IDLES: uma trajetória para o introspectivo e explosivo (na medida certa) CRAWLER

A imagem mostra a fachada de uma casa e um homem vestido de astronauta se apoiando com o braço direito na parede e olhando para baixo. Ele está atrás de uma porta de vidro com rusgas verticais, o que distorce levemente a imagem. Está de noite e a cena está iluminada por luzes amarelas. Há também perto do homem um armário e, em cima, uma planta em um vaso.
Uma das fotos do ensaio feito para a capa do álbum (Foto: Tom Ham)

Gabriel Leite

IDLES, para alguns, pode parecer intragável de início. Eu não julgo, foi assim comigo e demorou uns bons meses até eu realmente me interessar em escutar. Começou como uma banda que eu pulava as músicas quando tocava na playlist aleatória, depois evoluiu para um guilty pleasure (“prazer com culpa”, em tradução livre) e agora eu estou aqui escrevendo sobre ela. Sua sonoridade é algo que ou te pega de primeira ou insiste até você gostar. Não vence pelo cansaço, mas sim pela força arrebatadora de uma roda punk saindo dos fones direto para seu ouvido até você prestar atenção.

Então meu objetivo aqui hoje é, não só escrever uma simples crítica, review, análise ou seja lá o que for de CRAWLER, o 4º álbum de estúdio, como também apresentar brevemente a banda e seus trabalhos para que, de alguma maneira, possa lhe trazer um maior aproveitamento quando você for escutar seu lançamento mais recente (e quem sabe fazer você dar um ponta pé inicial para se tornar fã da banda).

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Nota Musical – Dezembro de 2021

Arte retangular na cor azul. Do lado direito está a caixa de um CD, este decorado por uma foto de quatro artistas: Alicia Keys, Joshua Bassett, Arca e BK’. Já ao lado esquerdo, está escrito, em branco, na área superior, “nota musical”. Ao centro, o logo do persona, um olho com a íris na mesma cor do fundo. Logo abaixo, o texto em preto “dezembro de 2021”.
Destaques do mês de dezembro: Alicia Keys, Joshua Bassett, Arcar e BK’ (Foto: Reprodução/Arte: Ana Clara Abbate/Texto de Abertura: Raquel Dutra)

Quando as canções natalinas não preenchem mais o ambiente e Mariah Carey libera o topo das paradas musicais, é sinal de que o último mês do ano acabou. Ao longo dos últimos 12 meses, o Persona acompanhou cada movimento do mundo da Música nas edições do Nota Musical, e para encerrar o ciclo embalado pelas mais diversas trilhas sonoras de 2021, é hora de ouvir o que o mês de dezembro tem a nos dizer.

Que o ano apelidado de 2020.2 seria repleto de ironias, nós já sabíamos. Mas quando Olivia Rodrigo explodiu suas decepções românticas nos ouvidos do mundo inteiro com o maior hit de 2021 logo em janeiro, ninguém poderia imaginar que terminaríamos o ano em dezembro ouvindo o outro lado da história. O trio de canções Crisis / Secret / Set Me Free parece ser a maneira que Joshua Bassett encontrou para se livrar das maldições liberadas por drivers license, e deixar a confusão com a nova estrela pop no passado.

Enquanto alguns aproveitaram dezembro para resolver suas últimas pendências do ano, outros usaram o mês para iniciar novos projetos e vislumbrar 2022. Este é o caso de Angèle, a artista belga que ganhou repercussão global depois de cantar Fever junto de Dua Lipa, e seu segundo disco, Nonante-Cinq. Em um synth-pop gracioso, fresco e melancólico, Angèle mostra o porquê é um dos nomes francófonos mais populares da atualidade – e porque pode ir muito além disso.

Na mesma direção, Arca continua com sua música ambiciosa e intensa. Em dezembro, a venezuelana indicada ao Grammy colocou no mundo não um, não dois, não três, mas quatro discos, que dão sequência ao seu aclamadíssimo KiCk i. Os admiradores de SASAMI também têm material para iniciar o novo ano, já que a promessa do metal norte-americano continua a preparar o lançamento de seu segundo disco, que vai suceder sua estreia homônima muito bem recebida pela crítica, com o single Say It.

