
Livia Queiroz
Após pouco mais de um ano do seu último lançamento, nadie sabe lo que va a pasar mañana (2023), Bad Bunny volta ao tradicional ritmo musical latino: o reggaeton. O som dançante teve início em Porto Rico, país de nascimento do cantor e, portanto, pilar fundamental de sua criação e desenvolvimento. Entretanto, desde o começo de sua carreira, ele teve uma relação conturbada com o estilo musical, criando seus álbuns, muitas vezes, com base no rap norte-americano e no hip-hop.
Nesse sentido, foi uma grande surpresa quando em seu novo trabalho, DeBÍ TiRAR MáS FOToS (2025), Benito Antonio Martínez voltou ás suas origens, juntando reggaeton, salsa, plena, cantores latinos em ascensão, samples, críticas sociais e histórias de sua vida traduzidas em canções. O disco inicia de forma animada, com várias referências, descrevendo a diversidade na cidade de Nova Iorque e suas infinitas possibilidades de viver por lá com a música NUEVAYoL, que constituí sonoras de Un Verano en Nueva York por El Gran Combo de Puerto Rico e a entrevista de Felix Trinidad depois de sua luta contra Oscar De La Hoya, em 1999.
A cultura porto-riquenha também é celebrada e destacada em VOY A LLeVARTE PA PR e CAFé CON RON. Porém, a última desenvolve sobre a dualidade da rotina desse povo, com a necessidade de sobriedade e energia ao início do dia, representada pelo café, popular no território latino, e a libertação para descontrair e festejar de noite, personificada pelo rum, bebida que tomou forma e se popularizou a partir da fabricação no Caribe.

Ainda em temática política e cultural, LO QUE PASÓ EN HAWAii e LA MuDANZA transparecem, respectivamente, uma crítica à apropriação e degradação dos Estados Unidos ao território de Porto Rico e o reconhecimento e agradecimento de suas raízes. O país caribenho vive, há muito tempo, um conflito de interesses entre a população e suas autoridades, graças a um ‘acordo’ histórico no século XX, o qual sustentava a independência da região às custas de uma intervenção econômica e política dos EUA, que funciona até os dias atuais. A maioria da nação porto-riquenha deseja o rompimento da aliança, pois suas raízes latinas estão sendo esquecidas, sua natureza degradada e a independência foi apenas uma máscara para a submissão aos norte-americanos.
Para aliviar a tensão que o disco carrega com as críticas e contextos históricos, Benito Antonio Martínez decide por cantar sobre decepções e alegrias em seus romances vividos, muitas delas, em contexto de saudade. Alguns desses hits ganharam videoclipes, como BAILE INoLVIDABLE e PIToRRO DE COCO. Nas canções, é possível interpretar o luto por um amor perdido que é inesquecível, ou seja, a saudade de uma pessoa que foi tão importante em sua vida que, mesmo não presente, segue na memória. Assim como essa dança de nostalgia, KLOuFRENS trata também sobre a solidão em meio às festas, mas com uma diferença, não é somente sobre relembrar o passado como também se perguntar o que aquele ex-parceiro está fazendo enquanto o outro está sofrendo.
Além disso, Bad Bunny expõe a raiva depois que o amor já não se manifesta entre as pessoas do relacionamento, como os erros cometidos em diversos aspectos ficam perceptíveis, desse modo, podendo digerir a relação e seguir em frente, como em BOKeTE e TURiSTA. Mas não é somente de sentimentos ruins e saudade que podem definir os relacionamentos do cantor, afinal, ele ainda acredita em amor verdadeiro e nas paixões momentâneas inesquecíveis, assim como canta em WELTiTA e PERFuMITO NUEVO.

Para completar o álbum de maneira emocionante, Bad Bunny abre seu coração com a música que leva o nome do disco de forma abreviada, DtMF, que ganha um videoclipe com direito a curta-metragem. DeBÍ TiRAR MáS FOToS é uma belíssima canção que discorre sobre o arrependimento de não ter aproveitado o presente quando pessoas queridas ainda estavam presentes. No clipe, essa representação é uma analogia a Porto Rico antes da exploração exagerada dos Estados Unidos e a dissolução da cultura latina para a norte-americana.
A música foi tão impactante para o povo porto-riquenho e os latinos em geral que tornou-se uma trend no TikTok, que teve um alcance de mais de um milhão de posts – neles, os usuários mostram alguém ou algo que desejavam muito que estivesse aqui novamente para aproveitar os momentos vividos. Porém, o que teve mais efeito foi o mini filme, com mais de 18 milhões de views, que representa como os países latinos mudam graças à evolução da tecnologia e o capitalismo, com suas culturas sumindo e virando lugares homogêneos, sem diversidade e histórias.
Benito Antonio Martínez, para além das canções, ritmos latinos e videoclipes, quis aprofundar sobre o tema e contribuir para o não esquecimento da história de seu povo e, ao lançar seus visualizers de suas músicas, decidiu por colocar em cada um deles um fato histórico sobre Porto Rico. Portanto, o novo álbum de Bad Bunny é um ato de revolução, que se infiltra por dentro da indústria musical e retorna o orgulho de latinos para latinos.