo 26 autores e artistas para explorarem os encantos de sua subjetividade, a obra emociona e impacta.
Entre sonhos, vivências, desejos, traumas e saudades, os personagens passeiam pelos labirintos de existir e resistir nas comunidades à margem dos grandes centros urbanos. Com uma proposta de leitura rápida e fluída, o texto não deixa de causar baque em suas 148 páginas. Além disso, sua composição gráfica é extremamente bem construída e chegou a receber o terceiro lugar no 13º Prêmio Brasileiro de Design. Sem condições de abaixar a guarda, armado é adjetivo para a periferia. – Jamily Rigonatto