Falando nos jovens, a estreia de No Rome, pupilo de Matty Healy, o frontman do The 1975, é parada obrigatória dos textos abaixo. O artista filipino começou a espalhar suas canções lo-fi pelo SoundCloud e hoje ecoa por aí o que ele chama de “shoegaze R&B” em It’s All Smiles, contando com a produção mais famosa da Música alternativa contemporânea. Outro destaque é a nova música de Ruel, que reflete sobre amadurecimento em GROWING UP IS ____. Enquanto isso, SZA terminava o ano com raiva de alguém e Khalid embarcou em uma viagem suave.

A atmosfera retrospectiva de dezembro também nos levou à memória daquele fatídico 29/12/2001, que levou a voz mais marcante do rock brasileiro alguns dias depois da data destinada à celebrar a sua vida. Cássia Eller é dona de uma presença muito poderosa para desfazer-se entre nós, e os 20 anos de sua morte e 59 de vida foram marcados por Espírito do Som. Ainda resgatando a memória da Música brasileira, nos lembramos de que completaremos 40 anos sem uma das nossas maiores estrelas. A inauguração das homenagens ao legado da eterna Elis Regina começou através do lançamento de Elis, essa saudade, disco que reúne gravações feitas pela artista entre 1979 e 1981.

Mas hoje, temos o prazer de apreciar e valorizar Maria Gadú. Um dos principais nomes da MPB contemporânea completou 35 anos no último dia 4 e celebrou a data através de Quem Sabe Isso Quer Dizer Amor, álbum que traz regravações de grandes sucessos da Música Popular Brasileira e principais influências para a identidade musical da artista. Já para a banda de destaque no pop-rock brasileiro atual, falar de memórias é só mais um pretexto para manifestar sua típica descontração. É que o terceiro álbum da Lagum segue naquele antro de sinceridade, ironia e irreverência, características fortes da música do grupo mineiro. 

Um dos maiores fenômenos pop contemporâneos no Brasil também tomou parte das comemorações de dezembro. Pabllo Vittar encerrou um ano de ouro em 2021, marcado pelo sucesso de Batidão Tropical, com I AM PABLLO, seu primeiro registro ao vivo, que ficou responsável por iniciar as celebrações de seus meteóricos cinco primeiros anos de carreira. Lá fora, o aniversário foi de 5 Seconds of Summer, que exatos 10 anos depois de seu primeiro show, festejou seus 10 anos de existência com a canção 2011, que relembra a história e reverência a amizade do quarteto australiano.

Só estava faltando o encerramento dos 20 anos de carreira de Alicia Keys, perfeitamente concluídos por KEYS. O novo álbum da rainha do neo-soul sucede o colorido ALICIA (2020) com muita ambição: como um disco duplo, 26 músicas as levam de volta às suas origens que construíram o sucesso absoluto de seu primeiro disco em 2001, para desbloquear sua criatividade e reimaginar suas próprias canções. Entre os lados intitulados Originals e Unlocked, o ouvinte de Alicia Keys pode entrar em contato com a cantora, compositora, pianista e produtora que foi um dos maiores fenômenos musicais do século – e que nunca saiu de perto de nós.

Quem também esteve presente foi Black Country, New Road. Enquanto o novo disco da banda britânica, que foi destaques do mês de janeiro, não é lançado, ela aparece aqui com o EP Never Again, apresentando quatro covers inusitados. Também na lista das melhores revelações do ano, Arooj Aftab convenceu até o Grammy com a preciosidade de seu álbum lançado em abril e nos abençoou em dezembro com sua performance no Tiny Desk. E para os brasileiros, a conquista do mês foi ver MC Dricka, que brilhou no lançamento de seu álbum em maio até na Times Square, apresentando o hino Gadinho de Faz Tempo no palco do projeto musical internacional COLORS.

Há sete meses, Luísa Sonza abalava o pop nacional com DOCE 22, e agora, foi vez de encerrar os lançamentos do projeto com ANACONDA *o*~~~. Já em junho, foi a vez de Doja Cat colocar em órbita Planet Her, e em dezembro, a novidade foi o clipe de Woman, o single da vez que aquece sua corrida até as premiações. Na mesma função, está a nova favorita do Grammy Billie Eilish, promovendo sua campanha para Happier Than Ever, com o vídeo de Male Fantasy. A esnobada do ano, infelizmente, foi Lorde, que segue sob o poder do sol desde agosto, e agora traz uma narrativa visual para Leader of a New Regime.

