Supernatural entrega a última missão dos irmãos Winchester

Imagem de Sam, Dean e Jack. Dean, cabelos castanhos, está vestindo uma camisa preta lisa com mangas dobradas e uma calça jeans. Sam, cabelos castanhos, veste uma camisa vinho com listras pretas com mangas dobradas e calça jeans. Jack, cabelos castanhos mais claros, está vestindo um moletom azul com faixas brancas nas mangas, na base e na gola e calça jeans. Eles estão em um ambiente com paredes de tijolos claros, há uma estante com livros e um conjunto de espadas samurais atrás deles. Há uma poltrona marrom de couro ao lado direito da estante e na frente deles, em primeiro plano há uma mesa de madeira com duas cadeiras e um abajur. Sam e Jack estão se olhando. Sam está com uma das mão apoiadas no ombro dele que tem as mãos cruzadas em frente ao corpo. Dean está mais atrás olhando para os dois.
Em Supernatural, a família é o laço mais forte que existe (Foto: Reprodução)

Letícia Depiro

Sam (Jared Padalecki) e Dean (Jensen Ackles) Winchester são filhos de uma tragédia. Após a misteriosa morte de Mary (Samantha Smith), o pai dos garotos passa a buscar vingança contra as forças do Mal que mataram sua esposa. Vinte anos depois, Sam, que parece determinado a não seguir os negócios da família, não vê outra escolha a não ser se juntar a seu irmão na jornada em busca de seu pai John (Jeffrey Dean Morgan), que está desaparecido, dando início ao primeiro ano de Supernatural.

Ao longo das 5 primeiras temporadas, temos muito claro os objetivos que movem os irmãos e essa primeira fase, idealizada pelo criador Eric Kripke, que cria laços que se fecham perfeitamente com a trajetória dos personagens traçada até então. Desde a caçada ao pai desaparecido, a busca por vingança de Azazel, o demônio que matou sua mãe, até a introdução, de fato, de anjos, demônios e presságios bíblicos, Sam e Dean confrontam seu destino. Eles se prendem aos seus próprios valores e às suas escolhas, ou não escolhas, para deter o Apocalipse iminente enquanto tentam salvar um ao outro.

Cena de Supernatural. Sam, cabelos curtos e castanhos, com roupa preta, carrega Dean também vestido de preto que está com o rosto ensanguentado. Eles estão ocupando praticamente todo o quadro e o ambiente que aparece está desfocado.
Sam e Dean conseguem impedir o apocalipse (Foto: Reprodução)

Em seu Impala 67, os irmãos viajam pelo território estadunidense resolvendo casos sobrenaturais e salvando vidas. Esse é o verdadeiro legado que eles carregam ao longo dos 5 primeiros anos. No episódio 20 da segunda temporada, Apenas um sonho, Sam e Dean vivem uma vida normal, em que o primeiro está noivo e cursando a faculdade de direito e o segundo é casado com a mulher de seus sonhos. A grande sacada é que todas as pessoas que eles salvaram até então estão mortas, e nós podemos, pela primeira vez, entender a dimensão da jornada dos irmãos Winchester. Eles são heróis movidos unicamente pelo propósito de salvar vidas e salvar um ao outro.

Enquanto Sam é o filho rebelde e questionador que se opõe ao pai, Dean é o irmão obediente que, desde criança, aprendeu a ser responsável, cresceu cedo demais e carrega o peso da responsabilidade pela vida do irmão mais novo. Essa dualidade entre eles se reflete nos caminhos que percorrem. Sam, movido por uma sede de justiça e por suas próprias crenças, encara escolhas difíceis e toma decisões que mudam o rumo da história, ele percorre caminhos controversos acreditando fielmente nos resultados. Já Dean, sempre confrontado com a inevitabilidade de suas escolhas, é levado ao limite e se desvia de seus valores apenas quando as circunstâncias não lhe deixam outra saída. Eles não poderiam ser mais diferentes, mas o amor que os une é sempre maior do que qualquer desavença.

Cena de Supernatural. Sam e Dean estão vestidos com roupas do FBI, uma jaqueta azul por cima de suas roupas em um fundo claro. Eles olham espantados para algo fora da imagem e Sam está com a mão no abdômen de Dean.
Sam e Dean são heróis mesmo quando tentam não ser (Foto: Reprodução)

O interessante de se observar é que esse contraste entre os dois é uma das bases narrativas usadas pelo roteiro para traçar a inevitável jornada dos personagens. A dualidade entre os irmãos, entre o certo e o errado, culmina no destino que eles enfrentam no final da quinta temporada. Sam é o receptáculo de Lúcifer, o filho que se rebela contra o pai e é expulso do Paraíso, Dean está predestinado à Miguel, o filho obediente que se coloca contra o próprio irmão pelas vontades do pai, e, assim, eles devem cumprir o presságio bíblico da batalha entre os Arcanjos. Seus destinos são bíblicos e irrevogáveis, e dessa forma  eles se cumprem.

