Adriano Arrigo
No último 27 de Agosto, o Sesc Bauru abriu suas portas para receber a exposição Arte à Primeira Vista: que linha é essa?. Essa exposição com curadoria de Renata Sant´anna e Valquíria Prates faz parte do programa Arte à Primeira Vista que como objetivo a aproximação da arte contemporânea com as crianças através de um ambiente lúdico e informativo.
Porém, até os olhares menos atentos notarão que a exposição não é feita somente para os pequenos. Nela há ricos materiais a serem explorados, além de estar expostas peças únicas de seis grandes nomes da arte contemporânea brasileira, a saber: Lygia Clark, Manoel de Barros, Mira Schendel, Leonilson, Franz Krajberg e Regina Silveira.
A viagem pelas obras desses artistas já se inicia pelo lado de fora. O revestimento da exposição conta com ricos detalhes em madeira cuidadosamente aludindo uma tipografia exclusivamente criada para a amostra, além de algumas frases dos artistas que compõem a amostra. A tipografia da exposição merece destaque pois remete aos principais elementos que compõem o mais primitivo dos desenhos: pontos e linhas. Esse cuidado na montagem do ambiente não o torna somente mais agradável, mas também serve como um mapa de detalhes à se descobrir.
A entrada lateral da exposição já conta com uma das mais famosas obras que a exposição possui. Trata-se de Rede de Elástico da Lygia Clark. Elaborado na fase denominada Objetos Relacionais (1976-1981), a obra sensorial de Lygia foi concebida como objeto terapêutico que intenta estreitar as ligações com o eu interior tanto da artista quanto o eu de quem está a interagir com a obra. Na exposição, a obra se comporta com uma cortina interativa, já que é impossível passar por ela despercebido.
Por dentro, a exposição conta com seis móbiles de madeiras vazados nos quais é possível imergir no universo de cada artista e interagir com as propostas apresentadas. A interação vai desde uma enorme tábua acrílica pronta para ser costurada (obra de Regina Silveira) até a possibilidade de criação de fotomontagens a partir das fotos de Manoel de Barros.
Em destaque, há o móbile de Lygia Clark. Nele, está disponível para montagem uma pequena réplica em papel de uma das esculturas da série Bichos (1960) (também presente na exposição). Esse conjunto de peças metálicas e tridimensionais são um contraponto de sua fase anterior, predominantemente bidimensional. A partir da inserção de dobradiças em chapas de metal, Lygia faz com que suas obras ganhem vida, se mexem e se moldem, de acordo com a vontade do público.
Já obra de Mira Schendel está exposta em pequenos quadros que podem ser confundidos com poesia concreta. São experimentações usando das possibilidades de formas que os diversos detalhes de uma tipografia pode produzir. Para isso, Schendel usa espaços vazios e frequentemente a monotipia, técnica que produz apenas uma cópia da obra. Além desses quadros, há o seu móbile que permite que os visitantes façam experimentações em uma espécie de cortina de letras, prezando a estética da forma e não necessariamente a semântica das palavras.
Outro móbile muito interessante é aquele dedicado ao artista Frans Krajcberg. Atualmente com 95 anos de idade, esse artista polonês radicado no Brasil trabalha exclusivamente com materiais da natureza em obras que pretendem mostrar a relação predatória entre o ser humano e o meio em que vive. Em seu móbile estão disponíveis caixas de madeiras preenchidas com material orgânico seco, tais como folhas, cascas e sementes de árvores. A proposta é que o observador possa criar um contraponto de sensações a tanto concreto do cotidiano, além de redescobrir das texturas e formas orgânicas da natureza, justamente como Krajcberg faz em suas esculturas. O objetivo parece ter sido cumprido quando o público infantil transformou o material orgânico em meros farelos.
Levando em consideração o objetivo da exposição, talvez o destaque seja mesmo as obras de Leonilson (1957-1993). Com um estilo peculiar, a obra de Leonilson se destaca pelos seus desenhos em folhas de papel praticamente em branco, além de seus tortos bordados em pedaços de panos. Sua obra minimalista parecer contrapor uma realidade gigantesca não adequada a ele. Com toda a sua delicadeza e inocência, não há como não lembrar do particular universo infantil.
No fim, a exposição é bem-sucedida em aproximar a arte contemporânea a um público sem restrições de idade. As obras expostas mostram claramente que esse movimento é, na verdade, familiar a todos aqueles que viveram uma infância tipicamente brasileira com direito a riscos de giz em calçada, recortes de pano e rabiscos livres em folhas em branco. Através da exploração dessa identidade própria, fica fácil extrair interpretações e, enfim, se encontrar nela, mediante a ótica infantil.