Assim, o que mais teve em dezembro foi presente de fim de ano. A Música brasileira ganhou o lançamento do disco de Elza Soares & João de Aquino, uma releitura de Nara Leão feita por Márcia Tauil, Roberto Menescal e Ana Lélia, e a descoberta de Lucidayz, o projeto solo indie-rock do artista sergipano Samuel Elijah. De fora, Moses Sumney, artista ganês-americano que aparece vez ou outra na trilha de Euphoria, trouxe a experiência espiritual de seu primeiro álbum ao vivo; Katy Perry e Alesso entregaram uma boa canção para uma noite animada; e Art School Girlfriend, pseudônimo da galesa Polly Mackey que apareceu por aqui pela primeira vez em setembro, realizou um tributo a Prince.

Seguindo com os mimos para os sobreviventes de 2021, Tame Impala apresentou a inédita No Choices, introduzindo a edição comemorativa de The Slow Rush, o quarto disco de estúdio da banda, indicado a Melhor Álbum de Música Alternativa no Grammy 2020. Superchunk aproveitou os últimos dias do ano para fazer seu retorno com a canção Endless Summer, e Rostam remixou o seu segundo disco solo. Por último, a maior se fez presente: dois dias antes do Natal, Joni Mitchell presenteou o mundo com um vídeo especial de River, para encerrar a comemoração aos 50 anos de Blue.

Os votos finais do ano partiram de Rodrigo Alarcon, que em Rivotril e a Fé traz uma mensagem descontraída de compreensão para com quem viveu os momentos difíceis dos últimos dois anos. Da mesma forma, Anná e Flaira Ferro refletem resumem o espectro emocional dos últimos dois meses em Ô Ano Doido. E para mais um futuro fevereiro sem Carnaval, Ivete Sangalo e Carlinhos Brown nos servem música nova pra festejar em casa.

Sobre a vida em sociedade, BK’, como sempre, empresta sua música cirúrgica para analisar as relações que mantemos com o mundo ao nosso redor. A obra da vez é Cidade do Pecado, que traz uma identidade ainda mais urbana para o trabalho do rapper carioca. Precisa de um refresco depois disso? Pois aqui está a dupla Arnaldo Antunes & Vitor Araújo com o paradisíaco Lágrimas no Mar.

Por fim, restou à Mitski aumentar as expectativas para Laurel Hell, seu sexto álbum e um dos mais esperados de 2022 com Heat Lightning. Phoebe Bridgers – também conhecida por aqui como uma das artistas que mais trabalhou em 2021 – deu continuidade à sua tradição anual de direcionar os lucros de seus lançamentos natalinos à instituições humanitárias. A música do ano foi Day After Tomorrow, numa releitura do sucesso de Tom Waits.

Para o ano ou para esse post, se você chegou aqui, merece os parabéns e a nossa bonificação. É hora de colocar os fones para ouvir o último mês de 2021 e apreciar a última edição do Nota Musical como conhecemos hoje. Um novo ciclo está começando, e o Persona guarda muitas novidades para o próximo ano. O que não muda é nosso compromisso com a valorização da Arte, da Cultura e do Jornalismo, que só podem existir se a vida também for preservada. Cuide-se, pois contamos com a sua companhia para um grandioso 2022!

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10 anos de Suck It and See: a sátira corrosiva que marcou profundamente o Arctic Monkeys

Capa do álbum Suck it and see, da banda inglesa Arctic Monkeys. Foto quadrada com um fundo branco, com os escritos suck it and see ao centro, em fonte de cor preta.
Suck It and See, um dos melhores álbuns do Arctic Monkeys, completou 10 anos de lançamento em 6 de junho de 2021 (Foto: Domino Records)

Bruno Andrade

É comum ouvir dizer que Alex Turner interpreta um personagem diferente em cada álbum, e que isso pode ser visto de forma mais visceral em Tranquility Base Hotel & Casino (2018) – o mais recente trabalho do Arctic Monkeys –, no qual ele realmente transforma-se em uma persona. Mas em Suck It and See, quarto álbum de estúdio do grupo, que completou 10 anos em junho deste ano, não é somente Turner que assume uma nova identidade. No disco, o quarteto inglês assumiu a influência do rock estadunidense – principalmente dos anos 1960 –, e deixou transcorrer por todas as faixas suas referências, dando ao projeto um ar de álbum conceitual. 

