Han Solo: Uma História Star wars e a reconstrução de um personagem clássico

Esse texto contém spoilers, mas daquele tipo que só vão te deixar com mais vontade de ver o filme e não estragar a sua experiência!

(Foto: Reprodução)

Fellipe Gualberto

É uma ótima época para ser fã de Star Wars. Em um ano temos um filme da nova trilogia acrescentando narrativas que se passam após a saga original, e no ano seguinte temos um spin off contando histórias que se situam entre a trilogia prequel e a clássica, tem sido assim desde 2015. Mas será que é realmente uma época boa para ser fã de Star Wars? As novas produções do universo de George Lucas, como de costume, são carregadas de muito hype e inevitavelmente vão ter um exército de apoiadores e um exército de opositores. Quando fui assistir “Han Solo: Uma História Star wars” um dia após a estreia pensei que ia encontrar poucas cadeiras vagas no cinema. A sala estava praticamente vazia.

A sala estava vazia, talvez por estarmos em plena quinta-feira ou talvez pelo público estar desacreditado em Star Wars. (Foto: Reprodução)

Lançado no último dia 24, a nova trama se passa na conhecida galáxia de Star Wars em meio a uma crise de falta de combustíveis na qual eles atingem preços exorbitantes (eu já não vi isso em algum lugar?). Os personagens saem em uma missão para roubar Coaxium, uma espécie de cristal de onde se obtêm o combustível, a fim de pagar as dívidas com um chefão do crime e conseguir suas liberdades.

Star Wars tem um famoso easter egg, a frase “Tenho um mau pressentimento sobre isso” é dita em todos os episódios da saga (mesmo que seja por um robô e de maneira não compreensível), mas nesse nós ouvimos “Eu tenho um bom pressentimento sobre isso”, frase que de fato te acompanha durante o começo do longa, que parecia muito promissor.

Porém, esse sentimento acaba assim que Han sai de seu planeta natal e deixa sua namorada Qi’ra para trás, mudando assim o ritmo da narrativa. A fuga frustrada que separa o casal nos dá a impressão que o longa vai se resumir em um romance que sabemos que irá fracassar, já que não encontramos essa personagem na trilogia clássica.

A atuação de Emilia Clarke (Daenerys em Game of thrones) é um dos pontos altos, assim como sua personagem Qi’ra. Apesar de inicialmente ser apresentada como par romântico do contrabandista, ela se desenvolve de maneira profunda ao longo da trama. Sua trajetória quebra o paradigma de “princesa que precisa ser resgatada” criada inicialmente e conversa de maneira metalinguística com outros personagens da mesma atriz e com acontecimentos recentes.

Arte promocional da personagem Qi’ra. (Foto: Reprodução)

Em um contraste nem um pouco positivo Alden Ehrenreich tem a maior caracterização para se parecer com o personagem de Harrison Ford, mas peca em se esforçar demais para manter trejeitos conhecidos do antigo intérprete, tais quais o sorriso de canto de rosto, o “biquinho” charmoso e as mãos na cintura.

Donald Glover, que está em um bom momento após o recente lançamento do seu clipe “This is America”, atua como Lando Calrissian conseguindo passar sinceridade e confiança no papel, além de respeitar o personagem que já conhecemos. O novo Chewbacca também consegue manter a personalidade clássica, apesar de Joonas Suotamo ser 10 centímetros mais baixo do que Peter Mayhew, o antigo Chewie.

Han e Lando se conhecem através de um jogo de cartas, no qual ambos tinham segundas intenções. A relação que se desenvolve entre os dois durante a história faz jus a imagem já formada do amigo entre os episódios V e VI, um ótimo trapaceiro.

O novo spin-off da franquia explora, com criatividade, diversas criaturas alienígenas, algo muito presente na trilogia original e que foi desaparecendo cada vez mais nas produções recentes, tornando a galáxia distante cada vez mais predominantemente humana.

No lugar das clássicas cenas de bar de Star wars agora temos uma cena em uma festa, contando com um alienígena cantor dentro de um pote e sua parceira coberta de ouro. (Foto: Reprodução)

O novo longa tenta explicar questões do roteiro de Star Wars e do passado da saga que sinceramente não precisavam ser explicadas, chegando assim a descaracterizar a figura misteriosa do personagem. Aqui é explorado como o protagonista conheceu Chewie, como ganhou sua nave e como foi parar em Tatooine, perguntas que, justamente por não terem resposta, tornavam a figura de Han quem ele é, o anti-herói misterioso que conhecemos em “Uma nova esperança”.

Na sessão de esclarecimentos da obra contamos com um easter egg conhecido no universo de George Lucas, a Corrida de Kessel. Han constantemente se gaba por ter feito o Percurso de Kessel em apenas 12 parsecs na sua nave Milenium Falcon. Acontece que ao contrário do que muitos pensam, parsecs são uma medida de distância e não de tempo, como alguém poderia fazer um percurso já determinado com uma distância menor?

Esse spin-off mostra que isso realmente aconteceu e tira o tom humorístico do que inicialmente pensamos ser um blefe usado para se gabar e ostentar sua habilidade de piloto veloz. Tornando essa afirmação verdadeira a Disney (agora dona da Lucasfilm) modifica a imagem original que Han tinha de trapaceiro de uma maneira irreversível.

Perseguição no famoso Percurso de Kessel. (Foto: Reprodução)

Han Solo tem um roteiro um tanto forçado e não segue a lógica em algumas partes além de contar com muitas mortes desnecessárias logo no início da narrativa, o que pode te desmotivar. Apesar desses pontos negativos o novo spin off sabe usar do humor na hora certa e chega a ser um dos longas mais engraçados do universo de Star wars.

E é nesse sentido que chegamos ao ponto alto do enredo e a melhor personagem: L3-37 ou simplesmente L3, a robô de Lando.

L3 em sua própria rebelião. (Foto: Reprodução)

L3 é uma robô que pensa por conta própria e tem livre arbítrio, ela milita pelos direitos dos robôs, por igualdade com os humanos e dos seus iguais. Além de atuar como alívio cômico a personagem traz novas questões para esse universo cinematográfico revelando uma faceta nunca antes explorada na franquia.

Essa possibilidade de apresentar com criatividade fatores novos em uma saga antiga é o que os spin-offs tem de melhor para nos oferecer, como em “Rogue one”, no qual temos um contato com um monge de uma religião ligada à crença na Força.

“Han Solo: uma História Star wars” acaba com um final trágico, não literalmente, mas por te obrigar a assistir duas séries animadas e um filme animado de Star wars (que coincidentemente também são produzidos pela Disney) para entender a narrativa por completo. Além disso o final também decepciona devido um roteiro pobre e com falhas que não se pode ignorar.

Oba, agora são só mais 196 episódios das duas séries que foram incluídas no cânone. (Foto: Reprodução)

A decepção do final deixa uma afirmação e duas dúvidas para a maioria dos fãs da série: Um novo Star Wars sempre será bem-vindo, mas um novo Star wars será sempre necessário? E acima de tudo: “Han Solo: Uma História Star wars” era mesmo necessário?

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