Explorando dramas familiares e lendas urbanas, o roteirista Eric Kripke criou uma trama que funcionou perfeitamente ao longo das 5 primeiras temporadas, culminando em um final épico e digno dos personagens. E encerrou da forma como desejava com o gran finale do episódio Canção do Cisne.

Ao deter o Diabo Lúcifer e impedir o Apocalipse, Sam e Dean atingem o auge de sua jornada, eles alcançam aquilo que vem buscando desde o começo: salvar o mundo. E finalmente se veem livres da carga heroica que se coloca sobre eles, e é justamente nesse ponto da narrativa que muitos fãs acreditam que a série deveria ter parado. Eric Kripke sabia o que Supernatural deveria ser, os seus sucessores nem tanto

Sam e Dean estão enquadrados da cintura para cima no meio da imagem. Sam, cabelos castanhos e barba curta, está vestindo uma camisa xadrez e um casaco marrom por cima. Dean, cabelos castanhos, está vestindo uma camiseta preta e duas jaquetas por cima, uma azul e uma preta. Atrás deles de forma desfocada o cenário é composto por árvores e o carro impala preto e um poste azul ao lado esquerdo.
Apesar da série se passar nos Estados Unidos, ela apresenta vários seres de diversas culturas e crenças (Foto: Reprodução)

A sexta temporada é, de fato, um novo recomeço. Ao deixar para trás toda a carga emocional do ano anterior, os roteiristas, agora sem Kripke, optaram por voltar às origens da velha rotina de caçadas enquanto desenvolvem a pouco emocionante trama central de Sam ter retornado da jaula de Lúcifer, após o confronto entre os anjos, sem alma. 

Essa nova fase se mostra um pouco repetitiva, numa tentativa sem sucesso de se igualar com a anterior. Os irmãos já haviam atingido o auge, chegando no limite que poderiam ser levados. Sam já tinha feito todas as escolhas erradas possíveis e se arrependido delas, e Dean confrontou seus extremos diante das inevitáveis decisões impostas a ele. Ambos enfrentaram o pior cenário e lutaram a maior batalha, e o que vem depois apresenta muita dificuldade de se equiparar. E, assim, se seguem as próximas temporadas.

Apesar da crítica dos fãs, e dos altos e baixos da série após a saída de Kripke, Supernatural se mantém fiel ao entregar aventuras e uma dose extra de amor fraterno que prende os espectadores dentro da rotina dos personagens. A cada nova trajetória, a noção de família se fortalece ao mesmo passo que muda. Sam e Dean se relacionam com outros personagens, novas famílias surgem, e eles, que se viam sozinhos, encontram pessoas em seus caminhos que ressignificam o sentido do amor. Supernatural se aprofunda na história dos Winchester e reforça os laços com coadjuvantes, que são introduzidos ao longo da série. 

Imagem promocional de Supernatural. Sam, Dean, Castiel e Crowley estão no centro da imagem de pé olhando para a câmera. Crowley está todo de preto, na lateral direita da imagem com o corpo na diagonal, Castiel está vestindo um sobretudo marrom por cima de uma camisa branca e gravata azul e calças escuras, no canto esquerdo e também com o corpo na diagonal contrária. Sam e Dean estão no centro da imagem, Sam ao lado esquerdo de Dean. Sam veste uma jaqueta preta por cima de uma blusa cinza e calça jeans e Dean está com uma blusa de mangas compridas azul e calça preta.
Novos personagens marcantes surgem a partir da sexta temporada da série (Foto: Reprodução)

Depois de 15 anos e 15 temporadas, a série, que tinha tudo para ser só mais um procedural no estilo Arquivo X, acabou se tornando algo muito mais complexo. E, apesar dessa polêmica com a segunda fase da produção a partir da sexta temporada, ela não decepcionou ao entregar alguns momentos épicos de  personagens marcantes, além de novos rostos que conquistaram o público.

É nessa segunda fase que o roteiro se concentra no amadurecimento de Bobby (Jim Beaver). O personagem ganha uma nova camada, tendo sua alma vendida ao demônio Crowley. O caçador tem um episódio praticamente próprio na tentativa de salvar seu destino e passa a ser visto como alguém com seus próprios problemas, e não apenas como um suporte para Sam e Dean, e a relação familiar entre eles se estreita ainda mais. Bobby é a primeira noção de família que os irmãos têm depois da morte do pai, ele se torna a figura paterna que supre uma carência dos meninos.