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Nota Musical – Novembro de 2021

Arte retangular na cor vermelha. Do lado direito está a caixa de um CD, este decorado por uma foto de quatro artistas: Adele, Summer Walker, Manu Gavassi e Marília Mendonça. Já ao lado esquerdo, está escrito em branco na área superior “nota musical” ao centro o logo do persona, um olho com a íris na mesma cor do fundo, e logo abaixo o texto em preto “novembro de 2021”
Destaques do mês de novembro: Adele, Summer Walker, Manu Gavassi e Marília Mendonça (Foto: Reprodução/Arte: Nathália Mendes/Texto de Abertura: João Batista Signorelli)

A gente piscou, 2021 passou, e o fim do ano chegou. Mas antes de cantar hinos natalinos e adentrar no ano da mais aguardada e temida eleição da história do país, o Persona processa o mês de novembro, marcado pela já tradicional alta da inflação, pela pertinente reflexão sobre o racismo despertada pelo Dia da Consciência Negra, e pela discussão em busca de encontrar formas de combater as mudanças climáticas na COP-26. Não podemos deixar de notar também o ressurgimento dos cinemas, que voltam em peso com os lançamentos de Eternos, Marighella e Encanto. 

Para o mundo da Música, o mês começou com o gosto amargo de duas terríveis tragédias. A primeira foi o acidente aéreo no dia 5 de novembro, que levou a vida da mulher que revolucionou a Música Sertaneja. Marília Mendonça será sempre lembrada por abrir as portas para as mulheres dentro do gênero musical, fundando o movimento batizado de Feminejo, e conquistando milhões de brasileiros. Da Rainha da Sofrência, jamais seremos capazes de esquecer

Ainda no mesmo dia, um tumulto durante um show de Travis Scott realizado em Houston, no Texas, causou 10 mortes, dentre as quais a de um menino de 9 anos, além de várias outras vítimas terem sido hospitalizadas. O rapper, que já tinha um histórico de incentivar tumultos em seus shows, e a organização do festival são alvo de dezenas de processos que já somam bilhões de dólares, e a situação pareceu ainda mais indigesta com o lançamento de ESCAPE PLAN no mesmo dia da tragédia, uma canção que parece estranhamente falar sobre o caos que ele ajudou a criar. 

Outro destaque musical de novembro foi, claro, a divulgação da lista de indicados ao Grammy 2022, que fez Olivia Rodrigo ter seu nome nas 4 categorias principais, e Jay-Z tornar-se o artista mais indicado na história da premiação, com 83 nomeações. Mas quem se sobressaiu este ano foi Jon Batiste, que depois de vencer o Oscar pela trilha sonora de Soul, ficou à frente de nomes como Justin Bieber, H.E.R. e Doja Cat ao acumular indicações em 11 categorias. Billie Eilish, Kanye West e Lil Nas X também se destacaram, enquanto Lana Del Rey, Miley Cyrus e Lorde ficaram de fora.

Com um olho no Grammy 2022 e outro no de 2023, o último mês também trouxe um primoroso trabalho que já tem grandes chances de se destacar entre as obras que serão indicadas no ano que vem. Estamos falando de 30, o quarto álbum de estúdio de Adele, que após 6 anos de espera, finalmente volta para mais uma vez emocionar nossos corações. E se pouco mais de meia década pareceu muito tempo, imagina os 40 anos que separavam o disco anterior do ABBA de Voyage? O álbum marca o retorno do quarteto sueco, dando fim a um dos mais longos hiatos da história da Música. 

O retorno das vozes por trás de Dancing Queen e Waterloo não foi o único destaque de artistas da velha guarda no último mês. A Rainha da Voz Dalva de Oliveira e o camaleão do rock David Bowie também foram relembrados, através dos lançamentos póstumos de Rio Claro Diva e Toy. Além desses, outros artistas mais recentes resolveram revisitar sua carreira com relançamentos e compilações, reunindo materiais antigos já conhecidos com faixas inéditas, como é o caso de Radiohead, Little Mix e The Wanted.

Como se as 27 faixas e quase duas horas de Donda não fossem suficientes, Kanye West volta agora com a versão Deluxe, ainda mais extensa. Mas quem vai realmente ficar pra história ao retrabalhar sua obra é Taylor Swift, que vem realizando uma série de regravações de seus primeiros trabalhos com o objetivo de recuperar os direitos sobre as canções, e quebrou o recorde de canção mais longa a atingir o primeiro lugar do Hot 100 da Billboard, com a versão de 10 minutos de All Too Well.

