Call: eu avisei para não desconectar o telefone

A imagem é o cartaz de divulgação do filme. No canto superior esquerdo, há o rosto de uma mulher de traços asiáticos e cabelo curto, ela aparenta estar assustada. Do lado superior direito, há o rosto de uma mulher, também de traços orientais, mas com uma feição séria, com o olhar voltado para a direita. Abaixo dela, no canto inferior direito, há o rosto de uma mulher de traços orientais, ela usa batom vermelho e está com um olhar sério voltado para a esquerda.  No lado inferior esquerdo, há o rosto de uma mulher de traços orientais, com cabelos castanhos claros e que está olhando assustada para a esquerda, ela tem algumas manchas de sangue no rosto. Em cima de cada rosto há uma das letras que formam a palavra CALL, que é o nome do filme.
“Call não envolve homens e mulheres. É um filme centrado em personagens femininas e suas relações, e um bem feito”, disse a atriz Park Shin Hye sobre o longa (Foto: Reprodução)

Bianca Penteado

O silêncio absoluto. As respirações baixas. Os movimentos lentos. O súbito toque de telefone.

Todos os amantes do terror já contemplaram essa cena. Desde O Chamado (2002), com a Samara prenunciando sua morte em ‘sete dias’, passando por Pânico (1996), que sabe muito bem como nos arrepiar com o vagaroso e intenso ‘hello, Sidney’. E, finalmente, a corrida genérica pela busca do aparelho enquanto alguém o persegue. Convenhamos, as ligações no terror já decaíram ao título de clichê. Porém, sempre existindo a exceção, vamos concordar em discordar de Call (2020).

O foco inicial da trama concentra-se na mudança de Seo Yeon (Park Shin Hye) para a casa em que um dia planejou morar com seus pais. Sem o celular, tem em um telefone fixo velho sua única comunicação. Um dia, ele toca. Desesperada, a voz do outro lado da linha grita e pede por ajuda. Porém, a jovem imediatamente desliga ao assustar-se com um detalhe: o endereço que a voz havia passado era idêntico ao seu.

A frequência da situação a perturba, e Seo Yeon começa a buscar por respostas. Com um pouco de pesquisa e muita crença – porque acreditar em algo assim requer esforço –, descobre que a voz no aparelho é de Young Sook (Jeon Jong Seo), uma garota que vive na mesma casa, só que 20 anos atrás. Com a mesma idade, mas com personalidades completamente opostas, elas compartilham a solidão, e é isso que as une.

A imagem é uma montagem com duas cenas do filme. Na parte superior da imagem, está uma cena da personagem Seo Yeon falando ao telefone. Seo é uma mulher de traços orientais, cabelos castanhos na altura dos ombros e que veste uma camiseta branca. Ao fundo é possível ver uma parede com desenhos e uma cortina com um pouco de luz atravessando. Na parte inferior da imagem, está a personagem Young Sook, também falando ao telefone. Young Sook é uma mulher de traços orientais, cabelos pretos acima dos ombros e que veste uma blusa preta com um casaco xadrez. Ao fundo é possível ver o sofá, ela aparenta estar na sala de sua casa.
A primeira ligação a gente nunca esquece (Foto: Reprodução)

Debutando de maneira exemplar na cinematografia de longas-metragens, Lee Chung Hyung, roteirista e diretor do thriller sul-coreano, reacende os debates sobre o gênero do horror no cinema estrangeiro. Trabalhando com as marcas que a vida deixa e que, boas ou ruins, nos tornam quem somos, o filme explora o efeito borboleta para concretizar o terror. Afinal, o quão perigoso é alguém que pode adicionar novas marcas ao seu passado e, consequentemente, moldar seu presente conforme as próprias vontades?

Imprevisível para o gênero, a trama abre espaço para contemplarmos a essência da dupla principal. Sem perder seu propósito em uma banal overdose de jumpscares, a narrativa é capaz de destacar a atuação impecável de seus componentes. A tristeza, o medo, a angústia e o desprezo de cada olhar. O diretor aposta em uma filmagem que evidencia as expressões de cada intérprete.

