Adriano Arrigo
Os primeiros dez ou quinze minutos de Animais Noturnos, a segunda empreitada fílmica de Tom Ford, possuem qualidades plásticas dignas de alguém com plena experiência na esfera artística: cores, composições e posições muito bem definidas. Como complemento, há o alinhamento de discussões muito pertinentes a realidade contemporânea: solidão, normose, confiança. Esses elementos – a estética e a sociedade –, intrinsecamente ligados, estouram na cara do espectador, que estranha a dança sinistra de mulheres obesas e nuas.
Dessa forma, Ford deixa claro que os padrões estéticos que levantaram sua carreira serão subvertidos. E Susan (Amy Adams) olha distante a festa da queda da humanidade enquanto é composta justamente pela imagem que lhe engole: lânguida, sozinha e clean. Seu marido distante é objeto sexual encapsulado em um modelo em série perfeito, mesmo que possua falhas insignificantes, como a espessura do líquido que ejacula ou o tamanho de seu pênis. E assim como Ford, o mundo de Susan vende uma suposta arte reflexiva, mas, nos bastidores, está preocupado com efemeridades hedônicas.
Porém, quando Susan recebe de seu ex-marido Tony (Jake Gyllenhaal) um livro intitulado Animais Noturnos, os simbolismos que Ford joga na construção de seus personagens é desfalecido. A tentativa de fazer a metalinguagem ao colocar o enredo do livro como o próprio filme escoam as críticas ao opaco mundo contemporâneo, em duas sub-narrativas exaustivas e que pesam em excesso no belo mundo frio de Susan.
Em uma delas, a vingança suga até os ossos a vivacidade de Tony, enquanto ele se arrasta em um faroeste texano com direito a xerife de Ray Ban e mortes por carabina. Na outra, a crise de um belo casal pós-formação universitária é discutido sob as cores frias de uma Nova Iorque cinzenta. Abstendo-se do fato que essas narrativas forçam a espinha dorsal lá esquecidas no plano de Susan, Ford não consegue entrelaçar esses sentidos apresentados e montá-los em uma forma coesa que, ao mesmo tempo, justifique o desenrolar tão detalhado dessas histórias.
Ao final, o diretor mostra estar apto a dar forma ao vazio do mundo da protagonista e, claro, estará em pouco tempo dividindo espaço com Nicolas Winding Refn nesse nicho de cinema esteticamente prazeroso, que brilha na retina dos estetas. Porém, a combinação de camadas que não pertencem ao seu mundo são difíceis de encaixar e, além de tudo, não possuem forças o suficiente para demonstrar que Animais Noturnos não é, enfim, parte do problema que ele, inicialmente, pretende discutir.
Um comentário em “Da forma vazia em Animais Noturnos”