E por falar em recordes, outro nome que aparece nas conquistas do mês é Summer Walker, que vem chamando a atenção na cena do R&B. A cantora, com seu disco STILL OVER IT, tornou-se a segunda artista feminina a ter 18 canções simultaneamente na mesma lista da Billboard, alcançando a própria Taylor Swift com seu Red (Taylor’s Version).

Outro destaque do gênero foi o disco do supergrupo Silk Sonic, que reúne Bruno Mars e Anderson .Paak. Enquanto isso, FKA twigs canta para o lançamento do próximo filme da série Kingsman, em uma parceria com o rapper londrino Central Lee, e Beyoncé para o filme King Richard com Be Alive, que pode lhe render uma indicação ao Oscar de Melhor Canção Original no próximo ano. Ainda no mundo do pop, Avril Lavigne volta às suas raízes do pop punk em Bite Me, e Christina Aguilera ofusca as polêmicas recentes com seu novo single Somos Nada, em que volta a cantar em espanhol.

FLETCHER se junta a Hayley Kiyoko, enquanto Charli XCX se alia a Christine and the Queens e Caroline Polachek em duas parcerias chamativas da Música pop. Paralelamente, The Weeknd disputa com Post Malone quem dois dois sofre mais por amor em One Right Now, e brilha ao lado de ROSALÍA em mais uma colaboração bem-sucedida com a espanhola. Explorando a faceta mais indie do pop, Foxes prepara o terreno para o seu novo álbum com um clima de festa-em-casa, a dinamarquesa MØ faz o mesmo com Brad Pitt / Goosebumps, e Gracie Abrams é sincera sobre seus sentimentos em seu disco de estreia, This Is What It Feels Like

Ainda no indie, vimos os sentimentos dilacerantes de Snail Mail, e Mitski fugindo do indie rock, abraçando uma instrumentação oitentista para falar de um amor trágico. Mas quem não vai abandonar o rock é a banda IDLES, que esmaga novamente em um trabalho mais pessoal e denso. Para fechar os artistas internacionais, Aminé traz seu rap com toques de hyperpop, e dois lançamentos ao vivo chamam a atenção: a insanidade de black midi em Live-Cade, e as reinvenções de Twenty One Pilots em Scaled and Icy (Livestream Version).

Pulando do exterior para o território nacional, o pop dominou os lançamentos do último mês, com singles de várias das grandes divas do país: IZA e Pabllo Vittar abraçam a estética futurista cyberpunk em Sem Filtro e Number One. Se estiver buscando uma sonoridade um pouco mais experimental, a produtora e agora cantora BADSISTA chega detonando com seu disco Gueto Elegance, cheio de colaborações de peso e ritmos hipnotizantes.

Manu Gavassi segue os passos de Taylor Swift e Billie Eilish, lançando seu novo disco acompanhado de um filme no Disney+. GRACINHA teve ainda participações especiais de Tim Bernardes, Amaro Freitas, Alice et Moi, dentre outros. E o que não faltou foram parcerias de peso entre os lançamentos nacionais: Lagum se juntou a Emicida e Josyara formou um supergrupo com Anná, Obinrin Trio e Sara Donato. 

Depois de cancelar nossa felicidade, a banda Fresno vai ter que se virar indo além do estilo de seu eterno rótulo, enquanto Tiago Iorc volta para falar mais dele mesmo do que sobre Masculinidade. Tivemos também singles de Ana Gabriela e Jade Baraldo, além dos videoclipes de Sandra Pêra e Ney Matogrosso, que vasculharam o armário para resgatar aquela Velha Roupa Colorida, e de Marina Sena, grande revelação do pop nacional do ano, e que dá agora um tratamento audiovisual para o seu hit Por Supuesto

Se encaminhando para o final do ano, a indústria da Música já vai assentando o seu número de lançamentos, mas nem por isso o Persona deixou de mergulhar fundo em tudo que rolou para apresentar o que o mês trouxe de mais significativo. Bem vindo à décima primeira edição do Nota Musical, onde a Editoria do Persona, em conjunto com os colaboradores, traz o que, por bem ou por mal, bombou no mundo da Música em Novembro de 2021, somado ao que pode ter passado despercebido, mas que com certeza merece uma atenção especial.

