Alice, é melhor ficar no espelho

Só para não ver o que aconteceu com a sua história.

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Danielle Cassita

Mais uma vez temos uma obra clássica de Lewis Carroll sendo transformada em filme. Em 2010, foi pela direção de Tim Burton que Mia Wasikowska interpretou Alice nas telas de cinema. Agora, ela retorna ao papel em Alice Através do Espelho, junto de Anne Hathway (Rainha Branca), Helena Bonham Carter (Rainha Vermelha), Johnny Depp (Chapeleiro Maluco), entre outros. 

Dessa vez, com direção de James Bobin e Tim Burton na produção, o filme mostra Alice como capitã do navio que herdou do seu pai no longa anterior. Porém, graças a Hamish, o pretendente do casamento arranjado, ela corre risco de perder a embarcação. No meio disso tudo, quando retorna ao País das Maravilhas, ela descobre que o Chapeleiro Maluco está ficando doente porque acredita que sua família está viva. Para resolver isso, Alice precisa voltar ao passado e impedir que algo aconteça aos pais e parentes do personagem. 

As quase 2h de filme são apenas para isso. 

Primeiro, é interessante apontar o recurso utilizado para a trama surgir: viagem no tempo. Para que consiga o feito, ela precisa se encontrar com o Tempo e pegar a cronoesfera para poder voltar a um período específico. A ideia é simples e… Batida. Quantas produções já não existem com viagem no tempo? Além disso, foi necessário criar um personagem que sequer é bem explorado: o Tempo tem uma aparência sombria e, depois de suas primeiras aparições com conversas com Alice, volta a aparecer apenas perseguindo a garota para recuperar a cronoesfera – não por maldade, e sim para evitar a destruição do presente e futuro. Para completar, as falas do dele são compostas em sua grande maioria por frases feitas e clichês sobre a passagem do tempo, seus efeitos, etc. Isso abre para diversos trocadilhos feitos pelos próprios personagens. É chato e não funciona. 

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Tempo, personagem interpretado pelo comediante Sacha Baron Cohen.

Por volta da metade do filme, Alice consegue encontrar a família do Chapeleiro, o que serve para arrumar um jeito de encaixar tramas familiares. Não é só ele que teve problemas com a família; também somos apresentados à infância das Rainhas, e às origens da rivalidade por parte da Rainha Vermelha. Fica fraco: é exibida apenas uma briga boba entre duas meninas por causa de um pedaço de torta e uma mentira para a mãe. A futura Rainha Vermelha corre de casa chorando e bate a cabeça. Pronto, está aí o motivo de toda sua raiva. Vale lembrar que a Rainha Vermelha quer tanto voltar ao passado e fazer sua irmã mudar o que aconteceu que ela faz o que não deveria ser feito, ou seja, se vê quando criança. Assim, um paradoxo é criado e a realidade começa a ficar petrificada. 

Mas, ah, estamos falando de um filme teoricamente infantil, e isso não é um problema. Ou melhor, o filme tenta sustentar a problemática criada – ou seria um monstro? -, já que Alice precisa devolver a cronoesfera para evitar a destruição completa da realidade. Nos últimos segundos, tudo é petrificado e por pouquíssimo ela não consegue. E por que isso não é um problema? Porque o recurso “deus ex-machina” estava demorando a aparecer, e essa é a hora dele. Não havia mais solução, porém, por algum motivo que nunca saberemos, a cronoesfera solta pequenos raios e se conecta sozinha, fazendo com que toda a situação volte ao normal. É pura poesia. 

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Mia Wasikowska convence como Alice; mas é uma pena que ela tenha que dizer tantas frases clichês e conhecidas do público, como numa tentativa insistente e falha de fazer referência ao que ocorre no outro filme. Vale lembrar que, no início deste, a mãe da garota queria que ela simplesmente aceitasse seu destino de vender o barco e parar com as suas viagens, já que isso não combina com mulheres. No final, ao voltar à Londres, temos uma Alice independente e senhora de suas decisões, postura adotada também por sua mãe. Esse é um posicionamento forte e coerente com a personagem – ainda mais no momento atual -, mas que poderia ter tido mais força se aparecesse em outros momentos do filme.

Com figurinos trabalhados (até demais) e cenários bonitos, Alice Através do Espelho entretém e deve agradar quem procura apenas uma aventura diferente com a personagem de Lewis Carrol. Mas não mais que isso.

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