Essa carência é algo presente durante Supernatural. Diante de todas as dificuldades enfrentadas, Sam e Dean se mostram muito carentes de pessoas em que podem confiar, e, quando essa relação de confiança se estabelece, independente do que a pessoa representa ou de seu passado, eles a têm como parte da família. Isso acontece com os vilões como Ruby (Katie Cassidy/Genevieve Padalecki), Crowley (Mark Sheppard) e Rowena (Ruth Connell), que, no final das contas, passam a fazer parte do círculo familiar dos irmãos Winchester, ganhando espaço relevante no arco deles. 

Sam e Dean estão enquadrados no centro da imagem do peito para cima. Dean, cabelos castanhos, está vestindo uma camiseta e uma jaqueta cinza por cima e Sam, cabelos castanhos e barba curta, está vestindo uma camisa xadrez e uma jaqueta azul marinho. Atrás deles de forma desfocada o cenário é totalmente composto por árvores.
Cada novo personagem ganha um espaço único na trajetória de Sam e Dean (Foto: Reprodução)

Supernatural estranhamente faz os espectadores gostarem dos vilões. Ela nos apresenta anjos trapaceiros e demônios bonzinhos, inverte totalmente os papéis impostos pela sociedade, e, por isso, conquistou tanto o público. Essa inversão de estereótipos traz uma carga de veracidade a série, por mais sobrenatural que a criatura seja há algo de humano nela, e, ironicamente, o ponto alto do enredo é o foco nas relações e reações naturais dos personagens.

Assim, acabamos revisitando o drama, que é o amor entre os personagens, as esperanças, os sonhos, as promessas e as decepções.  Esse lado humano é reforçado na resolução final do programa, quando o roteirista Andrew Dabb optou por dar a Sam e Dean uma morte mais humana. O encerramento da 15ª temporada nos traz um sentimento mais agridoce, é um desfecho muito digno e coerente com o que a narrativa se tornou depois da saída de Kripke. E trouxe até uma sensação do 5º ano naquilo tudo, com os irmãos lutando contra o vilão Chuck (Rob Benedict), agora no papel de Deus, em uma batalha simples, mas uma cena épica, cheia de significados, referências e nostalgia, é um final que vale a pena pela emoção.

O desenrolar da décima quinta temporada é uma espécie de crise existencial para Sam e Dean, que vão questionar a real missão deles na Terra. Chuck, o Profeta do Senhor, que eles inconscientemente trouxeram para dentro da família, é agora um Deus impiedoso e destrutivo digno do Velho Testamento, e que, com um brilho nos olhos, brinca com o destino e a vida dos irmãos apenas porque pode, tirando todo o mito de herói que os permeia desde a primeira temporada.

Cena de Supernatural. Sam e Dean estão segurando dois bebês. Sam está sorrindo com o bebe no colo, vestindo uma jaqueta preta por cima de uma camisa xadrez marrom. Dean está segurando o outro bebê com uma jaqueta cinza e calça escura enquanto olha para Sam. Eles estão em um banheiro, com uma pia no canto inferior esquerdo, uma porta branca atrás deles assim como uma grande janela e cômoda de madeira atrás de Sam.
Supernatural traz o gênero terror de forma totalmente diferente e elegante (Foto: Reprodução)

A última temporada nos proporcionou momentos fortes entre os personagens. Eles mantêm uma boa química e Castiel (Misha Collins) finalmente faz a declaração tão esperada pelos fãs quando, depois de anos de construção, escancara seus sentimentos por Dean ao dizer que o ama, tornando o shipp canônico, como disse o próprio ator. Mas, infelizmente, a história do anjo termina de forma trágica com sua morte logo após se colocar como um personagem LBTGQIA+, e essa escolha do roteiro não agradou os fãs.

Depois de 15 anos, a CW nos entrega um final satisfatório para Supernatural, apesar da banalização de alguns personagens fortes da mitologia bíblica, como a Morte, Lúcifer e Miguel. E traz o único desfecho minimamente aceitável da morte dos protagonistas de forma digna como a trajetória construída pede, apesar do contraste do encerramento épico da quinta temporada. Supernatural teve, ao todo, mais de 300 episódios, divididos em 15 temporadas repletas de conflitos, e trouxe toda a emoção da despedida de personagens tão queridos que acompanhamos por tantos anos.

Deixe uma resposta