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Os dias são melhores em Scaled And Icy

A imagem é uma arte de divulgação do disco Scaled And Icy. Nela, há um recorte dos rostos de Tyler Joseph, à esquerda, e Josh Dun, à direita. O topo da cabeça de Tyler está cortado, em que há um homem ao centro dela com uma luz brilhando ao fundo. O topo da cabeça de Josh também está cortado, mas com a cabeça e o corpo de um dragão azul emergindo. Os dois são homens brancos.
Lançado no dia 21 de maio, Scaled And Icy é o sexto álbum do Twenty One Pilots (Foto: Fueled by Ramen)

Vitória Silva

Há 10 anos, Twenty One Pilots vem fazendo barulho ao redor do globo terrestre. Desde Regional at Best, o duo original de Columbus, Ohio, formado por Tyler Joseph e Josh Dun, luta constantemente para manter a unicidade de sua musicalidade, caracterizada por uma junção de elementos que vão desde o rap até o pop dançante. Característica essa  inegociável para a banda, que fez questão de manter seus gritos estridentes mesmo após assinarem o contrato com a gravadora Fueled by Ramen.

Mas a identidade de Joseph e Dun vai muito além de se aventurar em diferentes estilos musicais, usar gorros na cabeça e moletons com desenho de esqueleto. Desde o lançamento do Blurryface – que, de fato, revelou Twenty One Pilots mundo afora – a dupla vem materializando a construção do seu próprio universo no meio musical. Muito mais do que apenas uma era, essa concepção contempla, agora, 3 álbuns completos, e contando.

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30 anos dos gêmeos do Guns N’ Roses: Use Your Illusion I e II

Com um fundo preto, temos o texto “You can Use Your Illusion let it take you where it may” em duas cores: metade em amarelo e vermelho e metade em azul e roxo. No centro, uma criança em preto e branco escrevendo em um livro em cima das suas pernas cruzadas.
Arte feita com as cores dos dois álbuns e a imagem do menino que se encontra no quadro “A Escola de Atenas”, abaixo da estátua de Atena à direita da obra (Foto: Three-Beat Designs)

Luize de Paula

Em 1991, de um pequeno recorte da detalhada obra A Escola de Atenas, do italiano Raphael, nasciam dois gêmeos. Os álbuns Use Your Illusion I e II foram lançados logo após os maiores hits da banda com o Appetite for Destruction de 1987. Atingindo logo o 1º lugar da Billboard, com quase um milhão de vendas no primeiro dia de lançamento, os dois álbuns venderam 18 milhões de cópias no mundo todo e cada álbum recebeu 7 vezes platina pela RIAA.

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The Nowhere Inn: uma solução criativa não tão bem realizada

A cantora St. Vincent, uma mulher branca de cabelo preto na altura do queixo, usando um óculos que nas lentes estão o perfil de Carrie Brownstein na esquerda e a própria St. Vincent na direita. O fundo são vários tons de laranja e na parte debaixo está escrito o nome do filme, The Nowhere Inn.
he Nowhere Inn é o primeiro filme de Annie Clark (Foto: IFC Films)

Luisa Rodrigues

Não são muitos que conhecem St. Vincent pelo nome talvez lembrem-se da performance de tirar o fôlego que a artista fez junto com Dua Lipa no Grammy de 2019 a partir de um mashup de Masseduction e One Kiss. Mas no geral, a cantora não faz parte de um meio popular, e durante sua turnê promovendo o disco MASSEDUCTION, ela decidiu começar a gravar um documentário mais pessoal, mostrando também a Annie Clark. Pelo menos, é dessa forma que ela conta como começou a ideia que não deu certo do filme The Nowhere Inn.

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Nota Musical – Outubro de 2021

Destaques do mês de outubro: Gloria Groove, Jão, Ed Sheeran e Alice Caymmi(Foto: Reprodução/Arte: Jho Brunhara/Texto de abertura: Raquel Dutra)

O mês de outubro foi o mais agitado de 2021 aqui no Persona. Iniciado com o especial para o Mês do Horror e intermediado pela cobertura intensa da 45ª Mostra Internacional de Cinema de São Paulo, os últimos 31 dias também viram o nascimento do nosso Clube do Livro, que aqui no site se materializou na Estante do Persona, nosso novo quadro mensal literário. Entre todas essas atividades, não deixamos de acompanhar o mundo da Música, e agora, chegamos para comentar tudo o que rolou no décimo mês do ano no Nota Musical.

