Guilherme Luis
Representatividade, diversidade, inclusão e aceitação são palavras que têm tomado a cultura pop por completo. “Call Me By Your Name” surgiu como o representante LGBT+ no último Oscar, sendo até bem cotado ao prêmio principal devido ao vencedor “Moonlight” do ano anterior, também com um protagonista gay. Esses dois exemplos, contudo, fazem parte de um nicho do cinema mais conceitual, o típico “filme de Oscar” que, no geral, não chega ao grande público. Nesse 5 de abril as coisas mudam drasticamente com a chegada aos cinemas brasileiros de “Com Amor, Simon”, uma rara grande produção de estúdio sobre um romance gay.
A história é sobre Simon Spier, um menino de 16 anos que guarda sua homossexualidade como um grande segredo. Bem no estilo “Gossip Girl”, Simon conhece pelo blog da escola outro menino gay que se esconde sob o nome de Blue e os dois passam a se corresponder por e-mails. As coisas mudam totalmente quando esses e-mails caem nas mãos de um chantageador da escola, que passa a ameaçar o vazamento do segredo de Simon no blog escolar.
O longa dirigido por Greg Berlanti é baseado no livro homônimo de Beck Albertalli, lançado em 2015 no Brasil pela Editora Intrínseca, e que fora recebido com empolgação pela comunidade de leitores que ansiavam por histórias adolescentes com protagonistas LGBT+. No livro, a angústia por querer saber a identidade do misterioso Blue, somada à leveza com que a história é narrada levam o leitor a ansiar e acabar rapidamente a leitura. Becky tinha a preocupação de contar uma história comum sobre um adolescente com uma característica não tão comum – para ela, falar desses assuntos (e escrever romances sobre) ajudam a normalizar os assuntos. É com essa ideologia que ela escreveu também um romance divertido sobre uma protagonista gorda, mas que também fala sério sobre gordofobia. Becky, portanto, é extremamente preocupada com a diversidade: quase que metade de seus personagens são não-brancos e isso, felizmente, foi transposto para a tela de cinema.
O desafio dos produtores e roteiristas do filme era adaptar a história do livro às telonas de forma que soasse relevante comercialmente para os estúdios Fox, sem deixar que isso afetasse a responsabilidade de passar as mensagens que o livro carregava. O resultado disso foi uma comédia romântica que parece qualquer outra que agrada ao grande público: personagens facilmente identificáveis, bem como uma estrutura de roteiro já conhecida – com boas doses de comédia, mas sem esquecer como pegar o expectador pelo choro. Identificar-se com os dramas de Simon, seja hétero, gay, adulto ou adolescente é inevitável, e boa parte disso se deve ao ótimo trabalho de Nick Robinson, que interpreta o protagonista e dificilmente perde o timing das cenas.
O filme, porém, não cai na pieguice de ser extremamente explicativo, emocional ou apelativo. Ele é didático enquanto diverte e fala sério enquanto faz rir. Simon depende muito do suporte das pessoas ao seu redor, que são em sua maioria personagens bem desenvolvidos e bem interpretados.
Os destaques ficam para Katherine Langford (13 Reasons Why), que interpreta a melhor amiga de Simon, e Jennifer Garner e Josh Duhamel, os respectivos pais do protagonista, que acertam no equilíbrio entre o cuidado, amor, desapontamento e crescimento. O arco de Simon desenvolve todos os personagens ao redor – que mudam e evoluem conforme as coisas na vida do menino mudam também.
“Com Amor, Simon” peca talvez em ser básico demais. Não há, num geral, aspectos técnicos incríveis: a trilha sonora não é um acerto tão grande quanto poderia ser e o roteiro pode parecer preguiçoso quando você chega ao final e recebe as revelações devidas. Pode soar também utópico demais. Ou seja, é importante dar esperança aos LGBT adolescentes e jovens, mas é necessário mostrar a eles que as coisas podem dar mais errado do que dão no filme. Não é errado ter pais que te compreendem rápida e completamente – mas soa estranho se numa cena anterior o pai tiver feito uma piada homofóbica e a mãe rido dela; são nessas incongruências que o roteiro derrapa.
É, no final das contas, um filme arroz com feijão. Mas o arroz com feijão mais importante dos últimos anos – um pontapé inicial para uma possível leva de filmes de gêneros diversos com protagonismo LGBT+. Nossa torcida é que esse filme mostre aos grandes estúdios que contar uma boa história já independe de características dos personagens – que ser branco, hétero e magro não é mais o padrão que o público quer ver (grande parte dele, pelo menos). Aos intolerantes, fica a esperança de que essas histórias venham pra educa-los e fazê-los entender mais sobre a vida – e sobre o amor que Simon e tantos outros personagens merecem ter.