A imagem é de uma das cenas do filme. Nela, podemos ver a atriz Park Shin Hye sentada no chão, em frente à sua cama. Park é uma mulher de traços orientais, cabelos castanhos na altura dos ombros e franja. Ela veste uma blusa branca de mangas longas. Park está com uma feição assustada, com o olhar voltado para o canto superior esquerdo e roendo as unhas da mão esquerda.
Park Shin Hye já admitiu que preferiria ter interpretado Young Sook (Foto: Reprodução)

Com a falta do sobrenatural – o fantasma, o monstro ou a menina que desce as escadas de costas – a produção cativa o público pelo elenco. Ainda mais quando levamos em conta que o cinema coreano, finalmente, está proporcionando visibilidade para um enredo conduzido por mulheres fortes.

Park Shin Hye, conhecida como uma das melhores atrizes sul-coreanas de sua geração, não deixa a desejar. Mas, quem rouba a cena é Jong Seo, que, ao longo dos minutos, parece não se contentar com nada menos que o protagonismo. Entre balas de goma e extintores, encontra-se em Young Sook uma personalidade propositalmente inconstante. A mescla de risos infantis e olhares cruéis que a atriz usa para caracterizar a personagem problemática reafirmam seu talento e marcam um grande passo rumo ao estrelato.

A imagem é de uma das cenas do filme. Nela, está a atriz Jeon Jong Seo. Jeon é uma mulher de traços orientais, cabelos castanhos na altura dos ombros e que está vestindo uma blusa branca de mangas compridas. Ela está em pé, no que aparenta ser uma sala, e com uma expressão assustada, com a boca semi-aberta.
Jeon Jong Seo ganhou mais de 5 prêmios com sua interpretação em Burning, incluindo Melhor Atriz Revelação e 15 Talentos de Revelação Internacional de 2018 (Foto: Reprodução)

Durante o filme, Chung Hyung mostra que a carta na manga de Call é a sua atenção nos impactos imediatos que o passado tem no presente. E essa carta é um trunfo. Imprescindível para um enredo com constantes transições de realidade, a equipe de iluminação e a produção foram fundamentais. Meticulosamente moldando ambientações e realçando a atmosfera antagônica de cada cenário, a direção e os – surpreendentes – efeitos especiais empenhados são dignos das telonas.

Ainda assim, há um critério conflituoso. A casualidade com que Seo Yeon aceita e acredita na situação temporal das ligações causa certa aversão. Ao mesmo tempo, estamos exaustos da auto explicação. Na obra aqui dissecada, não sabemos por que as coisas acontecem – chame de destino, se quiser. E, simultaneamente, não nos interessa o porquê de, a princípio, terem acontecido. Passado o desconforto momentâneo de que as coisas aconteceram fáceis demais, o roteiro segue progressivamente evoluindo, sem deixar solta qualquer ponta relevante para o enredo.

Baseado na obra The Caller (2011) de Matther Parkhill, o longa é merecedor de estar entre os melhores suspenses de 2020. Exercitando a nossa quebra de expectativa, a história toma caminhos inesperados até o último minuto. A Ligação (como é traduzido ao português) nos conduz a ambientes bizarros, tensos e sanguinários, criados com a sensatez necessária para produzir uma atmosfera de imersão e arrancá-lo da curva dos clichês.

A imagem é de uma das cenas do filme. Nela, podemos ver uma das personagens sentada no chão da cozinha. A personagem é uma mulher de traços orientais, cabelo na altura dos ombros, e que veste uma blusa listrada de manga comprida e uma calça jeans. Na cena, ela está falando ao telefone. Ao fundo, é possível ver um pouco de sangue escorrendo pela parede da cozinha. Ao lado direito da personagem, há uma porta da geladeira aberta.
O novo filme da Netflix possui surpresas até o último minuto, então, dica de quem já viu: fiquem atentos aos pós-créditos (Foto: Reprodução)

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