Tudo começou com um misterioso número 30 surgindo nas principais cidades do mundo. Como um bat-sinal, Adele criou um momento no início de outubro para a divulgação de seu retorno, que acontece depois de seis silenciosos anos que sucederam seu último disco, 25. Agora, seremos apresentados aos 30 da artista, e o single Easy On Me foi mestre em nos introduzir ao novo estágio da vida de Adele, que encontrará seu lugar no mundo em forma de disco no próximo dia 19 de novembro.

Enquanto Adele ressurgia com os seus números, Ed Sheeran retornava com os seus sinais. Como anunciado pelas variáveis e constantes de Bad Habits e Shivers, o novo disco do cara mais legal do pop chegou para continuar sua concepção musical pautada na matemática. Agora, +, × e ÷ tem a companhia de =, e para o bem ou para o mal, a música de Ed é assumidamente definida pelo símbolo de igual. 

Por outro lado, as sábias operações musicais de Lady Gaga e Tony Bennett decidiram apostar tudo num jazz que coloca o amor à venda. Da mesma forma, Hans Zimmer, por sua vez, concluiu na trilha do novo 007 que não temos tempo para morrer, The War on Drugs percebeu que precisa de um novo lugar no indie rock, e Brandi Carlile criou sua aclamada música country a partir de dias silenciosos.

Há também os que buscam a maior abstração possível. É assim com Coldplay e seu novo disco Music of the Spheres, que inventa de buscar outras formas de vida e de expressão distanciando-se do que nos conecta uns aos outros aqui na Terra. Mas nem tudo está perdido: as viagens atmosféricas de outubro funcionam sob a condução de Felipe de Oliveira, Tirzah e Black Country, New Road. Quem quiser acompanhar as belezas descobertas pelos artistas em ascensão, pode conferir os discos Terra Vista da Lua e Colourgrade e o single Chaos Space Marine.

Se alguns embarcam em direção ao exterior, outros mergulham no interior. Na MPB, essa foi a direção de Caetano Veloso em Meu Coco, e de Ney Matogrosso em Nu Com a Minha Música. No rock, o movimento nos entrega o melhor de Sam Fender em seu segundo disco, Seventeen Goin Under. No pop, foi a tática de importantes estreias: lá, FINNEAS descobriu um otimismo agridoce e PinkPantheress resolveu mandar tudo pro inferno.

É da dimensão íntima que outros grandes nomes trazem grandes coletâneas. Silva comemorou seus dez anos de carreira com De Lá Até Aqui; Megan Thee Stallion presenteia seus fãs com Something for Thee Hotties; Elton John traz sua música de quarentena em The Lockdown Sessions; Nick Cave & The Bad Seeds desenterram alguns tesouros em B-Sides & Rarities (Part II); e Madonna disponibiliza sua experiência ao vivo de Madame X nas plataformas de streaming

Assim, outubro também foi um mês de retornos. Primeiro, The Wanted movimentou a internet com seu comeback anunciado através de Rule The World, primeiro lançamento da banda desde sua separação em 2014. Depois, Agnes chega para o revival da era disco em seu quinto álbum, Magic Still Exists, que finaliza um hiato de quase dez anos. Já Tears For Fears viveu um intervalo um pouco maior, mas agora o jejum iniciado em 2004 está encerrado com The Tipping Point, faixa-título do novo álbum da dupla britânica, cujo lançamento está previsto para o início de 2022.

Quando o assunto é novidade, também estamos bem servidos. Em terras brasileiras, o pop viu o encontro de ANAVITÓRIA e Jorge & Mateus, teve mais uma chance de reconhecer Johnny Hooker, finalmente recebeu a estreia de Priscilla Alcantara e o terceiro álbum de Jão. O funk juntou Valesca Popozuda e Rebecca, o rap esteve com Karol Conká e WC no Beat, e a MPB ganhou a companhia de Jorge Drexler na nova canção de Marisa Monte, mas o maior destaque de outubro vai para a Imaculada Alice Caymmi.

Fora do país, o nome segue sendo o de Anitta, que esse mês, apareceu junto de Saweetie em Faking Love. Mas desta vez, a Girl From Rio não representou o Brasil sozinha na música internacional. Nas tabelas, A QUEDA de Gloria Groove significou ascensão, e a drag brasileira estreou na parada global da Billboard. O mesmo sucesso e apreço não pode ser encontrado na colaboração entre Jesy Nelson e Nicki Minaj, já que o lançamento de Boyz veio encharcado de polêmicas da líder Barbz nas redes sociais, e episódios de blackfishing por parte da ex-Little Mix.

