Guilherme Moraes
Hong Sang-soo é considerado um dos grandes cineastas contemporâneos por conseguir trazer profundidade em meio a diálogos, aparentemente, banais, uma condução discreta e histórias simples. Em Através do Fluxo, filme que fez parte da seção Perspectiva Internacional na 48ª Mostra Internacional de Cinema em São Paulo, ele encontra a beleza da vida por meio da casualidade.
Em uma mesa de bar, de um restaurante ou até de uma casa, a câmera estática capta os diálogos mundanos, que vão levar a algum lugar sem necessariamente falar sobre eles. Essa é uma das características mais marcantes do Cinema de Hong Sang-soo. Enquanto o audiovisual norte-americano usa muito do plano e contraplano nas interações, o cineasta apenas posiciona a filmadora e deixa seus personagens serem espontâneos. Foi assim em Na Água e Em Nossos Dias (filmes que fizeram parte da 47ª Mostra Internacional de Cinema em São Paulo) e também é assim em Suyoocheon.
Novamente, Kim Min-hee é a protagonista do longa, dessa vez, interpretando uma professora que reencontra o seu tio depois de muitos anos e o contrata para dirigir uma peça da faculdade. O interessante da obra é como ela fala de amor em suas várias formas, por meio de pequenos gestos e conversas. É sobre o amor entre dois parentes que já não se veem há muito tempo; o carinho construído entre professores e alunos, em que ambos se ensinam para além do acadêmico; o surgimento de um romance. Tudo isso é feito cotidianamente.
O filme simula tanto a realidade que, por vezes, nem parece ficcional. Os planos médios e estáticos, que enquadram todos os personagens, valorizam esse aspecto, assim como a dilatação do tempo. Dessa forma, é possível enxergar as relações sendo construídas, casualmente, pelos gestos de cada um. Não existe nem mesmo um direcionamento de como o público deve reagir a cada ação. A diretora da faculdade (Jo Yun-hee) ‘dando em cima’ do diretor da peça (Kwon Hae-hyo) pode causar o riso da plateia, como também o desconforto. No final das contas, a beleza está exatamente no fato de não existir um caminho pré-definido, tudo se constrói naturalmente, assim como a vida.
Hong Sang-soo, caracterizado por suas narrativas pouco convencionais e, de maneira geral, até mesmo desinteressado pela complexidade da trama, vem se tornando um dos grandes nomes do Cinema mundial, enchendo as salas nas últimas duas Mostras em São Paulo, e sendo comparado até com Éric Rohmer. Talvez, ele não tenha a filmografia mais fácil de digerir, pela falta de acontecimentos e dilatação do tempo – mesmo com filmes tão curtos –, mas, com certeza, é um dos diretores mais interessantes quando se acostuma com o seu preciosismo pela vida mundana e pela Sétima Arte.