Ainda bem que a Música pode contar com a honestidade de Phoebe Bridgers, que usou That Funny Feeling para levantar sua voz em oposição à legislação antiaborto mais restritiva dos Estados Unidos que avança no Texas. O cover da artista esteve no radar mensal do indie, que também tem novidades preciosas no novo disco de Lana Del Rey e nas canções de Mitski e Michael Kiwanuka

Por fim, outubro ainda trouxe um belo descarte de Ariana Grande, novos contornos para a Conan Gray, clipes de Troye Sivan, Kacey Musgraves e Olivia Rodrigo, e o encontro gigante de The Weeknd com Swedish House Mafia. Foi um mês e tanto, mas o Persona nunca deixa de se atentar às novidades e decepções que a Arte nos oferece. Na décima edição do Nota Musical, nossa Editoria e nossos colaboradores se reúnem para vasculhar os CDs, EPs, músicas e clipes que ecoaram por aí em Outubro de 2021.

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Sob escombros do pós-guerra, nasceram os escultores do heavy metal: o quarteto desajustado que se tornou o sinistro Black Sabbath

Capa do primeiro disco do Black Sabbath, o qual recebe o mesmo nome da banda. Fotografia quadrada com o nome do grupo na parte superior central. A região parece ser rural. O clima é nublado e as folhas, secas. Em segundo plano, há uma casa e, pela textura da imagem — meio desfocada e não tão nítida — dá a sensação de ser mal-assombrada. No primeiro plano, ao centro, uma mulher muito pálida e vestindo capa preta olha diretamente para o espectador, instaurando um ambiente misterioso.
A capa do primeiro disco do Black Sabbath serviria muito bem para um filme de terror: a figura central pode tanto ser uma bruxa como a figura misteriosa vestindo preto, mencionada na faixa inicial; fato é: era uma amiga da banda e nunca recebeu direitos pela foto (Foto: Black Sabbath)

João Pedro Piza

A Segunda Guerra Mundial, em muitos aspectos, mudou os rumos da humanidade. As atrocidades presentes no front, o medo constante da vigilância proveniente dos membros dos Estados totalitários e o horror disseminado pelas mais modernas técnicas de batalha forjaram no inconsciente dos cidadãos europeus um grande sentimento de desesperança. A Inglaterra, uma das potências mundiais da época e, por isso, grande alvo de Hitler na parte ocidental do continente, foi bombardeada pelos aviões alemães da Luftwaffe em 1940. Sob escombros e com pelo menos 450 mil mortos, os ingleses buscavam reestruturar o país a partir dos anos 1950, após a vitória dos aliados e dos efeitos do Plano Marshall. Mas não era nada fácil.

Nesse contexto, seria pouco coerente as manifestações artísticas do cenário cultural de Birmingham, cidade industrial e protagonista da metalurgia na Inglaterra, rodeada pela miséria, desemprego e crises, apresentarem o mesmo tom de paz, amor e esperança dos hippies — especialmente poetas e músicos norte-americanos. Dessa forma, Ozzy Osbourne, Tony Iommi, Geezer Butler e Bill Ward possuíam uma ótica pessimista e distópica no que tange a maneira de encarar a sociedade e ver o futuro. Naturalmente, trocaram as roupas coloridas e as flores por jaquetas de couro e crucifixos. 

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A radicalidade acolhedora de Juçara Marçal em Delta Estácio Blues

Capa do CD Delta Estácio Blues. A cantora Juçara Marçal está no centro da fotografia, sobre um fundo azul. As mãos dela estão dispostas sobre a face de forma que só conseguimos ver um dos olhos, cabelo, parte da boca e orelha.
O segundo disco solo de Juçara Marçal aponta novos caminhos musicais (Foto: Aline Belfort)

Gabriel Leite Ferreira

No princípio era o beat. O primeiro aperitivo que o público teve da nova fase de Juçara Marçal foi em uma live, no dia 7 de abril de 2021. Como parte de um ciclo de transmissões que o Metá Metá fez naquele mês, Juçara veio à frente só, munida de samplers, percussão, piano e voz. Mais uma ruptura em uma carreira repleta de rupturas. Iyalode mbé mbé, a última faixa de Delta Estácio Blues, lançado em 30 de setembro, já marcava presença.

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